The Post: A Guerra Secreta | Crítica | The Post, 2017
The Post: A Guerra secreta é, além de um filme, uma posição política e a reafirmação do antigo ditado que o preço da liberdade é estarmos sempre alertas.
Provavelmente, existem poucas pessoas que conseguiriam um feito de encaixar um filme entre a produção e a pós-produção de outro. Porém, isso não é o mais importante em The Post: A Guerra Secreta. Num mundo onde qualquer ação pode ser considerada uma manifestação política, Spielberg contou com o cenário atual da política dos EUA para defender a liberdade de imprensa e para lembrar que certas coisas são cíclicas. E pode parecer que é apenas para dizer que políticos irão sempre mentir, o que seria muito raso, mas essa história investigativa serve mais como um totem da premissa do preço da liberdade ser estarmos atentos.
Tão marcante quanto a Guerra do Vietnã no imaginário da maioria dos estadunidenses, mesmo para quem nasceu muito depois, são as discussões que motivaram a incursão militar no país asiático e por isso há um medo, pelo menos em parte, por parte deles de qualquer nova guerra além-mar. Por essa verdade é que Spielberg já nos coloca logo de cara dentro de um cenário de Guerra – por pouco tempo, apenas para nos situar. Com estilo documental da câmera na mão e tenso por consequência, o som de tiros e pás dos helicópteros batendo passa para os sons das teclas da máquina de escrever do analista Dan (Rhys), um som que ocupará boa parte da história.
Esse prólogo resume o que os personagens Katharine (Streep) e Ben (Hanks) irão ter que passar: uma dose de coragem, no caso de Dan foi copiar os documentos por meses, e enfrentamento de mentiras – é bem marcante quando o analista conta ao secretário de defesa que a situação no Vietnã é insustentável, mas assim que Robert McNamara (Greenwood) desce do avião, ele diz à imprensa que está tudo sob controle, ganhando um olhar fulminante de Dan. São alguns poucos minutos que servem de base para o restante da história. É um choque entre poderes, marcado pela figura escura e reservada de um Presidente que é sempre mostrado de costas e num cenário à meia-luz.
Paralelamente, Spielberg e a dupla de roteiristas mostram o peso em cima de Katharine por assumir as funções de diretora do The Washington Post, peso representado pelas pastas de matérias que a pressionam na cama e que ocupam o lugar do falecido marido. O diretor consegue apresentar de maneira eficaz essa discussão – apesar de acreditar que seria melhor sendo dirigido por uma mulher –, seja pelos sorrisos irônicos de Katherine ao ouvir comentários que outros sócios duvidam da capacidade dela por ser mulher ou na cena em que acontece na casa dela, onde todos os homens, em seus ternos escuros, a pressionam enquanto ela veste uma roupa de cetim claro.
O que atrapalha um pouco a narrativa são os detalhes quase jurídicos da questão de transição de poderes dentro do jornal. São partes que mereciam ser encolhidas, mas mesmo dentro desses meandros há um momento marcante para mostrar como a relação entre homens e mulheres era vista, e nem é difícil dizer que ainda são. O momento mais emblemático, sem dúvidas, é quando Kat dá um parecer financeiro sobre a situação do jornal que só é levada em consideração quando um homem a vocaliza. Há outras situações mais sutis, mas que também batem nessa tecla – o que poderia fazer Spielberg cair no “feministo” caricato, aquele que quer explicar mais que as próprias mulheres.
Em geral, o filme trata das relações de poder. Passando desde Kat sendo praticamente expulsa da sala de jantar enquanto os homens começam a discutir política – mas ela vira de costas para os assuntos mais fúteis das amigas de volta para o ambiente que saiu – até as discussões sobre o que deveria ser feito com os papéis vazados, se e quando fossem encontrados. Notem como começa a discussão entre Kay e Bem, de plano e contra-plano, onde a câmera a coloca em uma posição mais baixa para aos poucos se nivelar à altura do outro personagem, depois da notícia do que aconteceu com o Times.
É impossível não fazer a relação desse filme como Todos os Homens do Presidente (All The President’s Men, 1976, Dir Alan J. Pakula): ambos têm caráter histórico, mas o filme de Spielberg passa uma mensagem sobre estarmos sempre vigilantes, mesmo que isso leve a quebrar ou burlar a lei, como o próprio Ben admite. O que mostra o diretor um tanto revolucionário, não ao ponto de querer jogar coquetéis molotov na Casa Branca, mas incendiar o status quo de maneira figurativa. Nesses tempos das chamadas fake news, podemos olha a produção como um alerta e um raio de esperança. E isso justifica a pressa de Spielberg em entregar para o público (e para a comissão da Academia) um filme que foi feito de maneira rápida, mas sem aparência atrapalhada.
É possível dizer, inclusive que The Post: A Guerra Secreta é um filme que precisava existir. Além de equilibrar drama com momentos involuntários de riso, algo que dá leveza à história, a produção também importa para qualquer pessoa que preze pela verdade de seus governantes. Óbvio que isso é também um discurso político, um terror que é bem representado na cena em que Ben Bagdikian (Odenkirk) encontra Dan num hotel barato – a fotografia soturna e as luzes vindas de abajures parecem cenas do Exorcista (The Exorcist, 1973, Dir William Friedkin), com as páginas em cima da cama esperando para serem exorcizadas. Poderia ser uma história importante com uma execução confusa, mas graças à Spielberg, esse fã do espírito humano, não é.
The Post: A Guerra Secreta concorre ao Oscar 2018 nas categorias Melhor Filme e Melhor Atriz (Meryl Streep)
Elenco
Meryl Streep
Tom Hanks
Sarah Paulson
Bob Odenkirk
Tracy Letts
Bradley Whitford
Bruce Greenwood
Matthew Rhys
Direção
Steven Spielberg (Prenda-Me Se For Capaz)
Roteiro
Liz Hannah
Josh Singer
Fotografia
Janusz Kamiński
Trilha Sonora
John Williams
Montagem
Michael Kahn
Sarah Broshar
País
Estados Unidos
Distribuição
Universal Pictures
Duração
113 minutos
Durante a administração Nixon, houve um evento que abalou a Casa Branca antes do escândalo Watergate. Documentos provavam que a incursão dos EUA no Vietnã já era considerada um fracasso anos antes de seu fim, mas o governo escondeu essa informação. Agora esses papeis caíram nas mãos dos editores do The Washington Post e o jornal deve decidir se irão publicá-los, atraindo a fúria do Presidente.
[críticas, comentários e voadoras no baço]
• email: [email protected]
• twitter: @tigrenocinema
• fan page facebook: http://www.facebook.com/umtigrenocinema
• grupo no facebook: https://www.facebook.com/groups/umtigrenocinema/
• Google Plus: https://www.google.com/+Umtigrenocinemacom
• Instagram: http://instagram/umtigrenocinema
• Assine a nossa newsletter!
Apoie o nosso trabalho!
Compartilhe!
- Clique para compartilhar no Facebook(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Twitter(abre em nova janela)
- Clique para imprimir(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no WhatsApp(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Telegram(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Tumblr(abre em nova janela)
- Mais