O Castelo de Vidro | Crítica | The Glass Castle, 2017, EUA
O Castelo de Vidro é uma história inspiradora, mas que deixa um gosto de já termos visto isso antes.
Elenco: Brie Larson, Woody Harrelson, Max Greenfield, Sarah Snook, Ella Anderson, Chandler Head, Naomi Watts | Roteiro: Destin Daniel Cretton, Andrew Lanham, Marti Noxon | Baseado em: O Castelo de Vidro (Jeannette Walls, Editora Globo) | Direção: Destin Daniel Cretton (Temporário 12) | Duração: 127 minutos
É certo que Hollywood faz coisas muito divertidas, mas também é certo que a grande indústria do cinema se apropria de tudo que pode espremer, mesmo que, no fechar das cortinas, parece muito tudo igual. Apesar de ser uma história bonita e emocionante O Castelo de Vidro é o que chamamos pejorativamente de indie de boutique. No filme, a protagonista vive uma juventude de aventuras, percebe que os extremos são exagerados e no final encontra ou descobre o equilíbrio. O que não é, por si só, um demérito. Mas num mundo onde noventa por cento das produções são adaptação (o caso aqui) ou remakes, buscar um pouco de originalidade não faria mal a ninguém.
A infância de Jeannette (Larson) é quase um realismo fantástico, pintado por cores expressionistas na fotografia de Brett Pawlak – como uma homenagem aos trabalhos de Robert Yeoman com Wes Anderson -, com o pai Rex (Harrelson) representado como um tipo de Super-Homem dos quadrinhos, com seu queixo quadrado e olhos azuis penetrantes. A infância da agora jornalista (representada por Head e Anderson) era um tanto disso, uma história em quadrinhos cheia de aventuras, excitante, mas também cheia de perigos. O que chamamos de hipster hoje era a vida da família Walls, nômades ou ciganos, vivendo um dia de cada de vez sem pensar no seguinte.
Mas também é um tempo de promessas não cumpridas e não dá para deixar de julgar a maneira que Rex e Rose Mary (Watts) criam os filhos de maneira tão livre – às vezes beirando o egoísmo – que mesmo com os momentos doces e divertidos, os que mais marcam, assim como a queimadura de Jeannette, são os mais dolorosos. Já adulta, ela discute com o pai que era missão dele cuidar da família e não permitir que passassem fome ou ficassem muito tempo na estrada, algo representado com uma bela sutileza na montagem de Nat Sanders (de Moonlight) no abrir e fechar da porta de um caminhão de mudanças.
Então há uma inocência nos flashbacks que aos poucos é quebrado pelas fraquezas do pai, sua kryptonita digamos assim, com o próprio passado e os problemas com a bebida. Para reforçar essas mudanças, Cretton usa tanto da fotografia quanto da mise-en-scène. O primeiro é um tanto mais óbvio, pois vemos a paleta de cor perdendo as cores fortes e assumindo um tom mais realista e dessaturado enquanto as linhas de tempo se encontram. Outro é bem mais interessante; uma cena que explica o desprendimento do pai com algo que possa ser chamado de lar e que se desenrola em dois momentos diferentes no porão da casa onde Rex cresceu.
O filme divide momentos mais lúdicos com mais didáticos, o que é interessante para roteiro e história. Por exemplo, o primeiro caso está mais ligado aos signos não verbalizados. Em especial, apenas para marcar, quando a família se muda para a cidade onde Rex nasceu, todos começam a trabalhar na fundação do que seria o Castelo de Vidro – a casa perfeita – que gradativamente é preenchida com lixo, enterrando o sonho. O outro caso representa bem mais as lembranças de Jeannette com o pai e como ele era inventivo ao ponto de criar uma história ao redor de fatos, como é a justificativa da cicatriz da personagem.
Com um pai e uma mãe disfuncionais, nos simpatizamos quando a jovem Jeannette bate com a mão na testa por não acreditar como uma cena de agressão terminou. O Castelo de Vidro se tornou um Castelo de Cartas, frágil e que pode ser balançado por qualquer movimento só um pouco mais brusco. É a partir daí, numa promessa feita entre os quatro irmãos, que a magia começa a sumir e as coisas mudam na narrativa: a fotografia começa acompanhar os tons cinzentos de uma nebulosidade da cidade que não parece ir embora e a trilha sonora, que praticamente existia só no passado, começa a ir embora também – até que ela se torna fria como notamos nos tons de preto e branco quando Jeannette ouve o recado da mãe na secretária eletrônica.
Porém, essa não seria uma história inspiradora e comercializável , o que é um contrassenso devido ao discurso anticapitalista de Rex,sem uma lição. Tanto filme quanto livro são homenagens ao pai da verdadeira Jeannette, que mesmo com todos os seus defeitos – ou uma visão diferente do que é a vida – sempre impulsionou a filha. E é nesse quesito que há um grande problema no roteiro. Jeannette, com razão, se irrita com o pai, mas se esquece, pelo menos quando se trata da personagem no filme, do grande empurrão final que ele deu na carreira da jovem, o que é um tanto desonesto da parte de Cretton e Lanham, como se fosse uma lembrança convenientemente reprimida.
Feito para você chorar, O Castelo de Vidro agrada principalmente pelo caminho que segue ao mostrar uma protagonista humana que navega entre fogo e fragilidade, pela mensagem da busca pelo equilíbrio – resumida no último plano do filme – e pela atuação apaixonante do trio Harrelson-Larson-Watts. Em contrapartida, é exatamente essa apresentação que fará comparações inevitáveis com produções anteriores melhores desenvolvidas – Capitão Fantástico (Captain Fantastic, 2016, Matt Ross) é o exemplo mais recente. Ao filme de Cretton falta charme, apesar do refinamento e tratamento parecidos e saímos da sala com a sensação de já termos visto isso antes e não faz tanto tempo.
O Castelo de Vidro | Trailer
O Castelo de Vidro | Pôster
O Castelo de Vidro | Galeria
O Castelo de Vidro | Sinopse
Baseado nas memórias de Jeannette Walls, essa é a história de uma juventude de aventuras sem saber o que esperar no dia seguinte, onde a protagonista como foi mágico e difícil a vida que teve com o modo nômade de vida com seus pais e irmãos e as marcas que ficam dessas experiências.
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