A Primeira Noite de Crime | Crítica | The First Purge, 2018
A Primeira Noite de Crime é a melhor continuação do original de 2013, mas a repetição da ideia já cansou.
Mantendo-se fiel ao seu princípio, A Primeira Noite de Crime é um curioso estudo feito de maneira palatável e direta para entregar ao maior número possível de pessoas uma explicação do que acontecendo com o chamado mundo livre, afinal de contas. É verdade também que nessa prequela e terceira continuação do filme de 2013, os discursos e temas se repetem, sem adicionar nada além do que vimos nos outros filmes. O que muda é apenas o foco no tipo de personagem e a passagem de tocha de DeMonaco – que se mantém no roteiro e na produção – para que McMurray dê a sua visão daquela parcela da população estadunidense que mais tem sofrido com as políticas atuais no país.
Assim como foi das outas vezes, a franquia Noite de Crime – que voltou a ser chamada assim pela Universal no Brasil – foca em repetir para fixar. Como uma lição de casa, DeMonaco e McMurray esquadrinham núcleos, apresentam detalhes que fizeram parte dos outros filmes e fazem que, ainda que pertençam ao mesmo universo, seja um filme com a possibilidade de ser apreciado sem a necessidade de ter visto os outros, fechando-se em si mesmo. Continua o texto com referências atuais (“tivemos que nos fingir de mortas”, diz uma das personagens), aumenta o foco na população negra e hispânica, diferente do anterior onde o herói era um cara branco, enquanto os mantenedores dos status quo continuam com sua brancura.
Por meio de entrevistas, feitas com closes fechados no rosto dos entrevistadores e entrevistados na intenção de ser algo pessoal, como se estivessem falando conosco, o experimento busca os desesperados. Apesar de se passar em outro país, é bem provável que você aceitasse participar de 12 horas de uma experiência por 5 mil dólares, mesmo que isso significasse a sua morte. E divido entre um prólogo, ou dois dependendo do ponto de vista, os outros capítulos servem para apresentar esses personagens, vizinhos que se encontram em realidades similares e que logo estarão dividindo o mesmo espaço apertado.
Infelizmente, McMurray comete alguns erros de seu predecessor enquanto adiciona novos. O principal é a falta de confiança na própria história ao apelar para muitos scary jumps, típicos de filmes de terror. O diretor apela para outros clichês, como o de um dos antagonistas ser mau e perturbado, e por isso se encher de cicatrizes. O Esqueleto (Paul), um personagem colocado na ilha para acender uma fagulha, poderia ser apenas o que é sem essa deformidade física, e é bem mais eficaz quando o vemos encarando um espelho quebrado, fragmentando seu reflexo. O outro lugar-comum é transformar Dmitri (Noel) num exército de um homem só no clímax da história, retirando a humanização que ele vinha apresentando.
E essa palavra, humanização, é importante e recorrente na trama. É o que Nya (Davis) tenta fazer com suas palavras de ordem na manifestação contra o teste, o que tenta fazer por Dmitri e o que Pais Fundadores tentam tirar de pessoas como Isaih (Wade) que participam pelo desespero financeiro. Outros personagens são apresentados, o que infla um pouco além do necessário para uma trama mais concisa, servindo para reforçar o discurso. E para transformar essas pessoas normais em monstros, temos as lentes de contato especiais que irão filmar o evento para que os dados sejam analisados – e o efeito que a luz colorida dá é de algo não-humano, digno de estranheza.
E do lado do governo, há uma parcela de inocência na Dra May (Tomei). Apesar de não ficar claro se ela estava a favor da experiência, ela acredita que poderia entender uma parte da sociedade pelos números. Eis que DeMonaco e McMurray encaixam outra crítica à parte política desse mundo, um onde os políticos fazem o seu melhor: mentir. Concordando ou discordando disso, essa é a visão do roteirista e essa é ideia que quer passar. Em complemento, a história fala de outras ilusões e como elas são facilmente desmontadas. Como o grupo que busca abrigo numa igreja esperando que ali estariam salvos, apenas para terem suas esperanças destruídas, como muitos se esforçam para fazer com o tal sonho americano.
Dentro desse universo conhecido por quem já se aventurou nas outras três vezes, realmente sobra pouco espaço para novidades. Há uma tentativa ao mostrar como é preciso só um elemento de desiquilíbrio para fazer as coisas pegarem fogo e um discurso de como uma população toda vive com medo. Ao introduzir os personagens mascarados, perdendo a sua humanidade de maneira mais expressiva que as lentes gravadoras, McMurray advoga que seus iguais vivem um filme de terror hoje no seu próprio país – que, por extensão, é sua casa. E não se sentir seguro no próprio lar é um medo sem tamanho.
Enquanto passeamos pelas ruas de Staten Island, acompanhando esses desafortunados, nos deparamos com signos que dão corpo ao trio principal: uma homenagem ao gênero slahser com o pôster de Halloween no quarto de Isaiah, o de protesto no de Nya e um homem negro derrubando um branco numa luta de boxe no covil de Dmitri, que serve de uma leva explicação de porque o personagem é tão bom com os punhos. E se a produção investisse melhor nos efeitos especiais, poderia até ser uma experiência mais aproveitável – mas os efeitos de sangue, fogo e explosões, com exceções das práticas, dá um ar de filme B à produção.
Por ter pouco a acrescentar e ao se posicionar apenas por bater na mesma tecla como uma lição a ser aprendida, A Primeira Noite de Crime fica na relevância pelo cenário que temos hoje espelhado em administrações extremas que tomam o campo da política – e ainda que seja um discurso necessário, não é nada diferente dos outros filmes da franquia – e do nosso gosto ao bizarro. O que acontece é que a proximidade entre um filme e outro (2013, 2014, 2016 e agora) não dá espaço para mais reflexões, algo que é necessário quando falamos de História. E considerando que os efeitos desse filme desaguam na série de TV com dez episódios, a partir de agora os produtores estão interessados apenas num rolo compressor ao invés de esperar algum tempo para revisitar essa interessante ideia.
Elenco
Y’lan Noel
Lex Scott Davis
Joivan Wade
Steve Harris
Marisa Tomei
Direção
Gerard McMurray
Roteiro
James DeMonaco
Fotografia
Anastas Michos
Trilha Sonora
Kevin Lax
Montagem
Jim Page
País
Estados Unidos
Distribuição
Universal Pictures
Duração
97 minutos
Tudo começou com um experimento: como os cidadãos de uma das ilhas de Nova York iriam se comportar num período de 12 horas onde qualquer crime era permitido? Chegou a hora de descobrir o início da Noite do Crime.
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