Millenium: A Garota na Teia de Aranha | Crítica | The Girl in the Spider’s Web, 2018
Sete anos depois do original, Millenium: A Garota na Teia de Aranha prefere ser mais um filme de ação na prateleira do gênero e pouco se esforça para ir além disso.
Depois de sair da sessão de Millenium: A Garota na Teia de Aranha, fica difícil definir o maior problema da trama. Poderia ser tentar se equipar ao peso da ótima produção de David Fincher ou se mostrar relevante depois de tantos anos depois dela. Mas mesmo que esses desafios fossem superados, o novo filme de Fede Alvarez, que continua na sua toada de fazer filmes belos tecnicamente e com pouco conteúdo, é um resumo de todo filme de ação básico, acrescentando ao original que falava do necessário tema da violência contra as mulheres, uma trama de intriga internacional que usa um dos maiores clichês de filmes que tem um computador no meio da história.
Ao passar da misoginia para o terrorismo, Alvarez transforma o que era intimismo em ação pura. Agora, Lisbeth (Foy) é uma vigilante com direito à máscara (pintada, é verdade) e capuz que ainda busca justiça contra aqueles que cometem violência direcionada às mulheres. Vindo de uma quarta obra, não escrita pelo falecido autor dos três primeiros, essa nova-velha personagem que ainda é deslocada mesmo em lugares alternativos parece não ter aprendido com suas experiências anteriores. Talvez entre um período e outro ela tenha levado muitas pancadas na cabeça, pois só isso explica o nível de amadorismo que uma personagem tão calejada quanto Lisbeth tem. Se essa é a mesma personagem de Fincher, ela deveria saber, por exemplo, que não se deixa um computador com informações sensíveis exposto por aí por se achar inalcançável.
Tal nível de inocência é visto também num dos assassinos de aluguel ao deixar mostrar uma tatuagem característica, de novo quando Lisbeth não revista August (Convery) e deixa a criança com um celular – que pode ser rastreado facilmente – e no próprio roteiro. Nós já estamos muito avançados no tempo para acreditar que ninguém numa agência como NSA deixaria um programa como o que é mostrado na trama nas mãos de uma só pessoa, pois é isso que parece quando Edwin (Stanfield) sai dos EUA para resolver o problema. E só para fechar essa de esquema mais básico possível de um filme de espionagem, esse tal software pode hackear qualquer míssil nuclear no planeta, mesmo que saibamos que tais arsenais não estão conectados em rede.
Podemos, porém, voltar nas qualidades de Alvarez, aquelas que nos lembram que ele é um bom diretor – e nessa terceira investida, eu me pergunto se ele apenas teve o azar de não trabalhar com bons roteiros. Fora a trilha sonora, que aponta para essa decisão de ser um filme de ação no sentido mais estrito da palavra e deixa o moderno Trent Reznor para dar lugar ao classicismo de Roque Baños, precisamos apreciar os elementos do filme que funcionam. Então, se aceitarmos esse universo que Lisbeth e Mikael (Gudnason) agora se encontram, não há defeito nas cenas de corrida, perseguição de motos ou na troca de tiros – e perdoamos até o exagero tecnológico na conclusão da trama.
O filme acerta em outros conceitos, começando pelo paralelo do jogo de xadrez – prenunciando o confronto mais cerebral guardado para o fim – como August representa uma inocência que parece ter sido exaurida do nosso mundo (ele pede que Lisbeth não mate ninguém, tem saudades da mãe e escolhe o carro menos discreto para servir de veículo de fuga) e há algo de legado entre os dois quando jogam uma partida de xadrez. É digno de destaque também quando Alvarez transforma a percepção de Lisbeth na nossa e que o lugar que ela escolhe como esconderijo é um antigo templo do conhecimento, que mesmo sem teto pode ser mais aconchegante que a casa que ela deixou no começo do filme.
Acredito que até mesmo Mikael ser menos relevante à trama do que quando interpretado por Daniel Carig existe um sentido, que é elevar o patamar de Lisbeth, Camila (Hoeks) e Gabriella (Lund). É nesse trio que a história se desenvolve e também por elas que as partes se tornam importantes. Os homens são quase anexos, às vezes tão estúpidos que nos perguntamos como caíram tão facilmente na teia que é tecida durante o filme. Afinal de contas, nem mesmo como parceiro sexual Mikael serve mais. À princípio, parece que os três jogadores que irão colidir são os três homens, mas ainda bem que o roteiro não segue o básico tão à risca, deixando ao menos esse gosto diferente.
Agora imaginem se esse recado fosse transmitido pelos produtores, pois fazer um filme com três mulheres em posição de destaque sem uma na cadeira de direção é a parte mais frustrante do filme. Por algum motivo que ainda me foge, a maior parte de Hollywood acredita que um filme de ação só funciona nas mãos de um homem, ainda que essa pessoa tenha entregado dois filmes que pendem mais para o suspense e com resultados questionáveis. No cinema, essa arte tão características por trabalhar signos, mensagens são tão importantes quanto a imagem em si – e não há ninguém nessa indústria inocente ao ponto de não enxergar isso. O que devemos nos perguntar às vezes é o que eles querem dizer com essas escolhas.
Se a escolha de uma abordagem tão básica em Millenium: A Garota na Teia de Aranha refletir o gosto por um entretenimento direto em tempos tão complicados, isso tem um grande simbolismo. Ou, numa visão menos pessimista, poda fazer voltar o interesse pelo filme de 2011, mais sombrio, perturbador e interessante. Funcionando quase como reboot – eu diria quase dizendo não ser necessário ver o filme Finch – a nova história de Lisbeth deve atrair um público novo e mais interessado em uma ação nos moldes de Missão: Impossível, inclusive na possibilidade de ser uma nova franquia. Se for assim, é preciso sair do básico e ousar um pouco mais para se tornar relevante.
Elenco
Claire Foy
Sverrir Gudnason
LaKeith Stanfield
Sylvia Hoeks
Stephen Merchant
Direção
Fede Álvarez (O Homem nas Trevas)
Roteiro
Steven Knight
Fede Álvarez
Jay Basu
Baseado em
A Garota na Teia de Aranha (David Lagercrantz)
Fotografia
Pedro Luque
Trilha Sonora
Roque Baños
Montagem
Tatiana S. Riegel
País
Alemanha
Canadá
Estados Unidos
Reino Unido
Suécia
Distribuição
Sony Pictures
Duração
115 minutos
Data de estreia
08/nov/2018
Lisbeth Salander está de volta. Atuando como vigilante, ela se encontra numa trama internacional de terrorismo e mais uma vez o destino a colocará no caminho de Mikael Blomkvist.
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