Corra! | Crítica | Get Out, 2017, EUA
Corra! (Get Out) é um interessante filme que critica uma sociedade que ainda vê os negros como material de trabalho forçado.
Elenco: Daniel Kaluuya, Allison Williams, Lil Rel Howery, Bradley Whitford, Caleb Landry Jones, Stephen Root, Catherine Keener | Roteiro e direção: Jordan Peele | Duração: 103 minutos
Considerando a situação e tensão que alguns casos de racismos que chamaram a atenção da mídia recentemente nos EUA, Corra! pode até ser considerado óbvio. Mas não se engane por isso, porque a necessidade de se fazer um filme com um obviedade dessas é que faz a situação ser preocupante – isso no mínimo – e até assustadora. Misturando elementos de suspense, comédia dark e até um pouco de ficção científica, Peele apresenta um retrato pessoal e intimista sobre como é ser negro hoje na nação mais poderosa do mundo. A história na tela faz isso de maneira direta e com pouca margem para interpretações, na esperança que dessa maneira a mensagem seja compreendida pela audiência.
Percebam como a cena inicial, que serve de prólogo e já dá dicas da situação, é tensa. E depois nos perguntamos como o diretor fez isso com alguns poucos minutos: é por todo o cenário dentro do quadro – a fotografia escura, o plano-sequência que segue o personagem negro e a ameaça sem rosto – quanto o fora dele – ou seja, é necessário um prévio conhecimento da situação sócio-política, como os protestos em Ferguson (Michigan) para compreender melhor. E aos poucos o Peele vai introduzindo signos para mostrar a motivação dos personagens, começando aqui com a máscara preta do motorista, algo que o diretor continua a fazer durante o filme.
Um prólogo bem feito serve de metáfora para a própria história e gastar algum tempo pensando nele parece o que Peele tem em mente ao mostrar, por alguns minutos, cenas mais intimistas de Chris (Kaluuya) – também para diminuir a tensão que acabamos de passar – para mostrar seu olhar observador e sensível como fotógrafo, e de Rose (Williams), que de tão doce com o namorado compra café e rosquinhas para o café da manhã. Ela é tão perfeita que não permite que um policial peça a identidade de Chris por causa de um acidente de carro envolvendo um cervo (um símbolo que é repetido mais de uma vez na história, sendo a primeira durante um jantar).
Esse olhar sensível faz realmente Chris questionar tudo à sua volta. São situações e diálogos muito forçados, como o pai de Rose, Dean (Whitford) chamar o namorado da filha várias vezes de “Meu irmão” (“My man”, no original – que depois se torna uma premonição) ou na festa que é dada onde todos os convidados brancos se debruçam sobre Chris para perguntar do seu vigor físico, como são fãs de Obama, Tiger Woods, até sexualizando o personagem nos já conhecidos estereótipo dos negros que não passam de objetos sexuais, tanto homens quanto mulheres. Isso junto com outros signos dignos de serem comentados, mais sutis, de novo relacionados ao preto seja no figurino ou nos carros que os personagens da festa chegam. Outra premonição.
A decisão do diretor em inserir um pouco de comédia com o personagem Rod (Howery) serve, de novo, para cortar a tensão e para que ele seja o grilo falante de Chris. O rapaz já tinha muita certeza de que algo estava terrivelmente errado na casa de campo dos Armitage, mas seu amor por Rose era um porto seguro e as piadas de Rod são uma tentativa de tirá-lo do torpor, além de fazer bem para a audiência em oposição àquele riso de nervoso que acontece depois de uma cena de terror.
Peele consegue também enganar a audiência, mesmo que ele entregue muito cedo a responsabilidade no comentário de um dos personagens, ao usar a montagem e cenas que tradicionalmente são cheias de doçura. Porque vários momentos após a sessão de hipnotismo de Missy (Keener) em Chris poderia ser facilmente levado para algum tipo de ilusão, principalmente quando percebemos a mudança de fotografia para tons azulados. Isso acontece em especial na cena que Chris vai ao andar de cima da casa e os outros convidados se calam para ouvi-lo se deslocando (numa mistura do que ele está sentindo com a realidade).
Em Corra! há sonhos quebrados, conveniências que se justificam, signos que apresentam o que personagens querem ser e uma crítica que temos que compreender. Esse que os escreve, um homem branco de classe média, não sabe o que é viver num país onde a população negra é de pouco mais de 10%, mas são quase 30% dos desaparecidos, com descaso da mídia e da força policial. Nesse cenário que no filme é quase uma fantasia, onde Chris se vê num cenário retrô e antiquado para descobre seu destino, é que Peele nos pega pelo colarinho para apontar, por meio da ficção (uma neo-escravidão), o que há de errado com o mundo – assim como a luz é usada no filme par libertar. E usar o cinema para fazer isso é para mostrar para as massas. E quem achar que não é verdade, tem a oportunidade de confrontá-lo depois que assistirem ao filme.
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Corra! | Sinopse
Chris (Kaluuya) é um jovem afro-americano que tem um relacionamento inter-racial com Rose (Williams) que vai finalmente conhecer a família namorada. O comportamento exagerado dos pais e do irmão de Rose parece um jeito peculiar deles lidarem com a situação, mas é durante esses dias que Chris irá descobrir a verdadeira razão dessa visita.
Corra! concorre ao Oscar 2018 nas categorias Melhor Filme (Jason Blum, Edward H. Hamm Jr., Sean McKittrick e Jordan Peele), Melhor Diretor (Jordan Peele), Melhor Ator (Daniel Kaluuya) e Melhor Roteiro Orginal (Jordan Peele).
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