Cinquenta Tons Mais Escuros | Crítica | Fifty Shades Darker, 2017, EUA
Cinquenta Tons Mais Escuros entra em autofagia, repetindo os próprios clichês e diminuindo mais ainda a figura da protagonista e de outras mulheres.
Elenco: Dakota Johnson, Jamie Dornan, Kim Basinger, Luke Grimes, Eloise Mumford, Max Martini, Eric Johnson, Rita Ora, Victor Rasuk | Roteiro: Niall Leonard | Baseado em: Cinquenta Tons Mais Escuros (E.L. James) | Direção: James Foley | Duração: 118 minutos
Estamos na segunda história e Cinquenta Tons Mais Escuros se mostra apenas como um adendo da aventura erótica do anterior com palavras a mais. Se na primeira vez havia um ar de novidade ao trazer ao grande público (sugeridas) cenas de sexo e sadomasoquismo, a continuação é um grande engodo que tenta parecer séria ao tratar temas delicados e polêmicos, mas causa risos involuntários. Junte isso com a baixa qualidade de atuação da dupla de protagonistas, um diretor que parece ter se esquecido do significado da palavra dirigir e um roteiro que é apenas mais um romance disfarçado de moderno e temos uma das maiores enganações do ano.
É normal nos agarrarmos em algum aspecto por menor que ele seja para tentar escapar da frustração que vem depois de duas horas sentados numa sala escura. É uma tarefa difícil na continuação da história de Anastasia (Johnson) que não se preocupa em trazer uma novidade. O roteiro – e o livro, aparentemente – repete os clichês, a falta de dinâmica dos protagonistas, a falta de vontade (ou capacidade) de fazer diálogos críveis e a irritante maneira de transformar cenas em vídeo clipes para que as músicas de artistas pop – a que se destaca é a cantora Sia – não sejam picotadas por questões comerciais.
Há, porém, uma tentativa no passado ainda não bem explicado de Christian (Dornan) de deixar a trama mais séria ao lidar com temas pesados como o abuso de drogas, violência doméstica e abuso sexual. Por ser, afinal de contas, um drama – pelo menos é assim que é vendido – é algo a se esperar: um pouco de profundidade na alma machucada dos personagens, algo representado pelas marcas físicas que podemos ver no peito de Christian e que pode ser levado também para o simbolismo – do coração – ainda que seja uma aproximação óbvia, próprio de uma escritora iniciante como James é (ou pelo menos era).
No filme de 2015 havia problemas que claramente eram por causa da pouca habilidade da diretora em fazer seu trabalho e na continuação a situação piora – o que indica os grandes problemas da fonte original. Foley é tão preguiçoso ao dirigir que nem nas cenas iniciais do flashback de Christian tem a segurança de confiar na percepção do público de perceber coisas claras – a mudança de fotografia, por exemplo – e insere flashs brancos para mostrar a transição do tempo. O diretor também se esquece de que Anastasia é a protagonista e pelo menos duas vezes mostra cenas em que ela não está presente. Isso reforça a insegurança do diretor e reforça o já citado problema com a montagem.
Mas ao invés de se preocupar em contar uma história que precisa acelerar por causa de um iminente perigo, a história volta para o romance com cenas bonitas de Anastasia e Christian velejando, uma discussão em que ela bate o pé por vários minutos sobre uma viagem de trabalho para ser destruída dois minutos depois ao dizer ao chefe que decidiu não viajar – então, qual foi o ponto da conversa? – e repetições irritantes de perguntas que sabemos quais são porque as ouvimos nas cenas de dois minutos antes. Tudo para estender a trama para fingir que há mais recheio nessa casca fina que agora nem consegue ser bonita por fora, com exceção da cena do Baile de Máscaras. Que infelizmente vemos muito pouco.
Outro problema é a conveniência da vida em volta da protagonista. Ana é uma mulher que tem a privacidade invadida por meio mundo: pelo próprio Christian que tem um dossiê sobre ela, sabe de seu novo emprego e tem os dados bancários da moça; do amigo fotógrafo José (Rasuk) que usa a imagem da moça numa exposição, aparentemente sem a autorização; e por Leila (Heathcote) que, por algum motivo, consegue sair do radar de Christian e seus detetives particulares, mas que tem a maior facilidade do mundo em seguir os dois e causar estragos. E o pior é que a dupla de namorados parece esquecer-se disso, sem um indicador que as coisas tinham se acalmado.
Os motivos para Anastasia continuar com Christian também são bem problemáticos, considerando que tudo o que ele faz grita o alerta de perseguidor. Saber quando ela muda de emprego, os dados da conta bancária, comprar a empresa que ela trabalha. Qualquer pessoa em sã consciência teria saído correndo – uma sensação compartilhada por quem escreve aqui, que queria sair correndo da sala de cinema – e se adicionarmos o fato que com dez minutos de filme Christian se diz disposto a mudar, mas ainda tem atitudes abusivas, como ameaçar a levar Anastasia carregada para casa. Mas não. De novo pintando com uma fachada avançada por causa do teor sexual, o filme é só mais um romance como tantos já vistos.
Isso fica pior ainda quando percebemos que Leila ficou perturbada porque não conseguia mais ficar longe de Christian. Isso é errado em tantos níveis – uns cinquenta, digamos – que é surpreendente como isso pode ser visto como entretenimento passageiro. Não é repetir demais: E.L. James e qualquer pessoa envolvida na produção dessa produção de massa quer enganar quem acha que está sendo moderno só porque a trama envolve tapas, brinquedos sexuais e masturbação em público. E o pior é perceber que isso não vai mudar na terceira parte – era uma esperança que havia no fim da primeira parte, mas não há indícios que isso vá acontecer.
A trama rasteira de Cinquenta Tons Mais Escuros tem tons novelescos com aparições em conjunto com descobertas, um número elevado de sub-tramas (a submissa, a ex-namorada de Christina, o acidente de helicóptero, a foto tirada na festa de máscaras) que vão arrastando a história, além de apelar para clichês tanto narrativos quanto visuais – é de matar de vergonha a cena que Christian salva a vida de Anastasia, o que a deixa irritada por algum motivo (e só faltou alguém gritar ao fundo que é pelo fato dela ser mulher) e caminha por algum tempo embaixo da chuva – e a personificação de um personagem que de tão perfeito, quase um semideus, nem uma coisa básica como uma queda de helicóptero é suficiente para diminuir o vigor físico.
Junto com a frase do ano “Você me ensinou a foder, ela me ensinou a amar”, que levou à sessão às gargalhadas, o filme tem uma cena entre créditos, se você aguentar ficar até o final.
Cinquenta Tons Mais Escuros | Trailer
Cinquenta Tons Mais Escuros | Pôster
Cinquenta Tons Mais Escuros | Galeria
Cinquenta Tons Mais Escuros | Sinopse
Christian Gray (Dornan) está de volta para tentar fazer que Ana Steele (Johnson) volte para a sua conturbada vida com a promessa de que ele é um homem que está tentando mudar. Ela lhe dá uma nova chance de construírem um novo relacionamento, mas o passado de Christian irá perseguir os dois, o que ameaçará esse futuro entre eles.
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