Até o Último Homem | Crítica | Hacksaw Ridge, 2016, EUA-Austrália

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Até o Último Homem passeia entre os clássicos filmes de guerra e reafirma a fé do diretor.

Até o Último Homem (2016)

Elenco: Andrew Garfield, Sam Worthington, Luke Bracey, Teresa Palmer, Hugo Weaving, Rachel Griffiths, Vince Vaughn | Roteiro: Andrew Knight, Robert Schenkkan | Direção: Mel Gibson (Coração Valente) | Duração: 139 minutos

Dependendo da sua visão de mundo, Até o Último Homem vai chamar atenção por motivos diferentes. Para quem é fã dos clássicos filmes de Guerra ou àqueles que buscam uma resposta espiritual no meio do caos, o diretor Mel Gibson, felizmente, consegue equilibrar esses motivos sem deixar que um se sobreponha ao outro – mas não tem receio em expressar a sua fé através da nova produção. Com três atos bem definidos, o diretor mostra o caminho de alguém contra a maré e o senso comum que não precisa ser aplicado necessariamente num viés religioso, o que é inspirador para qualquer um que acredite que pode fazer a diferença em seus próprios termos.

É um tanto inútil desprender a mensagem religiosa com tantos símbolos na história – um paralelo entre Caim e Abel, por exemplo, bem marcante – o que pode ser rechaçado como algum tipo de fuga por uma plateia mais cética. O que Gibson faz é mostrar um Desmond Doss (Garfield) como representante da humanidade que tem dentro de si capacidade de levantar-se contra o seu semelhante. No caso dele, ainda jovem, ao atacar o irmão com um tijolo e percebendo o mal que poderia fazer, ele nega essa natureza e o faz através da crença espiritual, em específico no Sexto Mandamento. E fazendo outro paralelo com as palavras da Bíblia, Desmond é perseguido por isso. Portanto, condenar a escolha do personagem seria hipocrisia porque ele se mantém firme na sua decisão.

Passado a percepção de o espectador acreditar em algo divino ou não, tomamos carinho pelo personagem. Disposto a ajudar desde cedo – de novo uma simbologia quando Desmond sai de um serviço na igreja para o hospital – aquele rapaz de alma bondosa e uma cara inocente é a representação desse primeiro ato que explora a doçura de um personagem que encontrou a redenção. Tanto que um ato de violência do pai, Tom (Weaving), que acontece cronologicamente antes de Desmond se alistar, é jogado para o ato seguinte para mantermos essa imagem. Pode ser difícil acompanhar o personagem nessa toada e podemos ver facilmente Gibson puxando os fios para manipular a audiência – e todo diretor faz isso, em escalas maiores ou menores – mas essa é a essência do filme, o que desafia um não crente.

O interessante fica por descobrimos como é que, afinal de contas, o agora soldado Doss vai escapar do treinamento básico sem completar uma das partes essenciais, que é aprender a atirar. Logicamente parece impossível e com a presença do Sargento Howell (Vaugh), que começa estereotipado para ser desenvolvido durante a história, e outros colegas de pelotão que são punidos enquanto Desmond não desistir. E as soluções para isso vêm da providência ou de conexões? Por um lado poderíamos dizer que, pelo histórico de Gibson, ele atesta a primeira versão. Porém é fácil também defender a segunda – e essa abertura de deixar o espectador escolher é um dos grandes trunfos dessa narrativa.

Gibson quase transforma Desmond em alguém pronto para ser canonizado. Porém para mostrar a humanidade dele, o diretor o coloca em dois momentos de, podemos dizer assim, revolta contra Deus. A primeira vez é quando ele diz que não apanhou dos colegas de pelotão durante a noite – assim quebrando um dos Mandamentos – e o segundo quando ele está preso por desrespeitar uma ordem direta de um superior. Preso, Desmond começa a bater nas paredes e bagunçar sua cela e a luz que antes projetava uma cruz, por causa das grades, some. É nesse momento de revolta que Desmond enfrenta a sua falha como humano diante do criador. Mais uma vez, o diretor não nega a parte espiritual.

Demora um pouco para entrarmos no estilo clássico de Guerra, mas a parte anterior é tão bem construída e necessária para entendermos o personagem que a espera vale a pena. Em contraste com a sensação e cores do primeiro ato, no terceiro Gibson aposta em contrastes das tropas – sujeira, fuligem e sangue em todos os homens que estavam lutando antes de Desmond e seus companheiros chegarem – e, para marcar os horrores da guerra, o diretor usa violência crua na visão de corpos amontoados e pedaços de gente voando pela tela por causa de explosões. Não é bonito, algo que o diretor mostrava desde A Paixão de Cristo (The Passion of the Christ, 2004), mas é uma carta de intenção ao não romantizar a guerra. Inclusive, mostrando a sua experiência adquirida, o diretor corta a trilha sonora, dando um ar quase documental à história, ainda que exagere nos closes.

Por se aproximar mais dos filmes clássicos, Gibson mostra uma faceta que lhe renderá de novo polêmicas – como em seus filmes anteriores – porque ele chega a ser xenófobo. Indiscutivelmente, o diretor faz uma aproximação dos japoneses tão superficial que os inimigos dos americanos não passam de seres grunhindo enquanto avançam contra as tropas de Desmond e sua companhia. Não é apenas a questão do ponto de vista, mas limitar uma nação apenas ao estereótipo, mesmo sendo da época, é apenas reforça-lo. Nesse quesito faltou tato ao diretor, algo parecido com a parte da história que é o pai de Desmond faz um drama pela escolha do outro filho se alistar, mas que depois é esquecido na narrativa – um destino que deve ter sido deixado na sala de montagem.

E se antes os tiros e explosões marcam a produção como um legítimo filme de guerra, é perto da conclusão que ele ganha uma tensão que funciona inclusive para quem conhece o desfecho da história de Desmond Doss. No mantra “Deus, deixe-me levar só mais um” entoado em muitas cenas noturnas – e por isso é essencial que esse filme seja visto no cinema – Gibson consegue nos colocar junto de Desmond, naquele momento sem saber se ele poderia levar um, cinco, dez ou cem. Mas já estamos tão afeiçoados com essa figura que nos pegamos torcendo para que ele consiga descer até quem antes o maltratara.

E apesar de ser um filme belicoso, Até o Último Homem não glorifica a situação da guerra. Os grandes desafios de Desmond – o alcoolismo do pai, a distância da esposa, os conflitos dentro do pelotão – são, de alguma maneira, influenciados por essa realidade suja e nada simples como a da Terra de Ninguém. Desmond diz ao pai “eu vou servir do meu jeito” e essa é convicção de Gibson que se posiciona contra, por exemplo, a ideologia do movimento hippie e da não-violência durante a guerra do Vietnã, dizendo que mesmo na guerra você precisa agir de algum jeito. Assim como a mensagem religiosa, não se pode desassociar uma coisa da outra. Essa pode se tornar uma daquelas produções atacadas por um lado e defendidas por outro. Mas fazem falta filmes com essa proposta de levantar discussões.

Até o Último Homem | Trailer

Até o Último Homem | Pôster

Até o Último Homem | Cartaz

Até o Último Homem | Imagens

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Até o Último Homem | Sinopse

Durante a Segunda Guerra Mundial, o soldado Desmond Doss (Garfield) escolheu servir ao seu país sem deixa de lado sua fé. Ao ser convocado para a linha de frente durante o conflito contra os japoneses sem portar armas e sem saber atirar, o soldado médico se tornou um exemplo para seus companheiros de tropa. Baseado em uma história real.

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".