Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald | Crítica | Fantastic Beasts: The Crimes of Grindelwald, 2018
O retorno ao Mundo Bruxo em Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald é menos eficaz que seu predecessor, mesmo com temas mais sérios abordados.
Há um recado bem dado na nova aventura do mundo bruxo: ninguém ali está com pressa. Assim saímos da sessão de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald, uma produção que embalada pelo sucesso da saga Harry Potter vai atrair um público órfão de uma das sagas literárias/cinematográficas de maior impacto na cultura recente. Com outros três filmes planejados – o próximo foi prometido ter o Rio de Janeiro como cenário – Rowling e Yates entregam uma obra que serve apenas de tapa buraco, que passeia entre o complicado e o básico, sem saber se afirmar. Pior é a excessiva ligação com a obra original, o que mostra um perigoso engessamento de histórias que já sabemos o desfecho.
Por estar às portas da Segunda Guerra Mundial, Rowling não para de fazer alegorias à proximidade desse evento. Com sua pele e cabelos claros, como um ariano extremo, Grindelwald (Depp) e seu poder de lábia, convencimento e a maneira que coopta um jovem auror é uma referência nada sutil a gente como Hitler e até mesmo Trump. Essas referências vão até o final da produção, onde Grindewald faz um discurso sobre o mal que cairá sobre o mundo, como os puro-sangue são especiais, num cenário que ao fundo tem o corvo da família Lestrange, que lembra o Reichsadler, a águia imperial que o terceiro reich cooptou da mesma maneira que fez com a swastika.
Claro que o cenário chuvoso e tempestuoso que indica a situação que se avizinha, além da ousadia de Grindelwald, serve de contraste à personalidade mansa e acanhada de Newt (Redmayne), algo que notamos desde o primeiro filme. Por ser uma continuação, a história não se apega tanto a isso, apesar da primeira parte do filme também reforçar a característica de Newt se relacionar melhor com pessoas do que com gente. Elementos novos como a introdução de Teseu (Turner), irmão de Newt, servem de contraponto ao retorno de Tina (Waterston), Queenie (Sudol) e Jacob (Folger). Esse último num retorno bem forçado, dizendo que a magia de Newt no primeiro filme apagaria só as lembranças ruins.
É verdade que podemos admitir muitas coisas na mágica, então, mesmo sem dizer nominalmente, podemos perdoar esses exageros – se bem que é bem raso quando tudo é explicado por mágica. O que não se desculpa, porém, são os problemas de desenvolvimento com Grindelwald. Enquanto nos outros há uma tentativa de mudança nesse mundo que está próximo de uma guerra, é difícil entender como o bruxo fugitivo poupa a vida de um dos bruxos que o aprisionou e é cruel o suficiente para deixar que uma criança non-maj morra. Poderíamos até dizer que isso denota como o personagem trata aqueles que considera inferior, mas ele não mostrou nenhuma misericórdia com outros algozes.
Para quem estava com saudades da saga original, a visita a Hogwarths e a presença de Dumbledor (Law) servem de alento. Mas também como um grande fan-service. Enquanto o primeiro filme das aventuras de Newt usam os livros e filmes de Harry Potter como uma base a se apoiar, aqui o filme se liga à tal maneira de que será altamente improvável, para não dizer impossível, se desligar nos filmes seguintes. É como se Rowling tivesse um medo parecido com o que Ridley Scott teve ao entregar Alien: Covenant (2017), de que seu universo principal fosse esquecido. Mas, com a promessa de que essa seja uma nova pentalogia, Rowling pode se dar ao luxo de escrever quanto quiser e esperar os lucros chegarem.
Existe uma coisa inegável na produção: tecnicamente, ela é ótima. O 3D funciona até em cenas noturnas, os efeitos especiais fazem o seu papel de transformar a mágica em mágica e os figurinos refletem a personalidade de seus personagens. É divertido notar como Jacob está sempre normal e como isso contrasta com as roupas dos bruxos, ou a aproximação maior de Tina com uma agente dos tempos de Eliot Ness, assim como os outros aurores da trama. Até mesmo as grandes criaturas parecem mais reais, apesar de que a produção ter o cuidado de dar algo de, bem, fantástico neles para que sejam descolados na nossa realidade.
Isso tudo para esconder a fragilidade do roteiro. Existe algo de megalomaníaco em prometer cinco filmes sem saber como os primeiros se darão em questão de bilheteria, mas Rowling está tão certa que tudo dará certo que seu roteiro é pouco mais de um fiapo de história, que precisa de missões secundárias – como a caça de um dos animais fantásticos pelas ruas de Paris – para se considerar um longa metragem. Ao invés de usar esse tempo para desenvolver melhor o medo de Creedence (Miller), a relação dele como Naguini (Kim) ou como os dois foram parar no circo, Rowling e Yates preferem gastar tempo em cenas como a caminhada de Jacob e Newt, sendo que o poder do bruxo poderia fazê-lo se aproximar mais do destino deles.
No fim das contas, essa abordagem rasa é um descaso com o público. Com um nome tão grande, e merecido, Rowling pode pedir duas horas, duas horas e quinze de filme e lhe serão entregues. Mas ao não aproveitar esse tempo, reforça que as coisas menos importantes são mais fáceis de dizer, e como seu nome como assinatura, tudo seria perdoável. A minha previsão, e espero estar errado, é que os dois próximos filmes serão como o penúltimo livro/filme de Harry Potter, deixando muita coisa para contar na conclusão, mesmo adicionando mais quinze minutos à trama. Aconteceu com Transformers, Velozes e Furiosos e com O Hobbit – que não souberam quando parar.
O que temos então é uma vírgula, um símbolo que serve para dizer que a saga capitaneada por Newt e Grindelwald é um momento menos interessante entre o filme de 2016 e o de 2024. Existe sim uma esperança, mas ao esticar tanto uma história ao ponto de termos que aceitar toda a solução como mágica, vai nos tirar desse mundo fantástico. O filme passa até mesmo por erros conceituais – afinal de contas, onde estão os crimes de Grindelwald aqui? – e conveniências, como o Ministério da Magia Francês subitamente ficar vazio. E de que adianta inserir uma nova cultura, no caso a francesa, se o roteiro não aproveita para mostrar as diferenças desses novos pontos de vista?
Voltando às partes boas, é interessante como Yates e Rowling tentam chegar ao seu público-alvo. Os mais jovens não sabem o que é viver um terror da guerra, e talvez nem saibam de planos de exterminar uma raça toda. Eles usam então Grindelwald como totem dessa lembrança, um homem tão perigoso que teve a língua removida para que não influenciasse ninguém com seu discurso. Mas é preciso que os responsáveis entendam que a relação com seus espectadores começou de novo com o primeiro filme, e que precisam amadurecer junto dessa audiência. O que essa saga precisa que sua mãe seja menos protetora: se Rowling deixar de ser roteirista, ainda existe salvação. Mas não enquanto ela tratar o universo que criou como seu brinquedo.
Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald tem alguns apontamentos políticos, o que mostra como a política influência a fantasia, com Rowling advogando contra o porte de armas (uma cena especialmente tensa mostra o que acontece se todo mundo saísse armado por aí), o discurso excludente que tantos líderes fazem hoje e que, eventualmente, teremos que escolher um lado. Somos todos animais políticos e é nessa parte que o filme realmente funciona, mas faltou moderação. Se soubéssemos que essa seria menos filmes, poderíamos ter um filme mais dinâmico hoje para em 2020 fecharmos com uma trilogia digna da importância de Harry Potter. Mas se esse filme for exemplo do que vem por aí, serão longos anos de espera – o que nada tem a ver com o hiato entre uma produção e outra.
Elenco
Eddie Redmayne
Jude Law
Johnny Depp
Ezra Miller
Zoë Kravitz
Katherine Waterston
Dan Fogler
Alison Sudol
Callum Turner
Claudia Kim
William Nadylam
Kevin Guthrie
Direção
David Yates (Animais Fantásticos e Onde Habitam)
Roteiro
J. K. Rowling
Fotografia
Philippe Rousselot
Trilha Sonora
James Newton Howard
Montagem
Mark Day
País
Reino Unido
Estados Unidos
Distribuição
Warner Bros. Pictures
Duração
134 minutos
Data de estreia
15/nov/2018
3D
Relevante
Depois de dois de anos de sua captura, o bruxo sombrio Gellert Grindelwald escapa de sua prisão e continua sua missão para controlar o jovem Credence Barebone. Os caminhos deles novamente cruzarão os de Newt Scamander, seus velhos amigos, e um novo aliado: Alvo Dumbledore.
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