Toni Erdmann | Crítica | Toni Erdmann, 2016, Alemanha-Áustria
Toni Erdmann é um daqueles filmes que não sabemos como apresentar, mas que mesmo assim nos conquistam.
Elenco: Peter Simonischek, Sandra Hüller, Ingrid Bisu, Michael Wittenborn, Thomas Loibl, Trystan Pütter, Hadewych Minis, Lucy Russell, Vlad Ivanov, Victoria Cocias | Roteiro e direção: Maren Ade | Duração: 162 minutos
Toni Erdmann é como seu personagem título: gostamos, mas não sabemos muito bem o que fazer com ele. É um desafio apresenta-lo ao grande público, aos amigos ou familiares. É um pouco contraditório se expressar assim, mas a produção de Maren Ade é estranhamente boa, diferente do que estamos acostumados; e também estranhamente familiar e divertida. As situações que os personagens passam são extrapolações das que nós passamos nas relações familiares, elementos que a diretora usa para reforçar a mensagem do filme, que podem ser descritas como absurdas – o que não quer dizer que nelas não haja algum tipo de realidade.
Por algum motivo que não nos importa no momento, Winfried (Simonischek) gosta de pregar peças. Ele é o oposto daquele idoso rabugento que vai percebendo durante a narrativa que existem motivos para a felicidade. Ele é engraçado porque todos à sua volta não são, o que faz sentido se lembrarmos da austeridade do povo germânico. Então, ele é um bufão – num cenário brasileiro, ele poderia ser o “tio pavê” – numa sociedade metódica e que se dá pouco tempo ao riso, uma persona representada em sua filha Ines (Hüller) que é tão dedicada ao trabalho que prefere fugir de compromissos como a própria festa de aniversário e fingir que está ao telefone.
E por mais que não entendamos as piadas de Winfried é impossível não nos sensibilizarmos com um personagem que se sujeita a dormir do lado de fora para fazer companhia ao cão que não tem mais forças para entrar em casa. Uma pessoa que brinca com o entregador de correspondências dizendo que no pacote havia uma bomba – e temos que considerar o tempo que a Europa vive hoje com medo de ataques terroristas – e que faz piada com a morte da própria mãe é bem imprevisível, outra parte da personalidade explorada por Ade. Em geral, apesar de conhecermos a sinopse, é um tanto difícil adivinhar o próximo passo de Winfried.
Em Bucareste, numa dessas imprevisibilidades, ao visitar a filha é que há o grande choque entre eles. Winfried é caracterizado como um homem bem simples que se esconde na personalidade piadista ao colocar as próteses dentárias, sempre andando com sua bolsa de pano em oposição a uma já sofisticada Ines. Ela se protege tanto nessa couraça que não se permite nem mostrar que está preocupada com a presença do pai no seu território que sofre sozinha – uma característica representada pela consequência física do machucado que só se permite sentir quando Winfried vai embora. O que dá a oportunidade da diretora mudar a narrativa para Ines.
Essa mudança de foco na narrativa trás alguns questionamentos da característica de Inês. Começa com um tanto de infantilidade nessa personagem adulta quando ela briga com o pai por ele não a ter acordado para um compromisso – afinal, a responsabilidade era dela – e passa por outros cotidianos de uma vida adulta. Então, se já conhecemos o pai, é hora de conhecer a filha. Diferente da simplicidade do pai, Ines é mais sofisticada e está numa posição de liderança que afeta até a relação com um namorado, numa das cenas mais marcantes do filme que envolve fluídos e doces – de certa maneira, e tomada as devidas proporções, é a herança da imprevisibilidade herdada de Winfried.
E finalmente conhecemos Toni Erdmann (Simonischek), um novo ponto de vista que a diretora nos mostra: a tentativa do pai se aproximar mais da filha. Se Winfried poderia ser chamado de excêntrico, Toni vai além ao se embrenhar nas relações de amizade e trabalho de Ines. Aqui é preciso uma pausa para identificar porque ele faria isso. Nessa mistura de drama e comédia, o pai percebe que está se afastando cada vez mais da filha, o que o deixa em desespero. Então Toni é a última cartada. O que enverada para a comédia é que não existe um plano e por não saber o que fazer, Toni faz de tudo. A farsa é apenas o começo, mas cada mentira que Toni conta para o círculo expandido de amizade de Ines acaba contaminando a filha, algo que percebemos na exigência dela em sua festa de aniversário – e esse ato imprevisível e engraçado é a chance do pai poder se reconectar com a filha.
Num misto de vergonha com se deixar levar, e até um pouco ridículo, Toni Erdmann é uma produção tocante, mesmo nesse universo quase insólito que os personagens nos levam. Entre essas risadas que as situações nos levam também fica a reflexão sobre quando dizemos que podemos nos virar sozinhos quando na verdade precisamos de ajuda. Desesperadamente, às vezes. Há inclusive discussões filosóficas sobre o que é ser feliz – é algo mais simples ou precisamos pensar mais no significado da palavra? – e o signo da morte sempre presente – na apresentação de Winfried com algumas crianças e no desfecho. É um filme com duração maior que estamos acostumados comercialmente, mas nem isso tira o charme do filme, desde que estejamos dispostos a receber essa excentricidade toda.
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Toni Erdmann | Sinopse
Ao perceber que não consegue mais se relacionar com a filha Ines (Hüller), Winfried (Simonischek) cria um alter ego para essa missão: o excêntrico Toni Erdmann.
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