Terra Selvagem | Crítica | Wind River, 2017
Terra Selvagem é um grito em favor dos esquecidos e àqueles que são empurrados para debaixo do tapete.
Existe, no meio dos mais conservadores, a ideia que a sociedade é dividida entre ovelhas, lobos e cães pastores. E Terra Selvagem é uma produção que recorre a essa ideia, não por uma paixão dos estadunidenses por armas, mas sim por mostrar que em algumas partes daquele grande país essa é a mais pura verdade. Taylor Sheridan, mais conhecido por seus trabalhos como roteirista, fecha a sua trilogia espiritual das fronteiras do EUA dessa vez dando atenção aos nativos norte-americanos e como os eles foram relegados à uma pequena parte de um território que foi deles. Apesar dos temas universais abordados, é uma carta de posicionamento contra toda uma cultura do esquecimento.
Um rápido momento nos marca durante a projeção quando Cory (Renner) chega na parte da reservada aos indígenas no Wyoming. Ali, na fronteira, a bandeira dos EUA aparece de cabeça para baixo. O estado não é conhecido por suas temperaturas amenas, mas a região perto das montanhas é como a periferia do lugar, mais gelada que a parte urbana, algo que só reforça a pobreza dos nativos. E uma sociedade esquecida pelo Estado é fatalmente dominada por um poder paralelo – veja o Rio de Janeiro – e por isso a cultura armamentista não parece tão exagerada assim.
Como a agente Jane (Olsen) descobre, ali é uma terra sem apoio, onde não se pode piscar. A novata cai num mundo frio tanto física quanto simbolicamente, um lugar que é destituído de sua alma por grandes poderes e corporações, que toma a inocência de lá, algo representado pelo assassinato da jovem Natalie (Asbille) e pela própria perda no passado de Cory. Mesmo em tempos de paz, aquela região parece estar em guerra, levando seus jovens embora, portanto justifica-se a posição de Cory mostrar ao filho desde cedo como se proteger e, consequentemente, os outros que não podem se defender.
A trama poderia até ser um neo-western, como o trabalho anterior de Sheridan, ou um anti-western, onde a figura do índio é elevada em relação a do homem branco. E pode-se argumentar que colocar um homem branco como protagonista numa história dessas seria um desserviço; mas a grande diferença é que Cory, nem mesmo Jane, vem para salvar o dia. Cada um, dentro do seu universo, cumpre a missão de irem atrás de um predador que está ceifando vidas. Os caminhos dos dois às vezes se separam, outros momentos se cruzam, mas Sheridan não julga as decisões desses personagens, pois cada um tem o seu próprio passado para responder.
Longe da terra dos livres e da liberdade, cada um tem que se virar e baixar a guarda significa perder a vida. Isso faz com que a trama seja tensa em praticamente a cada virada, com alguns momentos de respiro que servem para conhecermos melhor os personagens, suas dores e as poucas alegrias. Sheridan, tanto na direção quanto na escrita, conta a trama de maneira fluída e dinâmica. Ele não perde tempo com flashbacks – usando apenas um quando é extremamente necessário – e conta a história da filha de Cory como qualquer um faria. O assunto é apresentado aos poucos e é contado naturalmente e o caçador tira o assunto das costas ao dividir com Jane e com a audiência.
Pelos olhos de Jane que entendemos melhor a situação: somos nós, na plateia, que abaixamos a guarda e somos cegados parcialmente por um erro da inexperiência agente, que logo recebe seu batismo. Esse tipo de dinâmica não é nova – lembra, por exemplo, Mulder e Scully – e tanto ela como que assiste tem que se adaptar a esse mundo novo e gelado onde o mal espreita, mesmo que ainda existem pessoas dispostas a ajudar. São vários enlutados naquele lugar – Cory, a ex-esposa, os pais da jovem assassinada – e tudo que eles podem contar é com eles mesmos, onde a ajuda externa de Jane é apenas a exceção que confirma a regra.
No fim, a produção lida com uma variedade de temas: dor, luto e esquecimento. A frase final do filme sobre a falta de investigação nos desaparecimentos das mulheres indígenas – mesmo que não seja exatamente verdade – é o que mais dói. Em determinado ponto, Cory diz que “a família da minha esposa foi empurrada para cá“, o que representa uma culpa nos ombros da sociedade dos EUA, mas que não é admitida (assim como no Brasil com relação aos nossos nativos, parece que nunca é culpa de ninguém). Cheio de simbolismos – sendo os mais marcantes é a violação de uma pessoa que representa a própria terra e a conversa do epílogo que marca o desaparecimento de uma cultura – Terra Selvagem é um drama dos esquecidos, comuns em tantas outras partes do mundo, onde é preciso fazer muito mais que nós tantos privilegiados temos que fazer.
Elenco
Jeremy Renner
Elizabeth Olsen
Gil Birmingham
Jon Bernthal
Julia Jones
Kelsey Chow
Graham Greene
Direção
Taylor Sheridan
Roteiro
Taylor Sheridan (A Qualquer Custo)
Fotografia
Ben Richardson
Trilha Sonora
Nick Cave
Warren Ellis
Montagem
Gary D. Roach
País
Estados Unidos
França
Reino Unido
Distribuição
The Weinstein Company
Duração
111 minutos
Uma jovem indígena é encontrada morta e com sinais de violência nos regiões montanhosas do Wyoming. A agente do FBI Jane é enviada para investigar o caso e precisa da ajuda de Cory, um experiente caçador que conhece muito bem a região e ambos começam uma caçada ao pior dos predadores.
[críticas, comentários e voadoras no baço]
• email: [email protected]
• twitter: @tigrenocinema
• fan page facebook: http://www.facebook.com/umtigrenocinema
• grupo no facebook: https://www.facebook.com/groups/umtigrenocinema/
• Google Plus: https://www.google.com/+Umtigrenocinemacom
• Instagram: http://instagram/umtigrenocinema
• Assine a nossa newsletter!
Apoie o nosso trabalho!
Compartilhe!
- Clique para compartilhar no Facebook(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Twitter(abre em nova janela)
- Clique para imprimir(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no WhatsApp(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Telegram(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Tumblr(abre em nova janela)
- Mais