Talvez Uma História de Amor | Crítica | Brasil, 2018
Entre clichês e fugindo deles, Talvez Uma História de Amor é um filme com momentos interessantes, mas lhe falta ousadia.
A vida é cheia de talvez e Talvez Uma História de Amor agrade por ser um misto de comédias românticas que já vimos vindo da indústria dos Estados Unidos, com uma tentativa de se diferenciar de um mercado tão saturado. A busca por si mesmo para entender o outro é o destaque da trama, usando de maneira diferente o clichê mais básico do gênero – garoto conhece garota / garoto se apaixona por garota / garoto faz uma grande besteira e perde garota / garoto reconquista garota –, conseguindo assim certo destaque. Com doses de graça que tiram sorrisos, ainda que tímidos, a trama peca pela solução muito extraordinária para resolver a grande questão, mas é um filme bom para ver junto daquela pessoa especial.
Numa introdução que quer ser fofa, mas ao mesmo tempo sem criar polêmica – vemos casais homossexuais, mas sem trocar um selinho que seja – encontramos um esbaforido Virgílio (Solano) correndo para o check-in de um aeroporto, e já podemos pensar que veremos no final outra produção hollywoodiana que o rapaz impede que a ex embarque, só por dizer que errou. Felizmente, por um recurso que só a montagem do cinema (e da TV também, convenhamos) pode nos trazer, isso é felizmente subvertido. A correria serve para se opor ao personagem da semana anterior: metódico, a organização em pessoa, mas que vive parado no tempo com sua TV de tubo, telefone de teclas, celular GSM e geladeira da sua.
Podendo ser confundido com um hipster (mas não é) que trabalharia com uma máquina de escrever se pudesse – apesar do objeto também fazer parte da mobília – tem um choque de realidades ao receber a mensagem de Clara (Ayala) na secretária eletrônica, outra relíquia. A questão é que, assumindo um tom de fantasia, Virgílio diz não conhecer a personagem que terminou relações com ele. Mas, para ser direto, a história introduz a ex-namorada na interação de outros personagens para mostrar que o protagonista não está louco. O que se segue é uma história de investigação e autoconhecimento, pois alguém tão sistemático quanto ele não fica tranquilo com um pedaço faltando.
Há um exagero na trama que prejudica acreditarmos em Virgílio, e isso não tem nada a ver com esse ser um filme de comédia – e esperamos alguns excessos são esperados, como a cena na sala de espera dos exames do personagem – mas sim as palavras que saem da boca dele. É tudo muito meticuloso, mesmo para um personagem que vive pela organização. Por exemplo, ele diz para a terapeuta sobre a desconhecida ex-namorada “eu mal a conheço”. Isso pode passar despercebido para uma audiência estrangeira – uma vontade da produção ao finalizar a história em Nova York – mas para o público nacional dá um ar de artificialidade. É como chamar São Paulo de Sampa: e posso afirmar com alguém que nasceu e cresceu aqui, poucos conterrâneos chamam a cidade assim.
Se falta naturalidade em como o personagem se expressa, essa particularidade é compensada pela espontaneidade da vizinha Katy (Comparato), quase um guia espiritual involuntário de Virgílio, abrindo os olhos do personagem para coisas óbvias e dando um toque feminino (algo que faltou no roteiro que não tem a colaboração de nenhuma mulher) e jogando luz em alguns assuntos – o que brinca com literal, pois numa cena que Virgílio veste um capacete de explorador, emprestado por Katy, é onde ele começa a procurar por esse pedaço que falta na escuridão aquele pedaço da mente – e seria uma cena muito mais marcante se fosse menos didática.
O que acontece é que o diretor passeia entre explicar demais e ser mais simbólico na trama, o que mostra um Bernardo ainda verde como diretor, mas com ótimos lampejos na cadeira. Ao mesmo tempo que mostra que Virgílio sofrendo por causa de suas escolhas, com isso se refletindo inclusive em casa – a falta de luz, água, gás e quase ser despejado – ou a maneira que trata a transição do sonho para a realidade, onde o personagem encontra uma grande pista, a história é destrinchada demais pela Dra. Marcia (Meireles), uma personagem que entra em conflito, não físico, com Katy. Basicamente, não há necessidade dessas duas personagens normais, digamos assim, para guiar o espectador.
Bernardo não nega as influências do cinema romântico estadunidense, principalmente quando Virgílio assiste, numa tv de tubo, Sintonia de Amor (Sleepless in Seattle, 1993, Nora Ephron) e mostra todos os obstáculos para que a jornada do personagem se complete. Por isso, é muito fácil a saída para que Virgílio para encontrar Clara numa das maiores cidades do mundo. Podemos acreditar que por causa de sua disciplina, o publicitário tenha conseguido juntar uma quantidade enorme de dinheiro – mas ao ponto de como ela acontece na história, é onde passamos para o grande clichê que o amor pode tudo, inclusive comprar publicidade.
Talvez Uma História de Amor é uma montanha russa de sensações, assim como o amor, mas isso não é, necessariamente, um elogio. Enquanto esquiva de lugares-comuns de outras produções, é difícil acreditar nas partes que a história mais viaja (você realmente acredita que uma companhia aérea entregaria o nome de um cliente daquela maneira?). As soluções são inversamente proporcionais às dificuldades de Virgílio relembrar as memórias de Clara, passando uma mensagem que você só supera as dificuldades se tiver como arcar financeiramente com elas. Não é uma questão de ousar – provavelmente, quem buscar esse tipo de filme não busca isso – mas de fugir de outro grande clichê, o do que só uma certa parcela privilegiada consegue fazer o que quer.
Elenco
Mateus Solano
Bianca Comparato
Totia Meireles
Thaila Ayala
Paulo Vilhena
Nathalia Dill
Jacqueline Sato
Marco Luque
Cynthia Nixon
Dani Calabresa
Direção
Rodrigo Bernardo
Roteiro
Rodrigo Bernardo
Ben Frahm
Brandon Neslund
Baseado em
Talvez Uma História de Amor (Martin Page)
Fotografia
Hélcio Alemão Nagamine
Trilha Sonora
Armand Amar
Montagem
Marcio Hashimoto
País
Brasil
Distribuição
Warner Bros. Pcitures
Duração
101 minutos
Virgílio é uma pessoa organizada e muito metódica. Um dia, ele recebe uma mensagem de Clara, terminando o namoro com ele. Só há um problema: Virgílio não sabe quem Clara é. Agora ele deve embarcar numa jornada de auto-conhecimento para lembrar quem é essa pessoa, possivelmente o amor da sua vida.
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