Sobrenatural: A Última Chave | Crítica | Insidious: The Last Key, 2018
Sobrenatural: A Última Chave peca no quesito direção, mas tem uma história interessante – e merecia ter uma mulher dirigindo.
Há um medo comum que a longevidade de uma franquia seja inversa à qualidade de seus filmes. E Sobrenatural: A Última Chave é um exemplo desse receio, o que não quer dizer que seja uma experiência ruim. Se fossemos colocar na ordem, a nova instalação da saga – quarta no cinema e segunda cronologicamente – ocupo o último lugar principalmente por causa dos clichês de jump scares e do “agora é pessoal”. Porém, se levarmos em conta o cenário atual (não só) no cinema com iniciativas como Time’s Up, o filme ganha outro viés. Um que poderia ser melhor abordado se uma mulher dirigisse.
Depois das experiências em A Origem, mas antes da primeira e segundas partes, Elise (Shaye) é elevada ao posto de protagonista e assim conhecemos melhor sua história. Crescendo num lugar repleto de morte, nos arredores de uma penitenciária com um corredor da morte, a jovem médium viveu com uma penitência própria. E assim como muitos heróis e heroínas, cai sobre ela o fato de não ser compreendida e de ser órfã. Para ela, é uma guerra espiritual, enquanto do lado de fora é a ascensão de Stalin e o medo do comunismo que preocupam a mente das pessoas.
Já como a senhorinha simpática que conhecemos nos outros filmes, Elise precisa, como qualquer um de nós, lidar com seu passado. Mas seu receio tem um endereço. Já várias vezes mencionei a diferença entre um lar e uma casa e como isso é assustador: aquilo que deveria ser comum e trazer conforto pela familiaridade é um lugar com pouca luz e pouco convidativo, uma coisa que afeta também Ted (Acevedo), o novo dono da casa. Ele procura salvar o lugar porque quer que ali se torne um lar e Elise precisa fazer isso como um fechamento, uma culpa carregada por décadas.
Como nas outras ocasiões, Whanell permite momentos de doçura e graça na interação de Elise com seus escudeiros Tucker (Sampson) e Specks (Whanell), dois personagens que se atraem à personalidade magnética da médium e com suas próprias excentricidades, naturais o suficiente para acreditarmos nelas. Já que, em geral, a tensão é criada de maneira competente por Robitel, é a presença da dupla que nos faz relaxar. E, como costumar ser em outros momentos, é neles que a plateia se apega por não terem nenhum tipo de mediunidade, sendo assim os nossos condutores. De certa maneira, a personalidade um tanto exagerada dois é um espectro oposto da de Elise: enquanto ela navega em águas sombrias, são eles que nos tiram de lá.
Porém, não é possível relevar os defeitos, coisas que não estavam tão presentes nas obras anteriores. Os sustos dos outros três capítulos da saga eram mais sutis e não apelavam tanto para jogar as coisas na nossa cara. Comparem qualquer susto desse filme com o do Homem Que Não Respira, personagem do terceiro filme, na cena vai apagando cada uma das luzes do quarto da jovem atormentada, por exemplo. Apesar de termos momentos de tensão por antecipação, e a cena de Elise com as maletas é o melhor exemplo disso, a falta de experiência de Robitel no papel de diretor é claramente o ponto fraco do filme.
O que ajuda e muito é o roteiro do já experiente Whanell. Por mais que os elementos dos humanos serem grandes monstros não ser original – há inclusive um episódio de Sobrenatural, a série, que me lembrou uma das reviravoltas – é preciso levar em conta o conceito por trás do demônio chamado de Keyface (Botet). Primeiro, a fonte de sua energia. As execuções ao redor da antiga casa de Elise mostram a manifestação de seu poder, interferindo na energia elétrica e dando choques quanto encosta em metais. Depois, de novo de um tema emprestado de outras criações, o alimentar do medo e ódio, algo que Elise conhece bem.
Mas a coisa mais marcante no demônio é seu alvo. Não se sabe há exatamente quanto tempo, mas Keyface é um predador e seu alvo são as mulheres. Vejam como é poderoso esse símbolo e como ele conversa com a nossa sociedade. Essa entidade, chamada sempre pelo gênero masculino, é dotado de várias chaves no lugar de seus dedos, um objeto que ele usa para silenciar suas vítimas, passando um recado interessante nessa história. Atacando apenas mulheres, o demônio usa de sua força para não permitir que suas vítimas gritem ou esbocem alguma reação. Numa época que estamos falando tanto sobre a diferença entre cantadas e assédio, é justo que o cinema fale dessas coisas por meio de metáforas.
Então, sim. Sobrenatural: A Última Chave é um filme sobre abuso tanto físico quanto espiritual, como a história de alguém pode ser mudada quando alguém lhe toma o poder – nesse caso, representado pela voz das personagens – e porque é tão difícil encarar o passado. Nesses casos recentes envolvendo grandes atores, produtores e diretores de Hollywood, há sempre alguém que se levanta e pergunta porque elas não fizeram as denúncias na época. E nesse filme de terror está uma resposta. O medo. Algo tão paralisante que te impede de ir contra uma força que você sabe que é maior que a sua – e não à toa as mulheres desse filme se unem contra o mal em comum para achar a saída. Apenas gostaria de ver a história contada e dirigido por uma mulher, mas é, pelo menos, um posicionamento.
Elenco
Lin Shaye
Angus Sampson
Leigh Whannell
Spencer Locke
Caitlin Gerard
Bruce Davison
Direção
Adam Robitel
Roteiro
Leigh Whannell
Fotografia
Toby Oliver
Trilha Sonora
Joseph Bishara
Montagem
Timothy Alverson
País
Estados Unidos
Distribuição
Universal Pictures
Duração
103 minutos
Depois dos eventos da Origem, é hora de Elise enfrentar o próprio passado enquanto nós mesmo descobrimos detalhes da vida da personagem e da sua ligação com o outro mundo.
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