Rocketman | Crítica | Rocketman, 2019
A coisa que menos importa em Rocketman é se as coisas aconteceram do jeito que vemos, o que realmente importa é aproveitar a viagem.
Quando ouvimos as músicas de quem gostamos é muito fácil abstrair a mensagem, principalmente depois que você se torna adulto. As responsabilidades do dia a dia te impedem muitas vezes de apreciar um álbum em sua plenitude. Rocketman faz um favor aos fãs de Elton John de mostrar o processo criativo de músicas que embalaram muitas pessoas. Assim com a vida de tantos, a história desse famoso musicista é cheia de dores e alegrias, talvez um mais do que a outra. Essa viagem às memórias tem sim uma abordagem que deve ser vista com um tanto de ceticismo, mas isso não impede você de se envolver e cantar junto com a personagem e, provavelmente, com a plateia da sala.
É importante notar como o diretor dá importância ao visual na sua história de um personagem que se expressa tão forte nesse quesito. Logo na primeira cena, Elton John (Everton) já toma toda a tela, deslumbrante. Porém, Flechter fez questão de lembrar de sua humanidade. Começando do meio da história, cronologicamente faltando, conhecemos um Elton que precisa desesperadamente de ajuda. Numa reunião dos alcoólicos anônimos, ele chega como o artista espalhafatoso que conhecemos, mas percebemos que aos poucos ele vai se despindo dessa persona, tirando um chifre, depois a touca até ficar figurativamente nu, apesar da roupa física.
Além do figurino, tanto a direção de arte e a fotografia seguem esse caminho. Começamos de maneira sutil na primeira viagem de Elton para seu antigo Redgie. Mesmo ali, Fletcher já dá ao jovem algo de especial ao deixá-lo com mais cor do que seus pálidos figurantes. Acontece algo parecido na casa do rapaz, um lugar que encontramos pouco carinho além do que é dado pela avó. Rejeitado pelo pai e criticado pela mãe, o agora Elton transporta para o então Redgie seus sentimentos em música. E o trabalho do montador Chris Dickens não pode ser suficientemente elogiado.
Sabendo como nos capturar e sem deixar que os momentos que poderiam ser mais redondos por serem apresentados cronologicamente, Fletcher e Dickens trabalham misturando sonho e realidade. É verdade que musicais, em geral, já fazem isso. Mas há algo a mais no trabalho dos dois. Elton não simplesmente para a narrativa para cantar sentimentos, mas para mostrar como a música está mudando sua vida. E o diretor não tem medo em mostrar essa interação entre devaneios e mundo real, exagerando sabendo que para Elton e Bernie (Bell) aqueles momentos eram mágicos. É verdade que Flechter deixa esses momentos especiais para Elton, como na cena do show do Troubaudor, onde só ele percebeu que seu pulo no piano virou um voo.
E essa é uma história sobre amor. Ou melhor, da falta dele. Apesar de tentar letras sobre esse sentimento, Elton é retratado como alguém solitário. Desde a infância ele tenta conexão com os pais e podemos resumir isso na cena onde o protagonista, ainda criança, canta no mundo dos sentimentos, a tentativa de conexão com Sheila (Howard) e Stanley (Makintosh), onde planos longos, os espaços vazios entre esse trio sem palavras, são preenchidos pelo desejo de Elton enquanto canta I Want Love. E que tristeza pensar que senão houvesse essa melancolia toda, talvez não tivéssemos o Elton que estourou nos anos 1970.
Apesar de Fletcher ainda ter seu protagonista vivo, ele não limpa a barra do cantor. Os problemas com álcool e drogas são abordados, mas com uma base e não como se o diretor estivesse julgando seu personagem. E ainda fazendo essa opção de mágica com o mundo real, esse assunto do começo do abuso de Elton com entorpecentes é mostrado numa viagem visual, onde as coisas começam acontecer tão rápido na vida dele que merecem um tratamento especial por Fletcher. E mais uma vez a montagem é essencial para o filme se diferenciar narrativamente. A cena em que sua escalada ao sucesso ao lado de Richard (Reid) é tão teatral que ganha um tratamento como se fosse montado nesse estilo, mas sem deixar de lado a importante técnica do cinema que é a montagem.
Sendo um filme onde a música é primordial, havia o perigo de Flecther não dar descanso nesse quesito. Felizmente, o diretor sabe que o silêncio precisa ser apreciado. Com exceção de alguns momentos onde Elton tem que se disfarçar com um sorriso e ouvimos uma versão instrumental de Goodbye Yellow Brick Road ao piano, os momentos musicais são deixados para apreciação nos momentos em que o personagem quer se comunicar com a plateia, e por isso tantas vezes Fletcher faz seu protagonista encarar a câmera e, por consequência, fitar a nós na plateia, nos convidando para aquele momentos, mas não como se fosse um vídeo clipe, apesar de a estética lembrar um pouco isso.
Isso significa que Fletcher tenta e consegue fazer a todo momento que essa produção seja uma conversa de Elton com o público, mesmo que esse seja um Elton um tanto fora da realidade. Até nos momentos onde o personagem começa a não saber o que é realidade do que é sonho isso acontece. É aqui que o diretor começa a usar efeitos especiais. A trama então ganha tons de estar deslocada da realidade como o próprio Elton está, e assim, por causa dessa diferença de narrativa, somos tragados para essa mudança de percepção precisamente por ela ser tão diferente de tudo que vimos até agora.
Mas, no geral, Fletcher é contido nos momentos fora da realidade, já que os momentos musicais já são suficientes para dar o efeito de estamos num mundo separado. Por exemplo, no começo vemos o jovem Redgie intimidado pelo tamanho da Escola Real de Música, o que é uma sensação física, uma que poderíamos sentir também. E efeitos tradicionais do cinema como o slow motion são usados apenas duas vezes: a primeira quando Elton recebe a primeira chance de mostrar seu trabalho quando pega as letras de Bernie e quando está para entrar no palco do Troubaudor. Isso tudo para mostrar as mudanças dele, mas sem deixar de lado esse lado humano que Fletcher tanto reforça.
E não há apenas tragédia em Rocketman. Há espaço também para uma doçura, uma percepção que nem tudo são trevas e que pedir ajuda não é nenhum demérito. Apesar de que a relação entre Elton e a mãe ficar muito em aberto e o próprio final ser um tanto abrupto, isso não é suficiente para estragar a experiência. Essas é uma daquelas produções que merecem ser enchidas de adjetivos elogiosos, mas que merecem bem mais que isso. Parafraseando uma das letras mais famosas de Elton e Bernie, sei que essa crítica não é muito, mas é o melhor que posso fazer.
Elenco
Taron Egerton
Jamie Bell
Richard Madden
Bryce Dallas Howard
Direção
Dexter Fletcher (Voando Alto)
Roteiro
Lee Hall
Fotografia
George Richmond
Trilha Sonora
Matthew Margeson
Montagem
Chris Dickens
País
Estados Unidos
Distribuição
Paramount Pictures
Duração
121 minutos
Data de estreia
30/mai/2019
Antes de Elton John ser Elton John, ele era um rapaz tímido. Agora, é hora de conhecer como ele se tornou um dos cantores mais populares do mundo.
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