Planeta dos Macacos: O Confronto | Crítica | Dawn of the Planet of the Apes, 2014, EUA
Planeta dos Macacos: O Confronto tem todos os elementos para destaca-lo no mar de remakes, reboots e continuações. Empolgante, dramático e tecnicamente impecável.
Com Andy Serkis, Jason Clarke, Gary Oldman, Keri Russell, Toby Kebbell, Karin Konoval, Doc Shaw, Kirk Acevedo e Kodi Smit-McPhee. Roteirizado por Mark Bomback, Rick Jaffa e Amanda Silver, baseado na obra de Pierre Boulle. Dirigido por Matt Reeves (Cloverfield).
Em um mundo cercado por continuações, remakes e reboots é um alívio constar que ainda há aqueles que se preocupam com um bom resultado ao invés de pensar apenas no retorno financeiro. Oitava ampliação nos cinemas do livro de Pierre Boulle, Planeta dos Macacos: O Confronto tem todos os elementos para destaca-lo no mar do começo do parágrafo. É empolgante, dramático e tecnicamente impecável. Fazendo uma brincadeira com um filme de super-herói lançado nos anos 1970, você vai acreditar que um macaco pode falar.
Dez anos após o vírus ALZ-113 ter acabado com quase toda a população humana, César (Serkis) e sua comunidade de símios prospera. Além de líder, ele é um pai que quer cuidar não apenas de seus filhos, mas de toda a comunidade. Depois de uma década sem ter contato com humanos, César e os seus encontram Malcom (Clarke) e outros poucos humanos que sobreviveram à praga. Ele busca um entendimento com o chefe dos símios para que possam religar uma usina de força e tentar reconstruir a sociedade humana. Essa aliança é vista com maus olhos tanto pelo símio Koba (Kebbell) quanto pelo humano Dreyfus (Oldman), o que levará ao inevitável confronto.
Reeves e o trio de roteirista mostram-se bem ousados logo no começo do filme. Depois de uma curta introdução com relatos estilo mockumentary de como a epidemia se espalhou pelo globo – nos moldes da animação do final do filme de 2011 – onde vemos os pontos vermelhos se apagando, o filme tem cerca de quinze minutos sem nenhum tipo de diálogo falado. Ouvimos apenas a trilha de Michael Giacchino, os sons típicos dos símios e legendas para entendermos a linguagem de sinais deles. O compositor pegou esse momento e fez uma referência na trilha sonora muito parecida (se não for a mesma) do início de György Ligeti em 2001 – Uma Odisseia no Espaço (2001 – A Space Odyssey, 1964, Dir Stanley Kubrick). Aliás, Giacchino está inspiradíssimo nessa trilha sonora, com momentos épicos, outros reverenciando o trabalho do original de 1968, e fúnebres. Podemos notar nessa mesma cena inicial que a cada luz apagada, os toques de piano vão se espaçando, representando o fim da humanidade (para entender, ouçam Level Plaguing Field e Look Who’s Stalking).
Impossível não relacionar a figura de César à de Martin Luther King – integrador – e a de Koba à de Malcom X – pregando a violência como autodefesa. Isso fica bem claro quando o símio mostra ao seu líder as cicatrizes e o olho perfurado, tudo obra de humanos que o usaram por muito tempo como experimento científico. Apesar das leis criadas – símio não matará símio – essa sociedade cresceu em dez anos com respeito, mas também com diferenças. Fazendo um paralelo com a humanidade, nem todos conseguem apagar certas marcas.
O desentendimento começa como tantas outras coisas: o medo. Em pânico, Carver (Acevedo) atira em Ash (Shaw) que estava tão assustado quanto ele, pois o jovem macaco, provavelmente, nunca havia visto um ser humano. César então tem que intervir, o que cria uma das cenas mais tensas do cinema atual. Incrédulos, os humanos assistem a milhares de símios chegando aos portões da cidade improvisada montando cavalos. E quando César fala pode-se imaginar a surpresa de todos. E há dois símbolos interessantes que levam à reflexão dos povos. Malcom é o único dos humanos estupefatos a usar uma camisa branca – um símbolo involuntário de paz – e se oferece a conversar com César. O chimpanzé falante por sua vez devolve uma mochila que o filho de Malcom deixou cair na floreta. Há um entendimento que os dois povos podem trabalhar junto, mas a semente da discórdia já havia sido plantada.
Para poder diferenciar seus personagens principais e sem poder usar roupas para tal, Reeves inteligentemente usa como figurino posturas – César é o mais ereto de todos – e marcas – as já citadas de Kobo e de Olhos Azuis (Thurston). No caso de raças diferentes, como Maurice (Konoval) – um orangotango – a pelagem e o porte diferente dos macacos se fazem suficiente. Vemos na sociedade alguma divisão bem sutil entre fêmeas – algumas usam adereços – e nos outros símios que vão caçar pintados, como índios fazem em período de guerra.
Guerra que é personificada em Kobo, um personagem que não poderia viver mais em nenhuma sociedade. Sua fúria investe até mesmo contra os de sua raça, e ele está mais cego do que seu olho esquerdo. O confronto inevitável é representado por cenas de ação fantásticas, realísticas e pesadas. Em primeiro lugar quando vemos antes do combate humanos celebrando a volta da energia, enquanto Reeves foca sua câmera em várias crianças. Como sempre, são os menores que sofrem pelos nossos erros. A batalha entre os símios liderados por Kobo e contra os humanos é digna de entrar em qualquer compêndio de cenas bélicas, em especial o plano-sequência que mostra todo o inferno que está acontecendo no momento em que o chimpanzé consegue entrar em um tanque de guerra desgovernado. Reeves não o faz pilotar a máquina, mas enquanto ela sai sem rumo, a câmera faz um movimento rotário para mostrar detalhes da ação, algo que não é comum em filmes de ação.
Em contrapartida, ele usa o mesmo elemento – o plano-sequência – para aumentar a tensão quando Malcom está na cidade para buscar suprimentos para curar um ferido César.
Esse é um daqueles filmes agradáveis do o começo ao fim. Ele investe na própria mitologia, apresentando um lampejo de doçura no flashback não usual quando César se encontra em sua antiga casa uma filmagem antiga dele ainda filhote com Will (Franco) – o que dá mais sentido a narrativa do retorno da energia elétrica – e em rimas visuais, como o destino de Koba ser o mesmo que ele causou a um personagem no filme anterior, o que mostra que nem tudo é preto no branco. Um aprendizado que não vem sem sacrifício.
O 3D funciona na maior parte do tempo, principalmente na cena inicial, investindo na profundidade. De vez em quando Reeves escorrega ao usar o rack focus – que desfoca para causar uma profundidade que o efeito já deveria dar – e pode ficar confuso na luta final que acontece à noite.
E Planeta dos Macacos: O Confronto faz jus ao verdadeiro protagonista dessa nova saga. O filme abre e fecha com o rosto de César e, mais importante, o nome de Andy Serkis encabeça os créditos, merecidamente. E o ponto que a história nos deixa tanto espaço para um novo filme ou, se assim acharem melhor, para que a nossa imaginação preencha as lacunas até a versão de 1968. Seja lá o que for, é uma solução bem-vinda. Assim como Malcom faz nos momentos finais, a humanidade se recolhe à sombra para a aurora dos símios.
Veja abaixo o trailer de Planeta dos Macacos: O Confronto
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