O Último Cine Drive-In | Crítica | Brasil, 2015

0 Flares Twitter 0 Facebook 0 Filament.io 0 Flares ×

O Último Cine Drive-In é uma homenagem ao cinema, uma história de família e uma crítica social e um dos melhores filmes de 2015.

O Último Cine Drive-In, 2015

Com Breno Nina, Othon Bastos, Rita Assemany, Chico Sant’anna, Fernanda Rocha, André Deca, Rosanna Viegas, Vinícius Ferreira. Roteirizado por Iberê Carvalho e Zepedro Gollo. Dirigido por Iberê Carvalho.

10/10 - "tem um Tigre no cinema"Cada vez mais o cinema dramático nacional tem trazido bons exemplos para nós. Esqueçam as comédias simples, iguais e pasteurizadas: O Último Cine Drive-In é uma lição sobre e o que é o cinema. E não é apenas isso. Apesar da homenagem à sétima arte ser bem clara, e a primeira camada da história, Iberê Carvalho escancara um retrato social na sede do poder legislativo, e ainda acha espaço para contar uma história de pais e filhos durante a jornada de seus personagens. Fugindo de clichês e trabalhando com pitadas de aventura e comédia, essa é uma produção digna de ser lembrada por qualquer espectador, mas em especial pelos brasileiros.

Interessante que, apesar do título, Carvalho prefira iniciar a história de Marlonbrando (Nina) e de sua mãe num hospital da rede pública. Aos gritos de raiva e indignação ele tenta entrar no hospital onde está Fátima (Assemany), que está lá “há uma semana” esperando um exame neurológico que nunca vem. Os seguranças do hospital e policiais militares que não permitem que ele adentre o corredor onde a mãe está com outras dezenas de pacientes – notem que eles aparecem quase o tempo todo de costas, como se o diretor dissesse que aquela briga é contra um sistema falho, e não pessoas – e a enorme caminhada que Marlon faz do hospital até o cinema do pai Almeida (Bastos) terminam de pintar o retrato da periferia que o jovem faz parte, já que ele tem que andar muito com uma perna imobilizada provavelmente por não ter um centavo no bolso.

Caçar as referências de filmes dentro do filme é uma tarefa prazerosa, quase como se o diretor fizesse um pequeno jogo com o espectador. Além da óbvia inspiração do nome do protagonista – podemos inclusive ver o pôster de Uma Rua Chamada Pecado (Dir Elia Kazan, 1951) – o diretor faz algumas rimas visuais misturando momentos do seu filme com o dos outros. É engraçado quando Almeida vai tentar acordar o filho e ele finge que está roncando para não conversar com o pai, e na cena seguinte o diretor coloca o rapaz ao lado de um pôster de Curtindo a Vida Adoidado (Dir John Hughes, 1986), ou ainda quando percebemos que o pôster que está na sala da gerência é o de O Poderoso Chefão (Dir Francis Ford Copolla, 1972). Há outros signos divertidos como quando Almeida, ao visitar um amigo que é dono de uma grande rede de cinemas, joga um óculos 3D em cima de uma balde enorme de pipoca, ou quando vemos que um dos filmes exibidos no drive-in é Central do Brasil (Walter Salles, 1998), que fala da busca de um filho por seu pai. E, de certa maneira, os coadjuvantes da história dessa família também são importantes, por isso Paula (Rocha) e Zé (Sant’anna) completamente o cenário com suas próprias peculiaridades.

Notem também como Carvalho isola pai e filho ainda que estejam no mesmo ambiente. O diretor toma de vários artifícios para criar essa separação entre os dois, e constantemente algo os aparta: pode ser uma cadeira vazia, uma mesa, ou o figurino – que é o elemento favorito do diretor –, onde Marlonbrando muitas vezes usa cores escuras, enquanto Almeida usa tons mais claros. Falando em figurino, é muito singelo o modo que o diretor mostra por meio dele a situação que Fátima passa. Na sessão de quimioterapia, Carvalho move a câmera da esquerda para direita e vemos uma mulher vestindo uma blusa branca com listras pretas para, em seguida, mostrar Fátima com um padrão parecido, mas as listras estão apagadas e cinzas.

E, como um bom cineasta deve fazer, Carvalho conta muito da sua história por meios visuais, como deve ser o cinema. No olhar de Marlonbrando, vemos a decadência do lado de fora e de dentro da vida de Almeida: e não é exagero nenhum dizer que o drive-in representa essa vida. Então, o diretor mostra a decadência do lugar com casais usando as dependências de motel, pneus jogados em qualquer lugar e a falta da pintura apropriada da tela de projeção. Do lado de dentro, a casa é forrada por garrafas e mais garrafas de cachaça. E uma coisa linda demais que são os flashbacks, onde ao invés de ser algo que os personagens puxam da memória, as lembranças vêm por meio de filmes 8mm do acervo da família, um efeito extremamente marcante.

Pelo fato de se passar em Brasília, me permito uma visão pessoal que é comparar a relação de Almeida e Marlonbrando com uma música da também brasiliense Legião Urbana. É difícil afirmar que isso seja verdade, mas quando vemos o silêncio constrangedor na cena do jantar, e ao entendermos que o pai não conhece o filho, mas a recíproca é verdadeira, fica fácil de lembrar os versos Renato Russo em Pais e Filhos: “você me diz que seus pais não te entendem, mas você não entende seus pais”.

O Último Cine Drive-In | Pôster brasileiro

Lidando com questões muito humanas, O Último Cine Crive-In é uma comédia, um drama e uma aventura e isso é bem representado pela excelente sequência final. Em poucos minutos, Carvalho nos faz rir, nos deixa tensos e nos faz refletir. A cena do elevador é construída de maneira a passar muito mais tempo do que ela realmente dura. A do quarto da mãe é uma sequência de comédia necessária – porque a vida não é só drama – e cena seguinte que se passa no corredor é angustiante, tanto pelo tempo quanto pelo cunho social. E no fim, uma união acontece do mesmo jeito que o diretor fez tão bem antes: apenas visualmente, sem precisar explicitar com palavras um sentimento. Um filme belo, tocante e que deve ser assistido, espalhado e recomendado nesse mundo invadido cada vez mais por blockbusters.

Sinopse oficial

Ao retornar a sua cidade natal com sua mãe adoecida, Marlon reencontra seu pai e o cinema Drive-in onde passou sua infância. Almeida mantém o cinema funcionando com apenas dois funcionários: Paula cuida da projeção e da lanchonete; e José, um velho amigo de Almeida, que atende a bilheteria e faz limpeza do local. A chegada de Marlon e a ameaça de demolição do Drive-in trará um novo rumo para suas vidas”.

Veja o trailer de O Último Cine Crive-In

[críticas, comentários e voadoras no baço]
• email: [email protected]
• twitter: @tigrenocinema
• fan page facebook: http://www.facebook.com/umtigrenocinema
• grupo no facebook: https://www.facebook.com/groups/umtigrenocinema/
• Google Plus: https://www.google.com/+Umtigrenocinemacom
• Instagram: http://instagram/umtigrenocinema

http://www.patreon.com/tigrenocinema

 

Volte para a HOME

 

Share this Post

About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".