O Acampamento | Crítica | Killing Ground, 2017, Austrália
O Acampamento é um thriller tenso que homenageia um estilo, mas que consegue encontrar a sua própria dose de originalidade.
Elenco: Aaron Pedersen, Ian Meadows, Harriet Dyer, Aaron Glenane | Roteiro e Direção: Damien Power | Duração: 88 min
O Acampamento não tem a intenção de ser original ou inovador, mas sim uma homenagem a outros filmes onde pessoas que só querem paz e tranquilidade se encontram com gente perturbada. Mesmo tendo isso em mente, a produção australiana consegue, dentro desse universo estabelecido, trazer tensão e drama com cenários terríveis do tipo que deixam o espectador grudado na cadeira, num misto de querer e não querer tirar os olhos da tela. E mesmo usando elementos clássicos dos filmes do gênero, como a força da personagem feminina, Power, em contrapartida, introduz algumas subversões que dão um frescor à história. Em suma, o diretor/roteirista mostra que uma boa produção pode ser feita com pouco dinheiro e ainda nos manter interessados.
Existem dois elementos que produzem dão o tom cru e realista para o filme: a primeira é a fotografia de Simon Chapman, a outra são os sons em contraste com o pouco uso da trilha sonora. As piores partes da história se passam praticamente à luz do dia, e com isso Power e Chapman trazem uma naturalidade assustadora à trama, pois se algo tão terrível pode acontecer à luz do dia, nada nem ninguém está a salvo. E os grandes momentos de silêncios, quebrados pelos gritos, choros e tiros se sobrepõe à trilha sonora dos momentos doces entre Ian (Meadows) e Samantha (Dyer) acompanhadas por suaves violinos – que, já no desespero, se tornam tambores no terceiro ato.
E apesar de German (Pedersen) e Chook (Glenane) serem os clássicos monstros humanos, algo bem comum no gênero, Power faz com que esses personagens tenham seu toque de humanidade. Mesmo que German encarne o tipo estranho que você nunca deve confiar, ele aparece numa relação fraterna com Chook e é carinhoso com seu pitbull. Mas são só aparências. Falando de novo da fotografia, é num banheiro com um tom verde-amarelado, evocando algo de podridão, é que os amigos mostram suas verdadeiras cores, ainda sem expressar verbalmente, mas já o suficiente para esquecermos os traços da suposta humanidade.
Divido em duas linhas de tempo e núcleos e ao apresentar uma tenda vazia ao lado de onde Sam e Ian acampam, Power nos provoca com flashs da família que estava lá antes e o que teria acontecido naqueles dois dias que separam as histórias. E a maior qualidade do roteiro é quando o diretor nos torna partícipes quando vemos um pequeno e indefeso ser andando atrás de Sam que não o vê à princípio. É nesse momento em que nos desesperamos e a vontade é de levantar da cadeira, o único aliás, para gritar para a personagem virar e ver o que está acontecendo.
A narrativa do filme é curta e direta, o que dá pouco espaço para nos distrairmos. Porém o diretor sabe como usar o tempo para também nos colocar em agonia. Vejam o momento que podemos definir como uma perversão ao conto de Guilherme Tell: com poucos cortes e cenas longas, o que mais queremos é que Power tenha misericórdia de nós assim como temos dos personagens. No entanto, o sofrimento continua e continua ao ponto de, mais uma vez, querermos gritar à tela. E mesmo que o diretor nos esconda certos momentos mais perversos, o resultado está na nossa frente, mostrando que nem sempre é preciso colocar em imagens ou verbalizar para ser chocante.
À medida que as histórias se encontram, Power continua na sua missão de nos deixar numa posição incômoda ao aumentar o número de cortes do filme. Misturado ao isolamento, a tensão dessa caçada humana é tão bem estruturada que mesmo sabendo o que provavelmente aconteceu com a família da primeira cabana, o roteiro não se torna menos perturbador. Até mesmo momentos isolados – uma curta aula sobre anatomia humana, o jeito de atrair uma presa – são justificados e amarrados, mostrando que houve um cuidado em contar uma boa história. Apesar da violência poder afastar o grande público, ela funciona dentro desse universo perverso que não é feito de monstros, mas que pode se esconder com qualquer faceta.
É interessante que Power consegue ao mesmo tempo em que faz homenagens a filmes como Amargo Pesadelo (Deliverance, 1972, John Boorman) – principalmente se pensarmos nas palavras-cruzadas que Sam tenta completar na cena de abertura – O Acampamento tem também sua própria identidade quando nos deparamos com um personagem que não é nada heroico, cheio de falhas, crível e que toma uma atitude sensata no meio de tanta loucura. O que acontece é que há consequências para essas decisões, algo que é como a palavra que o casal não descobre na cena inicial já citada. E a crueza e falta de respostas de porque o nosso mundo pode ser tão doentio é que a produção australiana fica tanto tempo batendo na nossa cabeça, procurando sentido num lugar onde não existe.
O Acampamento | Trailer
O Acampamento | Pôster
O Acampamento | Galeria
O Acampamento | Sinopse
Querendo escapar da cidade grande e comemorar tranquilamente o réveillon, Ian e Samantha acampam num parque natural australiano. Eles desconfiam que a cabana vizinha não tenha movimentação, e quando encontram uma criança vagando sozinha por entre a mata é tarde demais para perceberem que algo está terrivelmente errado.
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