Fragmentado | Crítica | Split, 2017, EUA
Fragmentado mistura gêneros assim como seu protagonista mistura personagens, isso sem perder em nenhum momento a tensão, além do ser a ressurreição de M. Night Shyamalan.
Elenco: James McAvoy, Anya Taylor-Joy, Betty Buckley, Haley Lu Richardson, Jessica Sula | Roteiro e Direção: M. Night Shyamalan (A Visita) | Duração: 117 minutos | Cena Extra
Quando um filme é tão tenso que você não consegue tirar os olhos da tela é ao mesmo tempo tão cheio de camadas, você deve parar para analisar além da superfície. Fragmentado não é só o retorno de M. Night Shyamalan ao posto de bom diretor; é também uma experiência que precisa ser compartilhada. Com poucos momentos para nos escondermos, e o diretor nos permite isso apenas nos flashbacks de uma personagem, a produção não se perde ao misturar gêneros – melhor seria dizer que eles emergem, assim como as múltiplas personalidades do protagonista. Mais uma vez sabendo como carregar a narrativa, o diretor nos leva para caminhos sombrios e desesperadores e consegue que sejamos partícipes de cada momento de horror e do desconhecido.
Estar na mente do trio dominante da mente Kevin (McAvoy) é como estar em terreno desconhecido, uma metáfora que é vivenciada na carne por Casey (Taylor-Joy), Claire (Richardson) e Marcia (Sula) quando capturadas por Dennis, uma das personalidades do rapaz diagnosticado com transtorno dissociativo de identidade – TDI. Assim como as jovens, somos jogados numa prisão, num subsolo bagunçado como a mente desse Legião dos tempos modernos. E aos poucos, Shyamalan consegue construir tanto a personalidade de Casey – com pistas, clássicas do diretor – como o fato dela travar quando um estranho entra no carro em que ela está, enquanto encara o desafio que é descrever apenas com elementos em tela Dennis, Patricia e Hedwig.
A história que Shyamalan escreve tem traços tanto de realidade quanto de terror, mas deixando um pé na fantasia. Levando em conta que o trio Dennis-Patricia-Hedwig esperam um salvador, nomeados por ele como A Fera – mas leve em conta a denominação original, The Beast – esses três são fanáticos religiosos, cada um no seu jeito e distintamente interpretados por McCavoy, sem deixar dúvidas quem está no controle. Dentro de uma só pessoa, o diretor coloca personagens que alguma vez já nos deparamos em livros ou filmes que conhecemos. O grande trunfo da narrativa é como e quando: Shyamalan usa desde figurino, passando por fotografia, mas principalmente na linguagem corporal das três personas.
Mesmo a maneira que o diretor usa flashbacks, algo que em inúmeras outras obras é uma muleta narrativa, são dignos de nota. Primeiro, servem para construir a personalidade de Casey (e sim, algumas poucas poderiam ser cortadas) e como um escape da personagem e consequentemente da audiência. E Shyamalan, ainda nessa pegada sombria que representa a situação insólita, nos tira a segurança das memórias de espaços abertos (em oposição à prisão) de Casey, como se o mundo fosse tão terrível e cheio de monstros – metafóricos ou não – que é impossível escaparmos. A não ser que aja um fiel da balança.
Diferente de A Visita (The Visit, 2015) – onde o diretor entregou uma história interessante, mas uma direção um tanto problemática pelo estilo – nessa produção Shyamalan trabalha melhor com ângulos e posicionamento de câmera: ele encara as personalidades de Kevin nos olhos, como se elas nos convidassem a conhecê-las melhor. Mesmo quando Hedwig toma conta (ele prefere ficar sentado) o diretor desce a câmera junto com o personagem. Por quererem ser considerados seres humanos, um grito de desespero por identificação, o trio sempre é encarado nos olhos, o que muda radicalmente quando conhecemos o grande antagonista. Na sua apresentação, a câmera abaixa para nos sentirmos inferiores, como estar na presença de um novo superpredador.
Na narrativa a complexidade cai mais na construção das personalidades do que na trama em si – em primeiro por estarmos mais acostumados com a carreira do diretor e em segundo porque Shyamalan não faz muita questão de esconder o que está acontecendo. Então não é um filme de mistério, mesmo que a mente de Kevin seja um quebra-cabeças, e por causa disso nos é dada a chance explorar melhor as nuances do trio dominante. E mesmo assim nós somos um tanto enganados, assim como a Dra Karen Fletcher (Buckley), uma jornada que nos induz a erros e nos distraí intencionalmente da trama.
Prezando mais pela complexidade de seus personagens do que pela própria trama, Fragmentado entra para o rol de produções que conseguem mesclar gêneros sem parecer perdido ou exagerado – esse último adjetivo até passa pela nossa mente perto da conclusão, mas só para nos recompensar ao final. Mesmo se ganhasse um pouco mais de ritmo ao deixar o passado de Casey mais subentendido e cortando alguns flashbacks da personagem, é uma produção que deixa o espectador o tempo todo na ponta da cadeira: senão por pavor, por curiosidade. E todos nós sabemos o que acontece com os curiosos nesse tipo de filme.
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Fragmentado | Sinopse
Kevin (McCavoy) é um jovem diagnosticado com dissociativo de identidade e tem 23 personalidades distintas que emergem separadamente. Depois de anos de controle, três das personalidades sequestram três garotas para o que eles acreditam ser um evento que mudará suas existências: a chegada da dominante 24ª personalidade.
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