Brinquedo Assassino | Crítica | Child’s Play, 2019
Diferente de tantos outros remakes, Brinquedo Assassino tenta verdadeiramente reinventar uma querida franquia, mas deixa frustrações demais.
Pode ser um exagero, mas, para muita gente, a tecnologia é um terror e isso é explorado na nova versão de Brinquedo Assassino. Ao se afastar do conceito de alma e vudu do clássico de 1988, Klevberg mistura ficção científica – que não está tão distante assim – como homenagens a um terror que acha melhor fazer graça ao invés de assustar, e onde a produção se sai melhor, inclusive. Sabendo que é impossível ser original, o diretor holandês abraça absurdos e apresenta um novo-velho personagem a uma nova geração e sem estragar a memória afetiva de quem é fã do velho Charles Lee Ray. O que não quer dizer que isso seja alcançado durante o filme inteiro.
Esse novo Chucky (Hammil) já quer ser assustador desde o começo, o que já é uma piada em si, apesar da tecnologia investida e até desejada, uma coisa que se pensa na experiência do usuário e como as pessoas se relacionam com objetos. Por mais que o defeito de Chucky seja ocasionado por uma péssima decisão qualquer um conseguir mexer numa I.A., seu visual é de dar incômodo, no mínimo. E isso é apontado várias vezes por Andy (Barclay). Aqui, reside aquele humor citado, algo reforçado quando o jovem e seus amigos assistem O Massacre da Serra Elétrica: Parte 2 (The Texas Chainsaw Massacre 2, 1986, Tobe Hooper). A intenção é fazer esses paralelos do gênero, um humor sombrio e desejado.
Isso não impede algumas inconsistências, começando com um funcionário ter acesso às modificações de comportamento do sistema dos brinquedos sem um sistema de checagem dupla. É verdade que a cena é uma crítica à grandes corporações que pagam salários de fome, empregando pessoas em países onde as leis trabalhistas são mais elásticas ou não existem, mas é forçar demais a aceitação, mesmo nesse universo semi-futurista do filme. E há pulos na curva de aprendizagem de Chucky que não condizem com o princípio de aprendizagem. Por exemplo, ele pensa em machucar o gato da família antes de qualquer contato com violência. Isso faria sentido se a cena acontecesse depois de quando Andy e os amigos assitem a filmes violentos.
Mas não é o único problema. Apesar de funcionar quando quer provocar risos, o diretor se perde quando quer fazer terror puro, apelando para músicas e scary jumps como qualquer exemplo menor do gênero. A história também se vale de muitos estereótipos: o cara seboso que observa os vizinhos, negros servindo de alívio cômico, e mãe solteira de Andy, Karen (Plaza), que se envolve com uma série de homens idiotas simplesmente porque é solteira – e, por algum motivo, é mostrada que se envolve com cretinos, todos que abandonam os dois, como seu filho expressa, um elemento que libera a raiva de um corrompido Chucky.
Até mesmo coisas pequenas, como a escolha do boneco se batizar como Chucky, trazem problemas. Nesse caso, serve apenas para fan-service, já que esse era o nome do original. E isso se resolveria de maneira tão simples, por exemplo, fazendo que o nome dado por Andy fosse foneticamente parecido com esse ou então que fosse o nome dado pelo dono anterior do boneco. Isso deixa a impressão que o roteiro não foi revisado para um ajuste fino, e esses detalhes atrapalham inclusive no andamento do filme que, mesmo curto, começa a se arrastar quando chegamos lá pela metade. Inclusive a falta de sutileza do filme, uma dubiedade que poderia ser mais bem aproveitada, mas é apenas arranhada na superfície num diálogo entre Falyn (Kitsos) e Pugg (Consiglio).
Pode ser por medo de querer perder o tom de comédia que Klevberg não adentra no psicológico como acontecia no original, mas os momentos mais sérios existem, como quando Andy entra em frenesi e destrói tudo que é aparelho eletrônico em casa – e, considerando a pendura que os dois vivem, a mãe até que reagiu bem à cena. Fazendo outro paralelo cinematográfico, é como se estivéssemos assistindo a uma mistura do filme de 1988 com A.I: Inteligência Artificial (A.I, 2001, Steven Spielberg), um brinquedo para ser seu melhor amigo, substituindo gente de verdade, mas que dá tudo errado porque o ser humano que é problemático. E Falyn aponta bem que todo filme de apocalipse robótico começa exatamente desse jeito.
Apesar de que todo esse conhecimento de cultura fílmica não faz que os jovens tenham decisões acertadas, detalhes que percebemos estampados em pôsteres tanto no quarto de Andy quanto no de Pugg. Por exemplo, a atitude que eles têm na tentativa de parar Chucky é como um vampiro, atacando o coração. Mas qualquer um que já viu filmes de vampiros sabe que isso não é suficiente. Fora as coisas que não são explicadas sendo que, apesar desse paralelo, esse não é um filme que lida com o sobrenatural, como a estranha força de Chucky, uma que três adolescentes não conseguiam subjugar. Mais uma vez, voltamos à questão da finesse do roteiro, e vemos que essas arestas seriam facilmente resolvidas.
Porém, há alguns conceitos que fazem bem à narrativa, de novo ligado às piadas. A mais divertida, e marcante por consequência, é como Chucky, com uma nova consciência depois de ter seu coração arrancado por alguém que amava de maneira doentia, se comporta como um E.T.: O Extraterrestre (E.T.: The Extra-Terrestrial, 1982, Steven Spielberg) do mal com a ponta do dedo brilhante, capaz de manipular objetos por meio da tecnologia ao invés da telecinésia, diferente do nosso querido ser do espaço. Também como os três amigos se divertem ao descobrir que o brinquedo de Andy não tem amarras sociais e que pode xingar ou o problema que pessoas mais velhas tem com tecnologia são momentos que nos aproximam dos personagens, pois nos identificamos com eles em um ponto ou outro.
Há também uma aposta no gore, elevando a classificação do filme, apesar da contagem de corpos ser bem baixa – o que faz sentido, levando em conta as limitações físicas do diminuto Chucky. Essa violência é uma aposta e nós, na plateia, acabamos abraçando esse lado um tanto sádico, pois estamos no conforto de uma poltrona, e o diretor sabe que só ali isso tem graça. É curioso que Klevberg consiga trabalhar tão bem nessa esfera e não consiga fazer o mesmo quando quer tratar de um horror mais cru, e essas diferenças de apresentações é o que deixa essa obra menos impactante – a cada momento que o diretor muda tom, ele perde a atenção da plateia por não saber como fazer a transição.
O que mais deixa uma experiência frustrante no novo Brinquedo Assassino são esses altos e baixos, como se estivéssemos numa montanha russa – inclusive nos efeitos especiais, onde parece que a verba acabou em partes do filme. Enquanto há bons momentos de humor, não é possível dizer que é uma boa produção só por isso. Ao menos, é uma tentativa de atualização no sentido verdadeiro, não querendo ser apenas uma repetição da história original, evitando inclusive encher a produção de referências ao filme do personagem de Tom Mancini, fora o nome do boneco e uma ligeira semelhança no visual. Isso mostra a intenção de um novo universo, um onde a história funcione sozinha para evitar comparações. É um trabalho difícil, mas vemos que a intenção existiu.
Elenco
Aubrey Plaza
Gabriel Bateman
Brian Tyree Henry
Beatrice Kitsos
Ty Consiglio
Mark Hamill
Direção
Lars Klevberg
Roteiro
Tyler Burton Smith
Baseado em
Brinquedo Assassino (Don Mancini)
Fotografia
Tom Elkins
Trilha Sonora
Bear McCreary
Montagem
Tom Elkins
País
Estados Unidos
Distribuição
United Artists Releasing
Imagem Filmes (Brasil)
Duração
90 minutos
Data de estreia
22/ago/2019
Um jovem ganha de presente um presente que é tanto a ponta da tecnologia quanto um brinquedo, o boneco Buddi, que começa a se chamar de Chucky. Ele e sua criança serão amigos até o fim, algo que Chucky irá se assegurar.
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