Animais Fantásticos e Onde Habitam | Crítica | Fantastic Beasts and Where to Find Them, 2016, Reino Unido
Animais Fantásticos e Onde Habitam é uma história bem simples, com momentos divertidos e que tenta agradar uma nova geração para o universo de J.K. Rowling.
Elenco: Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Dan Fogler, Alison Sudol, Ezra Miller, Samantha Morton, Jon Voight, Carmen Ejogo, Colin Farrell | Roteiro: J. K. Rowling | Baseado em: Fantastic Beasts and Where to Find Them (J. K. Rowling) | Direção: David Yates (A Lenda de Tarzan)
Existem dois pontos positivos em Animais Fantásticos e Onde Habitam: em primeiro lugar, é um filme bem divertido. E em segundo, contém-se em si mesmo (quase), sem a necessidade extrema de uma continuação – ainda que saibamos que ela irá acontecer. Rowling e Yates revisitam o Mundo Bruxo™ com uma mistura de saudosismo com um olhar para frente. Os fãs de Harry Potter e companhia se sentirão bem ao revisitar o universo iniciado pela autora em 1997, mas precisarão entender que esse filme não foi feito para quem cresceu com o bruxo. A proposta é de alcançar um público hoje infanto-juvenil, numa produção que tem o espírito pueril da primeira aventura de Potter. O que torna a produção muito simples em geral.
Os fãs mais atentos, e aqueles que já estão acostumados com outras produções, poderão notar que, estruturalmente, a desventura de Newt Scamander (Redmayne) é similar a do personagem mais famoso de Rowling. Ele é um bruxo num novo mundo – se antes era Hogwarts, aqui é os EUA – e seu crescimento passa por entender esse novo lugar. No caso de Newt – cuja tradução literal do nome é “salamandra” – é perceber como os estadunidenses são diferentes dos ingleses. Isso não é demérito nenhum, apenas uma constatação que serve para os fãs se sentirem em casa e se ligarem a esse novo pária.
O jeito introvertido de Newt, reforçado por sua linguagem corporal, serve de plataforma para Jacob Kowalski (Fogler), um não-maj – trouxa, se preferirem – se destacar. Apesar de Yates focar bastante em Newt, é o humano que rouba a cena. Dentro de um universo que até então fazia apenas parte de livros de fantasia, Jacob nos puxa para o mundo da bruxaria. Cada experiência do personagem é fascinante, e o roteiro de Rowling consegue transmitir essas sensações – medo, confusão e fascinação – de maneira eficaz por esse personagem. É algo que tínhamos de maneira diferente das aventuras anteriores: um humano, comum como nós, que podemos nos identificar.
No entanto, há um grande porém nessa linguagem corporal de Newt. Quem acompanha o ator há algum tempo, um dos novos queridinhos de Hollywood, poderá perceber que esses tiques são característicos de Redmayne, e não de Newt. Esse é o trabalho mais automático do ator até agora, chegando a ser irritante a tentativa de deixa-lo desconfortável com uma voz baixa, quase inaudível, nos diálogos. E o pior: já vimos isso tantas vezes que temos dúvidas se algum dia ele será escalado para um papel que lhe exija mais imponência – já que a primeira tentativa em O Destino de Júpiter (Jupiter Ascending, Dir Lily e Lana Wachowski, 2015) não funcionou.
E existem problemas com o ritmo do filme no momento em que Rowling resolver esticar as piadas. Ainda que nesses momentos Yates saiba usar o silêncio – em especial na cena que acontece numa joalheria – as passagens que Newt tem que caçar um dos animais que trouxe junto dele da Inglaterra é uma repetição do início do filme. Há uma gordura a ser reduzida que daria mais dinamismo à trama. E considerando o público, a produção ter mais de duas horas pode cansar os mais jovens, enquanto os mais velhos vão entender o que está efetivamente acontecendo, mas ainda assim trazendo certa sonolência.
Rowling tenta nos surpreender ao passar a história para um outro país, mesmo que seu protagonista também seja inglês, ao mesmo tempo que cita personagens conhecidos. São detalhes como a menção a Dumbledore ou o pingente do círculo dentro do triângulo. Mas o destaque são as visões de seres citados no livro base da história. Então, é necessário um destaque aos efeitos especiais e ao design de produção que nos brinda com um mundo fantástico ao mesmo tempo que emula a Nova York dos anos 1920, com aurores que parecem ter saído de algum filme policial com Al Capone – não à toa a proibição dos Animais Fantásticos lembra a Lei Seca dos EUA.
Para equilibrar os momentos mais simples da história, Rowling usa de traços de histórias de terror. É como se Harry Potter e O Exorcista se encontrassem, pois há elementos de possessão e exorcismo em um dos seres que Newt guarda. E assim como Pazuzu, o monstro do filme se espalha, e por ser algo sem forma definida é um conceito um tanto assustador. E Rowling não esquece dos grandes monstros que somos nós, os humanos. Seres que tentam exterminar o que não entendem, aqui representados por fanáticos religiosos – e que tempo para mostrar isso nos EUA – com a ascensão de uma nova Salem.
Pensando nessa audiência mais jovem, Rowling não é muito feliz na construção dos antagonistas. Ela conta com a ingenuidade do público-alvo para uma grande surpresa, uma reviravolta bem comum em seus outros livros. O problema é que ela é muito óbvia em alguns momentos – o que esperar de um personagem com sobrenome Graves (Farrell)? – e mesmo quando ela tenta ser mais sutil na revelação da origem de uma criatura sombria, não é preciso ligar muitos pontos para ver onde ela tenta nos enganar. De novo, é uma repetição da abordagem dos outros filmes, e a tendência é que eles amadureçam junto do novo público.
É verdade que há mais personagens interessantes na história. É divertido observar como Tina Goldstein (Waterston) é a representação bruxa daquele policial perspicaz, mas que fugiu das regras de seus comandantes, o que traz outros momentos divertidos e também trágicos. Ela passa um confiança que Newt só adquire dentro de sua mala – notem que lá o mago anda mais ereto e mais confiante – e seu senso de justiça faz paralelo com Elliot Ness, referenciando de novo a época da proibição do álcool. São personagens importantes um para o outro, visões diferentes de um mesmo objetivo que entram em conflito por causa de mal-entendido.
Animais Fantásticos e Onde Habitam é uma história muito simples no seu desenvolvimento, com mensagens de paz, ecológicas e de aceitação que estão logo na primeira camada e atingirão mais facilmente os mais jovens que forem em busca de uma aventura. Existem também homenagens aos filmes de gangsteres, jazz e à própria época que a história se passa e facilmente agradará uma grande parcela de espectadores. O prejudica é a falta de surpresa pela confirmação que essa será uma longa saga. Quem puder abstrair isso da mente vai conseguir apreciar mais a história, mesmo que não haja muitas camadas para serem descobertas.
Animais Fantásticos e Onde Habitam | Trailer
Animais Fantásticos e Onde Habitam | Pôster
Animais Fantásticos e Onde Habitam | Imagens
Animais Fantásticos e Onde Habitam | Sinopse
“Animais Fantásticos e Onde Habitam começa em 1926, quando Newt Scamander acabara de concluir uma exploração mundial para encontrar e documentar uma extraordinária variedade de criaturas mágicas. Chegando a Nova York para uma breve escala, ele poderia ter passado por ali sem qualquer incidente… se não fosse por um Não-Maj (o nome americano para “Trouxa”) chamado Jacob, uma maleta mágica extraviada, e a fuga de alguns dos animais fantásticos de Newt, que poderiam causar problemas para os mundos dos bruxos e o dos Não-Maj.”
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