A Noite do Jogo | Crítica | Game Night, 2018, EUA
A Noite do Jogo é uma comédia para adulto, mas sem apelar para piadas pesadas, e ainda que algumas conveniências prejudiquem o desenvolvimento da história, ela funciona no principal quesito: fazer rir.
Nos falta uma comédia para morrer de rir, então ver algo que não é surpreendente, mas que pelo menos consegue tirar gargalhadas da plateia, como A Noite do Jogo é uma satisfação. As situações são divertidas e a interação entre amigos e a família dos personagens provavelmente irão te lembrar dos seus próprios amigos e parentes, trazendo memórias de como é divertido se reunir não para um fim específico – jogar, beber, comer – mas sim pela importância da companhia e fortalecer laços. Essa identificação, num cenário rodeado por situações que exageram como as coisas podem dar errado, algo típico da comédia, é suficiente para pelo menos entreter com piadas cínicas, algumas de cunho mais social e algumas que funcionam pela simplicidade.
Podemos começar do motivo básico para a produção agradar: sim, é um engraçado. Mas o que dá um tempero a mais ao filme são as pequenas viradas na trama e o empréstimo de elementos de outros gêneros, como o thriller e o terror. Isso dá à trama um ar mais adulto, algo que permite aos diretores brincarem também com a violência, comedida é claro, sem se preocupar em fazer um filme família. Na verdade, essa é um filme para dividir com seus amigos que enfrentam os mesmos problemas que você – todos os inerentes à vida adulta – e que gostam da companhia um do outro. Além de ter umas pitadas de romance.
Esse tom adulto não é apelativo, não se resume a piadas sexuais e faz piadas inteligentes, inclusive usando da comédia para deixar uma situação sinistra mais leve. São contrastes que cineastas com inteligência conseguem usar para fazer momentos serem marcantes porque ao lado está uma situação no espectro oposto. E isso acontece especialmente em duas cenas: a primeira é a de Brooks (Chandler) lutando contra os sequestradores e os ainda inocentes ao cenário assistem passíveis, tranquilos enquanto comem e bebem. A segunda é quando Annie (McAdams) precisa fazer uma cirurgia improvisada em Max (Bateman), onde o casal foi tragado para a realidade, numa cena que tem a seriedade (tanto pela situação quanto à fotografia que dá um ar de algo sujo) quebrada pelo som do brinquedo de apito.
O que incomoda é quando o jogo fica mais sério, por colocar a vida de um dos participantes em perigo, são as conveniências. O roteiro coloca os personagens em algumas situações que precisariam de mais habilidade para serem resolvidas e duas delas são gritantes. Infelizmente, por falta de um carinho especial, ambas são resolvidas de maneira bem rasa. É muito difícil de acreditar que os amigos que entram numa missão para salvar Brooks passem tão facilmente pela casa do ricaço que tem um objeto de desejo – que é praticamente um McGuffin – com portões abertos e um mordomo que simplesmente esquece de fechar um cofre. É verdade que isso deixaria o filme mais longo, mas também mostraria um esforço maior dos roteiristas.
Mas as interações e como os personagens são apresentados e lidam com as dificuldades de ser adultos é a parte mais inteligente da história: Max e Annie tentarem encontrar um meio de serem pais; a aparência de Brooks ser um cara legal, mas um escroto por dentro; a infidelidade que pode abalar o casamento de Kevin (Morris) e Michele (Bunbury); a tentativa de Ryan (Magnussen) de sempre querer mostrar sua superioridade masculina ao namorar moças bem mais novas e menos inteligentes que ele – algo quebrado pela personalidade marcante e forte de Sarah (Horgan). Tudo isso são peças de um mundo que nos rodeia e que, fatalmente, conseguimos identificar, seja em nós mesmos ou em pessoas próximas.
E são quebras que fazem a história ficar ainda mais interessante, como a presença do estranho policial Gary (Plemons), que parece mais ter saído do Hotel Bates, quebrando o estereótipo do vizinho suburbano e simpático – até a casa dele parece saído de um filme de suspense, com o diretor de fotografia Barry Peterson fechando ligeiramente a íris do filme para causar um certo desconforto. Mas ainda assim, nesse clima de tensão, é cômico por causa das coisas que acontecem em paralelo, com situações onde os participantes desse jogo involuntário tentam consertar as coisas, mas só vão deixando elas piores. E é divertido ver que um dos personagens não passa por aquele arco de redenção: um dos grandes acertos do roteiro é que ele não aprende nada.
Isso sem deixar de lado o cuidado com a parte técnica da produção. Podem ser coisas que passam despercebidas, mas é divertido notar como a dupla de diretores usa a montagem e a posição de câmeras para deixar o filme com mais cara de um jogo. Seja com establishing shots em 3D que mimetizam um jogo de tabuleiro e se fundem com a tomada real, ou como a câmera se fixa numa perseguição de carros, numa visão aérea que quem está acostumado com games de corrida conhece. Também existe espaço onde a técnica encontra o simbolismo, quando os amigos precisam se tornar um time ao invés de competir, numa cena que lembra um jogo de futebol americano, onde Daley e Goldstein usam o plano sequência para mostrar a conexão dos personagens, um registro de ação incomum na comédia.
Se não apelasse tanto no meio do filme para facilitar a vida dos personagens, A Noite do Jogo seria uma produção bem mais competente. Porém, a qualidade das piadas é inegável, as situações que os personagens se encontram são críveis, apesar de exageradas, e cumprem a principal missão da comédia, que é fazer rir. A mistura de gêneros coloca a produção no campo do humor sombrio, e assim permitem certas ousadias como vermos os resultados físicos de uma surra, de um tiro ou do resultado uma conversa sobre traição. É uma produção para adultos, aquele tipo que vale a pena dividir com seus amigos mais velhos e deixar as crianças de lado, mas que não apela para baixarias, racismos ou sexismos, o que é uma mudança bem-vinda.
Elenco
Jason Bateman
Rachel McAdams
Billy Magnussen
Sharon Horgan
Lamorne Morris
Kylie Bunbury
Jesse Plemons
Michael C. Hall
Kyle Chandler
Direção
John Francis Daley
Jonathan Goldstein
Roteiro
Mark Perez
Fotografia
Barry Peterson
Trilha Sonora
Cliff Martinez
Montagem
Jamie Gross
Gregory Plotkin
David Egan
País
Estados Unidos
Distribuição
Warner Bros. Pictures
Duração
100 minutos
Cena Extra
O relacionamento entre os irmãos Max e Brooks sempre foi o de competição. Agora adulto, Max é casado e feliz com Annie – mas o irmão volta para a cidade, rico e com sucesso. O mais velho convida o caçula e os amigos para um noite de jogo interativa, onde um deles será sequestrado por falsos bandidos. Ou é assim que se esperava.
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