A Hora Mais Escura | Crítica | Zero Dark Thirty, 2012, EUA
A Hora Mais Escura tem qualidades que vem desde a questão técnica, passando pelo roteiro e levanta a questão da validade da tortura.
Com Jessica Chastain, Jason Clarke, Joel Edgerton, Mark Strong, Jennifer Ehle, Kyle Chandler e James Gandolfini. Roteirizado por Mark Boal. Dirigido por Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror).
Acredito que nos apaixonamos pelos detalhes. Não nos interessamos por todos os assuntos do mundo, mas quando gostamos de algo, queremos apenas saber além do superficial. É por isso que vários cinéfilos apreciam os extras quando compram ou alugam filmes, ou quando gostamos de um livro e queremos saber mais do autor, seu processo criativo, e o que mais escreveu. E quando Osama bin Laden foi morto, queríamos saber como foi, se era verdade ou não. Mais uma vez trazendo um drama de guerra recente, a diretora Kathryn Bigelow mostra um filme com várias qualidades: intensidade, drama e questionamentos fazem parte de uma direção competente dessa história que tantos ansiavam por conhecer e discutir.
O início de A Hora Mais Escura é pesado e tem uma carga emocional fortíssima, pelo menos para quem viveu aqueles momentos terríveis em 11 de setembro de 2001. Gravações reais dos pedidos de emergência que o 911 recebeu no dia tocam por alguns minutos, e só vemos a tela preta enquanto somos inundados por gritos e choros.
Avançando para 2003, nos deparamos com uma cena de tortura propositadamente longa para ser mais incômoda. Um homem, ou o que sobrou dele, aparece nas sombras com várias marcas de espancamento. Maya (Chastain) acompanha o trabalho de Dan (Clarke) e seus comandados que tentam arrancar informações desse homem que tem ligação comprovada com terroristas. Recém-chegada de Washington, Maya desvia o olhar por vezes da humilhação de Amman, mas não mostra fraqueza ou mesmo piedade com o árabe. A rotina acaba por quebrar o prisioneiro, que revela um nome importante para os seus algozes: “Abu Ahmed”, um nome de guerra, é dito por várias outras fontes como o mensageiro pessoal de bin Laden, e por isso vira uma obsessão para Maya. Ela acredita que Ahmed é a chave para a captura do líder terrorista.
Ao invés de transformar a caçada em filme de ação, a diretora foca no começo da investigação, quando esses fatos apareceram e divide a história em quatro capítulos, ou partes de um relatório: “Abu Ahmed, “Erro Humano”, “Especialistas” e “Buchas de Canhão”. Ela também dá força e perseverança à personagem Maya que, diga-se de passagem, pode nem ter existido. O roteirista Mark Boal diz que sim, enquanto um ex-oficial da CIA diz o contrário. Porém, ela é uma personagem interessante, podendo ser uma mescla personas. Essa força faz a personagem ir atrás de pistas, e fazer várias viagens por trás de ação. A princípio, parece que Maya é a única interessada nessa pista aparentemente importante, mas ela é delegada a essa tarefa pelo diretor da CIA em Islamabad Joseph Bradley (Chandler). Mas a busca vira uma obsessão, porque os prisioneiros que sabem de alguma coisa fazem questão de desviar o assunto, mostrando para a agente que Ahmed é alguém importante.
A diretora mostra que Maya vai aos poucos mostrando naturalidade com o cenário que está, ao ponto de mostrá-la menos incomodada com a tortura, e depois em outra cena ela está enquadrada pela câmera comendo e combinando um encontro com uma amiga enquanto no fundo é transmitido um ataque aéreo por meio de satélite. Mais um dia normal na vida de um agente da CIA. Também é interessante que Bigelow faça Maya se disfarçar, de um jeito bem simples, com uma peruca preta cobrindo seus fios ruivos para que ela se torne sombria, mas ainda identificável para a audiência. Por outro lado, Dan se cansa da rotina de torturar e deixa a colega.
O filme todo é uma preparação para a caçada final do líder da Al-Qaeda, e por esse motivo ele empaca. Demasiadamente longa, a produção se arrasta no momento que poderia ser mais dinâmico. A perseguição que acontece em um mercado de rua e os dias pré-ataque são dotados de um marasmo quase sonolento. Esse é o único porém da produção. Bigelow justifica a veracidade do seu filme durante, e não em cenas pós-créditos, como é comum nas produções atuais. Em dois momentos ela insere vídeos que foram divulgados na época: o de um ataque de extremista a um hotel de estrangeiros, e uma entrevista do recém-eleito Barack Obama dizendo que “os EUA não torturam”. Basicamente, chamaram o presidente de mentiroso.
Cito muito o trabalho de direção porque ele é digno de elogios. Bigelow usa tomadas que só por serem mostradas, e não explicadas, dão mais crédito à sua carreira. Quando o diretor Bradley tem que ir embora do país por problemas que põem em risco sua vida, ele simplesmente se vira sem se despedir e não os vemos mais na projeção. A força que ela dá às mulheres também é bem-vinda nesse mundo dominado por homens. E a sequencia final propositadamente escura é uma ótima imersão nos eventos. É admirável, pois a diretora mostra que era uma situação difícil, que tudo ainda não é claro para nós, além de mostrar Laden sem muita definição (como se fosse uma coisa). Ela conta na tela que talvez nunca saibamos toda a verdade.
Agora o ponto principal que levantou polêmica. A Hora Mais Escura endossa ou não a tortura? Uma dos pontos fortes do roteiro é mostrar fatos (ou supostamente fatos). Existe uma oposição óbvia entre as administrações Bush e Obama no cenário que Maya e os outros têm que convencer o agente Leon Panneta (Gandolfini) que Osama está no lugar que ela indicou. Em conversas de corredores, outro analista diz que não pode autorizar a missão sem provas mais sólidas, e que se preocupa pela informação ter aparecido anos antes e por meio de tortura. Mas pergunta qual seria o plano se a ação fosse autorizada pelo presidente. Diante do que é apresentado em tela, digo que o filme não encoraja a tortura, mas admite que por causa dela o caso foi fechado. E informar é diferente de concordar.
E seria pedir muito comentar e compartilhar? 😀
No Oscar 2013, “A Hora Mais Escura” concorre nas categorias de Melhor Filme, Melhor Atriz (Jessica Chastain), Melhor Roteiro Original (Mark Boal), Melhor Edição de Som (Paul N. J. Ottosson), e Melhor Edição (Dylan Tichenor e William Goldenberg).
A Hora Mais Escura | Trailer
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