Uma História de Amor e Fúria | Crítica | 2013, Brasil
Apesar do destaque na qualidade da animação, Uma História de Amor e Fúria é maniqueísta ao extremo.
Com Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro. Roteirizado e dirigido por Luiz Bolognesi.
Devo admitir que foi corajoso o filme ser uma animação e com toques de ficção científica. Ao usar elementos do povo brasileiro, o roteirista e diretor Luiz Bolognesi cria um heroi que se identifica com a identidade miscigena própria do nosso pais: ele é índio, depois mulato e finalmente branco. A história viaja por vários momentos históricos que fazem o protagonista entrar em conflito com personagens históricos. Mas “Uma história de Amor e Fúria” é uma perda de tempo do espectador. É um coleção de clichês, não apresenta nada de novo, além de ter os personagens mais maniqueístas que eu já vi nos últimos tempos. Dotado de uma roteiro fraco e superficial, é um dos piores filmes do ano.
Começando durante a colonização portuguesa, um índio tupinambá (Mello) conta a sua trajetória numa longa e desnecessária narração em off. Isso é uma praga que está infestando o cinema contemporâneo, mostrando o que está bem na nossa frente. Enfim, o nosso heroi recebe uma missão de enfrentar anhangá (um espírito maligno de acordo com tribos sul-americanas), um grande mal que é representado no filme pelo homem branco português, mais tarde pelo exército do início do império brasileiro, depois pelos militares da época do regime, pela Polícia Militar carioca e finalmente uma milícia armada futurista. Em resumo, qualquer tipo de governo. No primeiro arco é estabelecido que personagem conseguiu voar, e o pajé da tribo diz que ele só faria o feito de novo quando derrotasse anhangá. Agora porque os deuses deles não concedem o poder permanentemente para o personagem é um mistério, já que seria bem útil. A companheira do personagem é a índia Janaína (Pitanga), que nesse primeiro arco não faz muito além de atrapalhar e usar piadas bem ridículas para a época (“que cara de macaco amarrado é essa”). Sabemos como a história acaba. A tribo é dizimada, seus sobreviventes viram escravos e o protagonista tenta se matar… mas é transformado num pássaro. Mas ele só não poderia voar quando derrotasse o inimigo?
Continuando pelos períodos da balaiada, e depois para os anos 1970 durante o período militar, que é onde filme mostra a sua posição política (mas bem superficial) que deve agradar àqueles que foram direcionados. Ainda se fosse só isso seria compreensível. Mas o diretor faz que o personagem principal “reencarne” em volta gente boa e sem defeito nenhum: todos bons, sem vícios e cheios de espírito caridoso. A família da segunda encarnação do personagem principal chega a fazer uma doação de comida bem substancial para alguns negros fugidos que estavam se escondendo por aqueles cantos de Caxias (Maranhão). Ao contrário de seus inimigos, que agem se dó e chegam aos limites da maldade humana. Com uma índole tão boa, é difícil de acreditar que na sua terceira encarnação, nos anos 1970, o personagem se engaje numa luta que muitos consideram válida, que é de derrubar o poder estabelecido pelos militares, para depois fazer parte da “Falange Vermelha”, que foi a gênese do “Comando Vermelho” no Rio de Janeiro. E segundos antes ele estava ensinando para uma comunidade carente. Bolognesi perdeu uma grande oportunidade de dizer que a educação é a melhora de toda a sociedade. Infelizmente, a cena dura apenas alguns segundos.
“Uma história de Amor e Fúria” peca por vários motivos. O principal é enaltecer uma bandidagem ao ponto de lavar as mãos de tais personagens que sim, reagiram ao ambiente em volta deles, mas se recusa a apontar os defeitos e erros, como é costuma ser qualquer poder estabelecido. A única coisa que se salva nesse filme é a animação. E me refiro apenas aos efeitos aplicados porque o character design dos personagens é bem comum. Por ter sido feito para um público específico, é uma história que não acrescenta em nada na filmografia brasileira.
Essa crítica foi publicada originalmente na cobertura da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo de 2012.
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