Os Oito Odiados | Crítica | The Hateful Eight, 2015, EUA

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Em Os Oito Odiados, Tarantino mostra que a história americana foi escrita a sangue. E que não foi nada bonito.

Os Oito Odiados

Com Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Demián Bichir, Tim Roth, Michael Madsen, Bruce Dern. Roteirizado e dirigido por Quentin Tarantino (Cães de Aluguel).

8/10 - "tem um Tigre no cinema"Os Oito Odiados é longo, não economiza película – literalmente, já que a produção foi original concebida em 70mm, apesar de não podermos vê-la assim no Brasil. Por isso acaba sendo contemplativo e até difícil de acompanhar. Porém, é uma produção interessante desde a tipografia usada no título do filme, na épica trilha de Ennio Morricone, no desenvolvimento dos personagens pelos diálogos e no belíssimo contraste do vermelho com o branco. O clima de mistério envolvente nesse faroeste invernal – algo bem incomum no gênero – não é o melhor trabalho do diretor, mas ainda é um bom filme com o já tradicional humor e ação de Quentin Tarantino.

A cena inicial do filme trem aproximadamente cinco minutos. É um plano longo mostrando uma carroça vinda ao longo de uma imensidão branca à enquanto vemos os créditos do filme. Já é suficiente para entender o clima que, apesar da contemplação e do símbolo da figura de Cristo enterrada na neve, poderia sim ser diminuída. Se há algo para se reclamar do filme é esse exagero dos seus 160 minutos – algo que Bastardos Inglórios e Django Livre pareciam não ter.

O que temos a seguir, nesse e no ato seguinte, é um road movie onde Tarantino desenvolve a personalidade distinta de metade dos oito odiados. Daisy Domergue (Leigh) é mais louca, porém perigosa. Ela é uma mulher tão forte – num sentido mais figurado que literal – que precisar ser presa em correntes. Ainda nessa situação, ela confronta John “O Carrasco” Ruth (Russell), um caçador de recompensas desconfiado e dono de mais força bruta. O Major Marquis Warren (Jackson) é mais prático e seguro de si e, como vamos entender melhor mais à frente da narrativa, sabe o que precisa fazer para sobreviver num país assolado pelo racismo.

Chris Mannix (Goggins) aborda a carroça durante essa viagem, servindo de elo entre atos ao se apresentar como o novo xerife de Red Rock, onde Ruth será enforcada e Ruth receberá sua recompensa. É nesse momento em que Tarantino planta habilmente a semente da desconfiança dessas pessoas. Elas estão lá por ser o que dizem ser e é uma incrível coincidência estarem ali? Com isso, você volta alguns minutos atrás dentro e se pergunta até se os motivos de Warren são verdadeiros.

Com os novos personagens isolados começamos a pegar as inspirações de Tarantino para essa nova produção. Ecos de O Enigma do Outro Mundo e o romance E Então Não Sobrou Nenhum (de Agatha Christie, também conhecido como O Caso dos Dez Neginhos) estão lá para quem quiser ver. Bob (Bichir), Oswaldo Mobray (Roth), Joe Gage (Madsen), e Sanford Smithers (Dern) podem ser ou não o que dizem. E essa duvida vai corroer não só Warren, Ruth e Mannix, mas também o espectador, auxiliado por uma narração off, mas sutil, que mostra detalhes que perdemos por causa de uma discussão entre o soldado negro e Smithers, um general confederado e tão racista quanto o novo xerife.

Outra grande qualidade da produção, senão for a maior, é a ausência de heróis. Não quer dizer que o protagonista – e que desafio é determinar quem seja – não passe pela chamada “jornada do herói”, mas cada um dois oito são bem desgraçados, cada um a sua maneira. São personagens tão detestáveis que você dificilmente gostaria de viajar com eles, o que se reflete na hesitação de O.B. Jackson (Parks) em receber mais gente em sua carroça.

Em outros filmes Tarantino usou a figura do oprimido contra o opressor – uma mulher em Kill Bill, os judeus no já citado filmes de 2009 – e aqui repete o papel do negro como já tinha sido em 2012. Não é à toa quando digo que esse filme é uma representação de parte da história dos EUA, o que fica bem explícito em um dos diálogos de Warren com Ruth sobre uma carta que o antigo combatente sempre leva consigo, escrita pelo então presidente Abraham Lincoln. E também no embate que Warren tem com Smithers, mostrando o que um negro tem que fazer para sobreviver na América – mostrando o grande ator que o personagem é.

Com boas surpresas e cheio de diálogos inteligentes, Os Oito Odiados tem alguns problemas na escolha do diretor de alongar demais a narrativa, o que pode tornar a experiência maçante para alguns – provavelmente o montador Fred Raskin não tem o poder que Sally Menke tinha no diretor. No entanto, demora bem pouco para as cenas interessantes acontecerem – a cena com Warren sentado em três cadáveres empilhados na neve enquanto espera que alguma carroça apareça é impagável. É uma eficiente mistura de violência, comédia e tiros. Poderia ser menos violento? Sim, mas não seria Tarantino.

Sinopse oficial

Em Os Oito Odiados, que se passa seis ou oito ou doze anos depois do final da Guerra Civil Americana, uma diligência desloca-se a toda velocidade pela paisagem invernal do Wyoming. Os passageiros – o caçador de recompensas John Ruth (Russell) e a fugitiva Daisy Domergue (Leigh) – estão a caminho da cidade de Red Rock onde Ruth, conhecido na região por O Carrasco, levará Domergue para a justiça. Ao longo da estrada, eles encontram dois forasteiros: o Major Marquis Warren (Jackson), um ex-soldado negro do exército que se tornou um infame caçador de recompensas, e Chris Mannix (Goggins), um sulista renegado que diz ser o mais novo xerife da cidade.

Perdendo o controle da viagem na nevasca, Ruth, Domergue, Warren e Mannix buscam refúgio no Armazém da Minnie, uma parada de diligências situada numa passagem entre montanhas. Quando eles chegam ao armazém, são recebidos não pela proprietária Minnie, mas por quatro rostos desconhecidos. Bob (Bichir), que está tomando conta do armazém enquanto Minnie visita a mãe, na companhia de Oswaldo Mobray (Roth), o enforcador de Red Rock, o vaqueiro Joe Gage (Madsen), e o general confederado Sanford Smithers (Dern). À medida que a tempestade vai ganhando força sobre as montanhas, os nossos oito viajantes vêm a saber que podem não chegar à cidade de Red Rock afinal…”

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".