O Preço do Amanhã | Crítica | In Time, 2011, EUA
O Preço do Amanhã é uma ficção científica pouco imaginativa apesar de explorar o assunto da disparidade socio-econômica.
Com Justin Timberlake, Amanda Seyfried, Cillian Murphy e Olivia Wilde. Escrito e dirigido por Andrew Niccol (Gattaca – A Experiência Genética).
A história se passa em 2161, numa sociedade onde alterações genéticas fazem que toda a população pare de envelhecer ao completar 25 anos. Mas a partir daí você tem só mais um ano de vida. Se quiser viver mais, tem que comprar mais tempo, que é a moeda para tudo nessa sociedade: desde o café, passando por transportes e jogos. Nesse cenário os pobres vivem pouco e isolados em guetos, enquanto os milionários podem ser imortais. É nesse mundo que Will Salas (Timberlake), um jovem de 28 anos, que recebe um século de um milionário que não quer mais viver. E começa a ser perseguido por causa disso.
Uma ideia dessas tem potencial, por mais que seja uma nova visão do clássico “Fuga do Século XXIII” (Logan’s Run, de 1976) é interessante ver que a história não tem aqueles dizeres “baseado no livro/conto/história de…”. O cenário, bem lembrado pelo meu amigo Tielo lembrou o mercantilismo. A Europa entrou nesse sistema porque o ouro e prata estavam acabando. Então, no futuro do filme seria algo assim? O tempo virou moeda por não se produzir mais dinheiro, por causa de um agravamento na crise do crédito que os EUA passam hoje? Interessante, mas a profundidade acaba por aí. O roteiro tem tantos furos que não dá para levar muito mais à sério. Apesar de várias falas serem anti-capitalista, o sistema não é o capitalismo. Como disse, é mercantilista, algo que foi abandonado no sec XVIII. Fica sem explicação como essa riqueza é produzida. Vamos pra mais furos. O Guardião do Tempo Raymond Leon (Murphy) diz em várias vezes que conhece o pai de Will. Isso poderia ser mais aprofundado, mas não. Podemos até dizer que não deveria ser considerado furo, e sim um gancho para possíveis continuações. Ainda assim, incomoda. Depois, passamos para o cenário “futurista”, mas nem tanto. Deem uma olhada nesse poster de divulgação do filme, que foi lançado um mês antes da estreia:
Alguma coisa um tanto Blade Runner, não é? Pois bem, apesar da história se passar depois de mais de 100 anos do nosso presente, esse visual não aparece em nenhum momento do filme, nem mesmo quando chegamos na parte mais rica da cidade. Não é um visual retrô, é um visual que não foi pra frente. Tenho que dar mais um crédito a Niccol, por que aqui ele parece ter lembrado de 1984 (de George Orwell), onde a tecnologia estagnou em ponto para que a sociedade só produzisse para a Guerra. Mas é o mesmo caso do mercantilismo: para por aí, e também não parece ser o caso, pois a sociedade mais rica não finge estar acontecendo alguma guerra que leve embora o tempo de tudo para que o país vença.
Esse mundo mal tem a tecnologia que nós temos! Pode reparar, por exemplo, que não aparece um só tablet no filme inteiro. A máquina que transfere tempo, um painel que cobre uma parede, e um telefone sem-fio são o ápice da evolução deles. Até os telefones públicos são quase os mesmos que usamos hoje! As armas são todas mecânicas. A mais usada parece ser uma .22 automática, sem nenhum design futurista. Um pouquinho mais de esforço resolvia. A única coisa que me chamou a atenção foram os carros. Notem que esses sim tem designs retrôs (me parecem Cadillacs), mas o som que eles fazem ao girar a chave (outra coisa que retrocedeu, pois tantos carros que hoje ligam com botões) é diferente, dando a entender que eles não funcionam à combustão, e sim elétricos. Mas numa sociedade que pode ter estagnado, ou retrocedido na sua tecnologia, ela tem conhecimento suficente em bioteclogia para fazer que cada pessoa nasça com o relógio do tempo em seu antebraço, e que ele comece a contar regressivamente quando se completam 25 anos.
E uma tecnologia tão avançada pode ser facilmente roubada: é só você ser um pouco mais forte que a sua vítima. E a cena do roubo ao banco de tempo do gueto é mais idiota ainda. A segurança é quase zero, com o cúmulo do cofre ficar atrás do balcão de atendimento, e não num andar separado, como em qualquer banco hoje em dia. Se eu pensar em todos esses furos que me incomodaram, não vou parar de escrever. O orçamento de US$40 milhões deve ter sido gasto, em grande parte pelo menos, com o salário de Timbarlake. Os efeitos especiais são necessários num filme como esse. E a única aparição deles é no relógio que conta o tempo de quem usa.
A construção dos personagens não ajuda também. Sylvia Weis (Amanda) é uma garota mimada, mas sem expressão. Phillipe Weis (Vincent Kartheiser), pai da personagem e “vilão” do filme fica só com seu nariz empinado, tentando se mostrar aterrorizador, mas não consegue. Rachel Sallas (Olivia) aparece muito pouco no filme para ser julgada. O Guardião do Tempo Raymond é o melhor em cena, mas é chocante ver como um cara tão inteligente, destimido e até prevendo ações dos personagens, tem um final tão estúpido, apesar de ser esperado. E Justin Timberlake… esse é tão ator quanto eu sou. E os momentos finais servem para arrastar e selar lá embaixo a nota do filme. Além do mais para que comprar tempo? Parece ser uma coisa sem futuro (que irônico): se você é milionário, tem que ser obrigatoriamente imortal. Mas se o dinheiro existisse, pelo menos teríamos uma outra opção.
Esse filme foi uma série de erros, e é difícil acreditar que ele já passou os (grandes) custos de produção. Com a recepção negativa, não parece existir espaço para sequências. Se quiser ver bons filmes do diretor, fique com “Gattaca” e “O Show de Truman” (que ele não dirigiu, mas escreveu o roteiro).
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