Human Flow: Não Existe Lar se Não Há Para Onde Ir | Crítica | Human Flow, 2017
- TIAGO
- 17 de novembro de 2017
- cinema alemão, Críticas, Documentário, Filmes
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- 2260
Human Flow: Não Existe Lar se Não Há Para Onde Ir é um triste retrato da nossa época e traz uma mensagem importante para essa geração e as próximas.
Arte é entretenimento, mas também questionamento. Human Flow: Não Existe Lar se Não Há Para Onde Ir está na segunda categoria, uma peça contundente para os nossos tempos; além disso, um retrato deles. Aliás é um retrato da humanidade, onde muitos preferem virar a cara e ignorar os gritos de desespero de pessoas que deixam sua pátria não por opção, mas por não ter uma. Durante mais de duas horas, Ai Weiwei nos torna testemunhas de gente como a gente que está passando por situações que, provavelmente, conhecemos só pelas notícias. Não que o filme também seja um recorte, mas o diretor usa o poder do cinema para entendermos um pouco melhor o que se passa.
É marcante que a primeira cena do filme seja um tanto poética: há uma calmaria, um céu azul e limpo onde aparece uma única gaivota no céu, que por causa da escala faz as vezes de uma pomba, acompanhados por uma suave trilha sonora. Mas, como um sonho, isso acaba para cairmos como os muitos que tentam refúgio na Europa, primeiramente passando pela ilha de Lesbos. A câmera vai para a mão de Weiwei e a partir de então começamos a ver planos longos nas histórias das pessoas, algumas que sequer querem mostrar o rosto. São recortes, histórias que contam alguns detalhes de pessoas de diferentes partes do globo.
A produção não foca apenas nos refugiados da guerra na Síria, mas também daqueles que fogem da fome e das mudanças climáticas. E ao mostrar números – como termos hoje a maior taxa migratória desde a Segunda Mundial – o diretor nos dá uma dimensão do problema. É interessante também que sendo um artista de vários meios, Weiwei nos dá a dimensão do problema esteticamente quando usa vários planos plongés e aéreos. Com isso, o diretor nos mostra por meio de suas lentes o tamanho que essas pessoas expatriadas ocupam em outros países, seja nas fronteiras ou em campos de refugiados.
O que acompanha cada entrevista é um olhar melancólico e de não pertencimento, e cada captura de Weiwei dessa questão que não afeta diretamente ninguém que está lendo esse texto é uma dor no coração. Ou pelo menos deveria ser. O diretor prefere dar voz àqueles que não tem ou para quem tem algum tipo de poder para fazer mudanças ao invés de replicar o que poderosos e preconceituosos tem a dizer. O máximo que acontece é que Weiwei coloca em alguns momentos de seu filme legendas no canto do frame, como aqueles de grandes portais de televisão, com notícias e dados sobre os refugiados.
Isso não quer dizer que o filme não seja prático – o que acontece é que Weiwei é mais sutil ao colocar o dedo na ferida. A parte do filme que melhor representa isso é a história de um tigre que está claramente estressado por estar enjaulado numa zona de conflito. Há então uma coalizão de quatro governos para tirar o felino da área de conflito e lhe dar um lugar melhor para viver. O diretor não diz nada sobre o assunto em palavras, mas o recado é bem claro: se vários governantes podem se mobilizar tanto por causa de um animal, será que o mesmo não poderia ser feito por seres humanos?
E, como deveria ser, o documentário aborda as piores facetas da humanidade: relatos de caso de estupros, como as pessoas sofrem nas mãos de contrabandistas, e daqueles que fogem do Estado Islâmico. E deve ter sido a primeira vez que vemos uma casa bombardeada do lado dentro. Pense nas vezes em que nos jornais vimos imagens de Gaza ou em Aleppo onde há apenas o esqueleto de algo que já foi um lar. Terrível, sem dúvidas. No entanto, Weiwei nos mostra que naquele cemitério de prédios ainda vive gente. Gente que não pode sair ou que simplesmente acreditam que assim é o melhor jeito de continuar.
E nem mesmo onde as coisas estão mais calmas a situação está bem. Já perto do fim do filme, Weiwei mostra alguns refugiados que estão vivendo numa parte desativada de um aeroporto alemão, como o Viktor Navorski da vida real, mas com muito mais gente. Ali, onde pela primeira vez temos o testemunho de uma criança, temos eternos transeuntes, pessoas que não podem viver a vida antiga e nem experimentar uma nova, algo que precisam se acostumar. Como acontece em outro momento das filmagens, quando há um blecaute na Faixa de Gaza, as pessoas simplesmente continuam o que estão fazendo porque aquilo é muito comum.
Em geral, Human Flow: Não Existe Lar se Não Há Para Onde Ir tenta mostrar um retrato de esperança – tanto que leva quase duas horas para vermos uma pessoa morta no filme. Há um determinado momento que um dos refugiados entrevistados diz que apesar dos problemas “nós caminhamos“. Para eles, é um passo de cada vez, assim como os judeus que vimos na conclusão de O Violinista no Telhado (Fiddler on the Roof, 1971, Norman Jewinson), durante o caminho de onde são expulsos, eles só podem contar uns com os outros. A questão que Weiwei nos entrega é que podemos fazer pelos nossos semelhantes que batem à nossa porta. A resposta é o tipo de sociedade queremos ser.
Direção
Ai Weiwei
Roteiro
Chin-chin Yap
Tim Finch
Boris Cheshirkov
Fotografia
Murat Bay
Christopher Doyle
Lv Hengzhong
Wenhai Huang
Konstantinos Koukoulios
Renaat Lambeets
Dongxu Li
Johannes Waitermann
Ai Weiwei
Ma Yan
Zanbo Zhang
Xie Zhenwei
Trilha Sonora
Karsten Fundal
Montagem
Niels Pagh Andersen
País
Alemanha
Distribuição
Participant Media
Duração
140 minutos
O diretor Ai Weiwei conta diversas histórias e passa por vários países para dar luz à algumas pessoas que fazem parte dessa que é a segunda maior onda migratória da história do nosso planeta.
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