Guardiões da Galáxia | Crítica | Guardians of the Galaxy, 2014, EUA
Guardiões da Galáxia é espirituoso e engraçado como poucos filmes de aventura. Pode não ser o melhor do universo Marvel. Mas com certeza é o mais divertido até então.
Com Chris Pratt, Zoe Saldana, Dave Bautista, Vin Diesel, Bradley Cooper, Lee Pace, Michael Rooker, Karen Gillan, Djimon Hounsou, John C. Reilly, Glenn Close, Benicio del Toro e Josh Brolin. Roteirizado por James Gunn e Nicole Perlman, baseado nos quadrinhos da Marvel Comics. Dirigido por James Gunn.
Mais um filme da Marvel, você pode pensar. E haverá um momento em que um filme enfadonho atrás do outro irá aparecer, e o estúdio vai ter que se reinventar. Felizmente, esse momento ainda não chegou. Guardiões da Galáxia é divertido, espirituoso com personagens marcantes e um roteiro empolgante e bem amarrado do começo ao fim. Apesar de ser um filme com poucas pretensões, leva o universo que começou em 2008 para uma realidade cósmica, onde a ficção científica tem o direito de brincar com alguns conceitos que temos como certos, mas que, no fim das contas, parece não importar muito em nome da irreverência.
Peter Quill (Pratt), que atende pela alcunha de Senhor das Estrelas, é um caçador de objetos que atende quem pagar mais pelos seus serviços de mercenário. Quando ele tem a missão de achar um orbe num planeta abandonado, Peter chama atenção do kree Ronan (Pace), um radical da raça que deseja o objeto para si para destruir um planeta inteiro. Peter acaba sendo caçado tanto por ele quanto por Rocket (Cooper), Groot (Diesel) – que o querem como recompensa – e Gamora (Saldana), que quer o orbe para seus próprios propósitos. Esses criminosos, que ainda encontram Drax, o Destruidor (Bautista), se unem para explorar o valor que o orbe tem, mesmo que Thanos (Brolin) esteja atrás dele.
O diretor começa a história muito bem, e em menos de cinco minutos já apresenta o passado do herói e como ele foi parar no espaço. Não são informações sutis, apesar de não sabermos quem é o pai de Peter – um ser de luz, é tudo que a mãe moribunda deixa escapar – mas há um dinamismo ótimo que já manda o jovem Peter para o espaço. E detalhe que alguns momentos antes ele escutava um toca-fitas com o aro ligeiramente para cima, dando a ele uma impressão alienígena.
O pulo de quase 30 anos mostra um personagem já conhecedor do seu ofício e que ainda consegue se divertir enquanto trabalha, sempre carregando o velho toca-fitas com as músicas que a mãe mixou para ele. Além de ser um totem, serve também para mostrar as diferenças entre tecnologias, pois ao mesmo tempo em que ele está ouvindo música num objeto jurássico, ele carrega algum tipo de scanner que mostra fantasmas – melhor dizendo, assinaturas elétricas – do passado de um planeta devastado.
E como dá gosto de ver uma ficção científica tão bem cuidada. O estúdio esperou a hora certa para um lançamento tão fantasioso como esse. Os movimentos e a postura de Rocket – um guaxinim geneticamente modificado – beira a perfeição, e quase esquecemos que aquele é um personagem de CGI. Acreditamos também que Groot existe, que a máscara de Peter se miniaturiza, assim como nas naves. Não há exagero dizer isso: tudo que se trata de efeitos especiais nesse filme deve virar uma referência para futuras produções de ficção científica.
Isso não quer dizer que seja algo gratuito, sem recheio. Apesar de ser bem comum, notem a diferença entre a nave de Ronan e a armada xandariana. O visual da espaçonave kree é sombria, e o mais interessante é que os designers a fizeram distorcidas nas extremidades, refletindo a própria distorção de seu comandante. Já as em Xandar, o Nova Corps são brilhantes, com formato de estrela e, vejam só, em determinado ponto da história formam uma constelação luminosa para impedir a chegada da escuridão. E a paleta de cores reflete essas informações, tanto que é ligeiramente difícil de ver o universo kree com os óculos 3D com suas lentes escuras. Felizmente, Gunn levou em conta a tecnologia e pensou em 3D, apesar de não ter filmado assim. Pela primeira vez, um filme da Marvel convertido para essa tecnologia funciona.
Óbvio que sem uma boa história, essa produção seriam mera masturbação técnica. Os personagens, apesar de não serem exatamente originais, são críveis e há uma sinergia tátil entre eles. Cada um tem sua personalidade apresentada sem enrolação, e os motivos que os fazem se unir funciona. Peter é o boa praça, malandro, conquistador e segue um código de honra: por exemplo, enquanto foge na cena inicial, ele não hesita em matar dois perseguidores, mas durante a fuga da prisão ele usa armas para atordoar os guardas, e até negocia com um dos presos para tirar dele uma perna mecânica, sem usar a violência para isso (mesmo com o inferno acontecendo do lado de fora). Rocker e Groot são inseparáveis, e eles próprios tem seu código. Gamora é uma arma viva, mas todo o seu histórico é de uma sobrevivente. Drax é o cabeça dura e inconsequente, mas entendemos o seu jeito de ser.
O melhor é que eles não são os heróis que estamos acostumados à ver. Não são vilões, mas anti-heróis, cada uma com sua perda e entendemos que essa dureza exterior é parte do que passaram. De novo, pode ser clichê, mas cada um quebra-se emocionalmente. Uns demoram mais que os outros. Menos Groot que, sendo um elemental da natureza, é o mais simples e mais puro daquela turma. E na sua simplicidade que acontece a cena mais emocionante do filme.
Devo dizer também que vejo esse filme como uma grande homenagem à saga Star Wars. Todos os elementos estão lá: há uma invasão (que lembra o ataque à Estrela da Morte), a ajuda repentina, Groot como personagem leal de uma fala só (Chewbacca, mais alguém?), Rocket claramente inspirado em Han Solo e até a figura de um Imperador em Thanos, que aparece numa projeção holográfica (como Vader e Palpatine se comunicam em O Império Contra Ataca). Isso diminui a qualidade da produção? De jeito nenhum! É divertidíssimo caçar essas referências.
Guardiões da Galáxia é espirituoso e engraçado como poucos filmes de aventura são. Isso por si só vale o ingresso. Tem situações lugar comum, é verdade, com um vilão um tanto bidimensional e um braço direito bem mediano, mas que também protagoniza outra dessas cenas cheias de espírito. É um filme que não se leva à sério, e esse é o seu maior trunfo. Assim nos carrega num fantástico passeio que dá vontade de ser repetido. Pode não ser o melhor do universo cinemático Marvel. Mas com certeza é o mais divertido.
Veja o trailer de Guardiões da Galáxia
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