A Morte te dá Parabéns 2 | Crítica | Happy Death Day 2U, 2019
Além de repetir temas e situações do original, A Morte te dá Parabéns 2 é um desserviço ao abordar de maneira tão leviana um assunto sério como o suicídio.
O que era homenagem no original de 2017, toma um caminho diferente na continuação e A Morte te dá Parabéns 2 termina sem o ar charmoso da primeira aventura. Aproveitando a onda de ser bem recomendada no geral, fica no ar que a continuação só existe para que a produtora continue surfando numa onda que, se não trouxe uma originalidade aos filmes de terror/slasher, deu pelo menos respiro ao gênero. Colocando o elemento da ficção científica, a continuação prejudica o andamento do universo, onde o absurdo de uma personagem viver sua vida e morte uma vez atrás da outra já era insólito o suficiente. Mas o problema se encontra não na falta de carinho de Langdon no roteiro ou nas repetições, mas na romantização do sério problema do suicídio.
No mesmo cenário, apenas no dia seguinte, a impressão que temos com Ryan (Vu) acordando depois de sua morte pelas mãos do assassino com cara de bebê será a mesma da que Tree (Rothe) passou onze vezes no filme de 2017. E percebendo na armadilha que entrou, Landon tenta não fazer que o raio caia duas vezes no mesmo lugar, mas fazendo a maldição passar de uma pessoa para outra com uma explicação de ficção científica – uma geringonça que mexe com o espaço-contínuo do tempo –, é algo bem desnecessário. A vantagem é que, por causa do conhecimento prévio, o início dessa trama é mais ágil que o do filme original, com Ryan já admitindo que algo estava errado no seu primeiro respawn.
Essa mistura de (hard?) sci-fi com filmes de terror não é novidade e dá um ar de videogame, da mesma maneira que o original, que sem dúvidas é um atrativo para os fãs da mídia. Ao mesmo tempo que se encontra no mal desses filmes que tentam emular isso que é a passividade do espectador – algo que Black Mirror: Bandersnatch (2018, David Slade) se propôs a mudar. Mas, juntando o fator explicativo, apesar de dizer que a máquina se acionou sem motivo algum no dia de aniversário de Tree, e envolvido por um piegas romance dela com Carter (Broussard), a trama começa a ficar incomodamente longa. É como se a ideia ficasse como um bom adendo de um especial num extra, mas não com vida própria.
E a ausência do roteirista do primeiro filme, Scott Lobdell, faz falta. Apesar da virada interessante quando descobrimos quem é o assassino que está atrás de Ryan, e podemos admirar a tentativa, é na volta de Tree como protagonista que a história se perde, já que a personagem, sem um bom motivo, esquece todo o aprendizado do filme original. Além dos momentos fracos – a separação dos amigos, a recapitulação do filme anterior – ou momentos didáticos – com frases tão óbvias que parecem ser de algum iniciante – é impossível aceitar as decisões de Tree depois que ela se encontra numa dimensão paralela, e um tanto injusto ao tirar o protagonismo de Ryan.
Mas vamos admitir por um momento que a trama quer continuar com a homenagem ao slasher com a clássica final girl que passa por cima de tudo e de todos. Porém, todas as continuações inserem nas protagonistas que revivem os momentos de terror mais experiência, algo que Landon joga fora no seu roteiro. Usando a óbvia vantagem de poder resetar o dia para solucionar o problema que se encontra de novo, Tree é aconselhada a se matar e guardar informações importantes para o time de jovens cientistas e parceiros de Ryan que poderão tirá-la do novo loop. Apesar da graça do filme original ser a originalidade das mortes, essa questão dos suicídios múltiplos de Tree servem só para alimentar o nosso lado doentio que gosta de ver essas coisas.
A questão é como ela escolhe sair daquele mundo até que os amigos encontrem uma solução. É estabelecido no primeiro filme que cada vez que Tree voltava, ela estava mais fraca que na sua vida anterior, o que faz mais sentido do que a indestrutível mente do personagem de Tom Cruise em No Limite do Amanhã (Edge of Tomorrow, 2014, Doug Liman). Então, é difícil acreditar que cada nova morte de Tree seja por maneiras tão dolorosas – em uma cena, a jovem bebe uma garrafa de alvejante, o que, provavelmente, causou uma longa e agonizante morte – ao invés de procurar maneiras de partir sem que seu novo corpo sofresse tantas sequelas.
Há, porém, algo de divertido na trama quando entramos nesse universo paralelo onde as coisas são ligeiramente diferentes do mundo original. Como caçamos momentos onde um filme vai usar o Grito Wilhelm, nos pegamos caçando as mudanças entre um mundo e outro, como um jogo de sete erros que passa na nossa frente e que farão parte de várias listas de veículos que se interessam pelo assunto. Ou, numa referência mais recente, imaginar como as escolhas de Tree fariam parte do mundo de Dumb Ways To Die. É o contraste com a parte mais melosa e o que faríamos se tivéssemos segundas chances, podendo dizer o que nunca dizemos para as pessoas que amamos, algo que afasta a trama do terror.
Mas sempre voltamos a como Tree regrediu de sua experiência passada, o que obriga a colocar Carter como o grilo falante da história e apontar o óbvio, que aquele novo mundo não é o de Tree e como ela seria egoísta se lá ficasse. Se no primeiro filme ela se sacrificou para salvar a vida dele, mostrando seu altruísmo, aqui ela não faz o mesmo, sem pensar que não apenas ela não estava vivendo a própria vida, mas que estava roubando a da sua contraparte nesse universo paralelo – a mesma coisa acontece com a sugestão dela na cena extra do filme, transformando a personagem em alguém vingativo apenas por graça.
Além da falta da técnica que fez o primeiro filme interessante – como quando na segunda ressurreição as trilhas sonoras se sobrepõem mostrando a estranheza da situação – A Morte te dá Parabéns 2 é altamente questionável no campo ético. Nesse mundo em que vivemos, onde o suicídio é algo real e tangível, fazer graça disso é, no mínimo, uma piada de mau gosto. Cada vez que Tree tira a própria vida, embalada por uma trilha sonora pop como um videoclipe para adolescentes e com um sorriso no rosto, pode parecer engraçado à primeira vista, e isso nos diz muito enquanto sociedade. E se levarmos em conta que a taxa de suicídio entre jovens subiu de modo alarmante desde 2002, e que são os mais jovens o público-alvo do filme, fica a discussão do tipo de desserviço que a produção se tornou.
Elenco
Jessica Rothe
Israel Broussard
Phi Vu
Rachel Matthews
Suraj Sharma
Sarah Yarkin
Ruby Modine
Direção
Christopher Landon (Como Sobreviver a um Ataque Zumbi)
Roteiro
Christopher Landon
Fotografia
Toby Oliver
Trilha Sonora
Bear McCreary
Montagem
Ben Baudhuin
País
Estados Unidos
Distribuição
Universal Pictures
Duração
100 minutes
Data de estreia
21/fev/2019
Cena Extra
Tree pensou que estava livre da maldição que a jogou no loop de seu aniversário onde era assassinada uma vez atrás da outra pelo assassino com máscara de bebe. Mas um novo evento a fará revisitar a maldição outra vez.
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