O Artista (The Artist, 2011, França) [Crítica]
Com Jean Dujardin, Bérénice Bejo, Uggie, John Goodman e James Cromwell. Escrito e dirigido por Michel Hazanavicius (Agente 117 – Uma Aventura no Cairo).
Não perca este filme de cinema. De verdade, é uma grande homenagem ao cinema. Todo o cuidado com para parecer que foi feito na época, a metalinguagem empregada enquanto vimos filmes dentro do filme e a coragem de fazê-lo mudo e comercial (porque filmes mudos em si não deixaram de ser produzidos), fazem de “O Artista” um dos melhores de 2011. A comédia romântica tem todos as boas peculiaridades de um grande filme, alternando momentos de riso, de doçura e de pequenos dramas, assim como é a vida.
Eu tento me abster de sinopses e trailers de filmes antes de vê-los. Não fujo deles, mas os evito. Só tinha visto o de “O Artista” uma vez, e não me lembrava. Por isso, tinha uma preocupação com o aspect ratio do filme. Mas tudo mudou quando vi que Hazanavicius utilizou o formato do cinema clássico standard, o 1.33:1. Também deu uma leve diminuída nos quadros do filme, usando 22 por segundo (não é do cinema do começo do século XX, nem o de hoje, que são 24). Sem falar do visual dos créditos, anunciando todos de uma vez, como era próprio do período. Falando de homenagens, ainda vemos nos primeiros momentos “citações” à Orson Welles, com uma cena em especial que saiu sem dúvida de “Cidadão Kane” (Citizen Kane, 1940), numa certa tensão entre um casal.
George Valentim (Dujardin) é aquele ator clássico dos filmes mudos, um tanto exibicionista e cheio de expressões faciais para passar suas reações sem falas. Apesar de começar com uma pequena arrogância, a imagem se desfaz logo, ao dar aplausos para o seu cachorro Jack (Uggie) que contracena com o dono nos filmes. Esse sim um animalzinho que valeu a pena dar atenção, diferente de um certo ganso de Spileberg. E a nossa heroína é Peppy Miller (Bérénice), que entra por acidente na vida de George. Mas assim são os anjos. Tanto que a segunda vez que se encontram ela está escondida atrás de um painel pintado do céu com nuvens. É interessante notar que enquanto o tempo vai passando, Peppy vai subindo dentro dos créditos dos filmes. Enquanto isso, Valentim recebe a notícia do futuro do universo falado. A cena que mostra a angústia, o medo e a percepção desse novo cenário é uma das melhores partes do filme.
A partir daí, Peppy cresce enquanto Valentim cai. Isso é poéticamente reforçado na cena em que os dois se reencontram mais uma vez, mas agora ela está em ascensão, nas escadarias do estúdio, onde ela fica num patamar acima. Outras situações de reforço seguem. Valentim se recusa duplamente a falar. Numa cena em em restaurante, a fotografia separa Valentim de Peppy, com um tom mais escuro, com menos brilho e com um personagem cabisbaixo. E Valentim desce mais, passando por maus momentos na economia dos EUA, e o fim iminente do cinema mudo (representado por um cena em especial do último filme de Valentim) e o crescimento de Peppy e o filme falado ao gosto do público, numa certa cena em que o painel gigante é apresentado.
A projeção continua com mais algumas peças de drama que falta para fazer um filme completo. Cenas angustiantes fora do ângulo, o tornar-se invisível (por duas vezes, um real e outra metafísica), o orgulho e teimosia de Valentim e a cena principal de Jack, ele desesperado também. E um “BANG”! [SPOILERS] A cena do cachorrinho tentando salvar a vida do dono, logo seguida da aparição da salvadora Peppy. Lembrem-se que um pouco antes ela participou de um filme chamado “Anjo da Guarda”.[FIM DOS SPOILERS]
A atenção dada aos detalhes dão mais brilho ao filme. Passando pelos cenários (notem o “Hollywoodland”), os carros, maquiagem e o figurino criam um belo filme. Pode não ser original, mas o ótimo roteiro, cheio de risos e momentos doces, a fotografia impecável de Guillaume Schiffman, e as homenagens do início do cinema é sinônimo de emoção.