Julieta | Crítica | Julieta, 2016, Espanha
Em Julieta, Almodóvar volta a dar força ao papel da mulher, dessa vez focando no duro trabalho que é ser mãe.
Com Emma Suárez, Adriana Ugarte, Sara Jiménez, Priscilla Delgado, Rossy de Palma, Michelle Jenner, Inma Cuesta, Darío Grandinetti e Daniel Grao. Roteirizado por Pedro Almodóvar, baseado na obra de Alice Munro. Dirigido por Pedro Almodóvar (A Pele que Habito).
De volta para mostrar a força de uma mulher, Julieta é uma homenagem ao papel de mãe e uma luta contra a letargia do luto e o peso da idade. Numa sociedade que o envelhecimento da mulher é visto como algo proibido – no cinema isso é bem claro quando uma atriz de 30 anos seria velha demais para ser par romântico de um cinquentão – Almodóvar trabalha delicadamente com o tema, ainda que se perca na construção da narrativa. O começo da história é muito interessante, e a conclusão marcante, mesmo que irrite parte da plateia. O grande problema fica entre esses pontos, onde a jornada não foi tão interessante quanto o desfecho.
Julieta (Suárez) é cercada de signos em seu apartamento. Há um sensual veludo vermelho que nas suas dobras lembra um clitóris e ainda nesse primeiro momento ela embala uma figura com um falo proeminente. Mas a ainda elegante senhora teme o peso da idade, representado por outros elementos no lugar onde mora: um livro intitulado “The Old Woman” e a pintura de uma pessoa idosa são parte desse conflito que faz parte da personalidade da protagonista. Seu segredo está oculto naquela organização toda, e é preciso apenas um esbarrão para que o castelo de cartas desabasse e mostrasse que, apesar da sua força, ainda existe fragilidade dentro dela.
Por meio de cartas que escreve para a filha desaparecida há anos, Julieta revisita sua versão jovem (Ugarte), uma pessoa decidida, com um visual mais rebelde – típico dos anos 1980, mas os cabelos curtos e espetados reforçam essa personalidade – e que não teme o julgamento da sociedade por se entregar a um homem subitamente. Assim como Ulisses, um paralelo que a personagem faz nas suas leituras, Julieta navega, desbravando novos lugares e pessoas enquanto procura por sua Ítaca, primeiro no esposo e depois na filha, Antía (Delgado/Parés). Entre passado e presente, Almodóvar e a figurinista Sonia Grande usam cores diferentes para representar o astral da protagonista. Quando jovem, são predominantes os azuis, para representar a segurança – além de evocar o mar – e no presente, o vinho toma conta, uma cor no espectro oposto.
O problema da narrativa é que nesse meio tempo, Almodóvar não consegue prender a atenção. É um marasmo que representa a inabilidade de Julieta em aceitar a morte do esposo – se culpando em parte por isso – mas poderia ter sido encurtada em prol do ritmo. Há também a questão do sumiço de Antía. Não é questão dos motivos, mas como ele faz, de maneira nada crível. Uma pessoa que sofre tanto calada teria sumido antes, e por mais que a depressão de Julieta não a deixasse perceber como é a filha, Almodóvar não nos dá nenhuma pista durante a história que a jovem tem um peso enorme. É preciso um flashback semi-explicativo para isso, o que é bem desonesto do diretor.
Longe de seus grandes trabalhos, o diretor joga luz sobre aspectos da maternidade que não estamos acostumados – não aquela propaganda de margarina onde ser mãe é a melhor coisa do mundo – ao mesmo tempo em que enaltece o papel matriarcal, um ser que pode ser tão amoroso ao ponto de perdoar mesmo sem saber o que se está perdoando. O desfecho de Julieta não atenderá as expectativas da plateia, por ser aberto demais. Mas pense que o espanhol queria falar sobre um amor incondicional, aquele que talvez só quem é mãe saiba expressar.
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Sinopse oficial
“Julieta vive em Madri com sua filha Antía. Ambas sofrem em silêncio por conta da perda de Xoan, pai de Antía e marido de Julieta. Mas, quando a dor não aproxima as pessoas, ela separa. Quando Antía completa dezoito anos, ela abandona a mãe sem dar explicações. Julieta procura por ela de todas as maneiras, mas apenas descobre o quão pouco conhece sobre sua filha. JULIETA fala sobre a luta de uma mãe que vive uma incerteza. Mas fala também sobre destino, complexo de culpa e o mistério que nos leva a abandonar pessoas que amamos, a deletar pessoas de nossas vidas como se elas nunca tivessem representado nada, como se elas nunca tivessem existido”.
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