Branca de Neve e o Caçador | Crítica | Snow White and the Huntsman, 2012, EUA
Branca de Neve e o Caçador é uma miscelânea de outros filmes fantasia, portanto sem identidade nenhuma.
Com Kristen Stewart, Charlize Theron, Chris Hemsworth, Sam Claflin, Ian McShane, Bob Hoskins e Toby Jones. Roteirizado por Evan Daugherty, John Lee Hancock e Hossein Amini (Drive). Dirigido por Rupert Sanders.
Chegando ao final do filme, disse para mim mesmo que gostei da versão moderna do clássico dos Irmãos Grimm. Mas analisando algumas horas depois, cheguei à conclusão do que me fez gostar mais da história foram os elementos que já foram usados em tantos outros filmes épicos e de aventura, principalmente em “O Senhor dos Aneis” e “As Crônicas de Nárnia“. O bom elenco é desperdiçado pela pouca presença na tela, a motivação da vilã é confusa e a atriz principal não tem carisma nenhuma. Pecando em aspectos técnicos, como no excesso de slow-motions, e pontos da narrativa, “Branca de Neve e o Caçador” é um filme que por muito pouco não escapa da borda de ser um bom entretenimento. Além disso, preciso apontar o óbvio que Kristen Stewart não tem nada de mais bela que Charlize Theron?
O filme começa com uma narrativa off, servindo como background daquele universo fantasioso, e aí Sanders já mostra sua falta de experiência na direção, usando a técnica de uma maneira longa e desnecessária. A proposta da escuridão que vai tomando conta do cenário na fotografia e no figurino da Rainha Ravena (Theron) e do exército inimigo que se posiciona numa parte queimada e morta da floresta são uma das melhores partes visuais do filme. Mas a miscelânea de roteiristas, onde Daugherty escreveu o original, para ser reescrito por Hancock e Amini, falha em fazer um universo a parte, ao tentar ligar um mundo de fantasia (dominado por seres fantásticos e mágicos), com o nosso, simbolizado pela oração do “Pai Nosso” que Branca de Neve (Stewart) faz, e um canto gregoriano mais pra frente (mas que vodu é aquele com os bonecos?) Os elementos não encaixam. E no momento que a princesa escapa de sua cela, a história acerta em cegar por um momento a personagem, e a nós também, por encarar o sol. Mas logo depois consegue escapar pela latrina do castelo com um movimento de parkour, nadar em mar aberto e cavalgar (nem vou citar que os pássaros não teriam tempo hábil pra chamar o cavalo) muito competentemente, apesar de estar presa em uma cela por, pelo menos, dez anos. Na fuga da princesa passamos por um vilarejo (que é longe do castelo e parece ser o único “povo” do Reino de Ravena), que tem elementos melancólicos, com olhares desconfiados dos moradores, se vestindo com trapos e com algumas gaiolas com esqueletos.
Ao apresentar o Caçador (Hemsworth), o diretor tenta distanciá-lo de Thor, mostrando o heroi da história (não é à toa que o nome dele está no título) sujo e bêbado. Louvável esforço, mas a voz de trovão do ator nos remete ao personagem do deus nórdico. O filme continua a apresentar a rainha como a personificação do mal. Para reforçar isso, a coroa dela continua a ficar mais escura e ela se senta num trono com figuras macabras, constantemente cercada por corvos e furtiva, ao propor ao Caçador que capture Branca de Neve em troca da ressurreição da esposa morta. Em outra tentativa de dar mais profundidade à personagem de Ravena, o time do filme mostra cenas dela chorando, para não deixá-la cair maniqueísmo. Mais uma vez, o efeito é muito pouco palpável. Num flashback interessante, onde o diretor de fotografia Greig Fraser, que trabalhou em “Deixe-me Entrar” (Let Me In, 2010), usa um branco saturado para mostrar que a Rainha já foi pura e inocente, em oposição a sua personalidade atual. “Vingue-nos”, diz a mãe de Ravena nas suas memórias. Mas vingar-se de quem? De um povo, dos homens? E se o poder absoluto corrompeu a Rainha absolutamente, a razão para o choro dela não se sustenta, considerando que ela não se importa de tirar vidas de mulheres para rejuvenescer. Aponto que o trabalho de maquiagem para envelhecer a personagem de Charlize Theron é muito bem feito, e é interessante como a face quase cadavérica remete mais uma vez à morte.
Também conhecemos uma tribo só de mulheres, que se desfiguram para não atrair a atenção da Rainha, apesar do autoflagelo ser bem sutil. Mas notem que as cicatrizes tomam a direção como se fossem lágrimas que desceram pelo rosto. Esse santuário não dura muito tempo, e o Caçador e Branca de Neve tem que fugir mais uma vez. Existe um confronto entre um troll e os dois, com a princesa apaziguando o monstro só com o olhar, mas é outra questão não desenvolvida, porque passamos de mais da metade do filme. E é aí que conhecemos os oito (oito?) anões. De longe, o melhor grupo do filme. É uma pena que esses personagens que são desconfiados e ao mesmo tempo divertidos apareçam só a partir deste momento, e tenham que dividir a tela com fadas, e um cervo com grandes chifres que “abençoa” Branca de Neve (e o que é aquela criatura e por que é tão importante assim não é explicado, porque falta menos de uma hora pro filme acabar e ainda temos que reconquistar um reino). Esse é um interlúdio doce, e que dá vontade de conhecer melhor esses personagens que se assemelham mais aos anões tolkianos do que os da versão da Disney da história. Beith (McShane), Muir (Hoskins), Coll (Jones) e outros de sua raça são unidos como família e amigos, além de serem corajosos e mantém a pose quando precisam (um deles insinua que mataria Branca de Neve se fosse preciso, mas antes de saber da importância dela). A parte na floresta das fadas é brindada com o talento musical dos anões, que é característica de muitas criaturas lendárias além deles (elfos, por exemplo). Depois de um momento triste, um antigo amigo da princesa se junta ao grupo: o arqueiro-príncipe William (Claflin), que estava disfarçado com o grupo que caçava Branca de Neve e o Caçador para ajudar a amiga. Tenho que apontar que no ápice da história, quando Branca de Neve é envenenada, os roteiristas usam de uma subversão, brincando com o nosso conhecimento da história clássica. Ponto positivo aqui.
Há outros elementos visuais na história que tem destaque na tela, como a direção de arte mostrando os anões bem baixos, apesar de seus atores não serem, um travelling vertical quando um dos personagens morre (mas que é repetido logo na cena seguinte, sem necessidade) e os figurinos das personagens principais (Branca de Neve se veste no estilo “Disney”, mas com tons bem mais sombrios, enquanto a progressão da escuridão de Ravena se reflete até nas pedras de sua coroa) . Fora isso, todos os outros elementos já foram usados antes, e o diretor não usou bem do clichê. O ponto final é precisamente no última cena, num longo e até constrangedor plano, que parecia interminável, dando a impressão que só faltava os atores virarem para a câmera e dizer “e aí, não vai acabar”? Além de alguns erros de montagem, sendo o mais difícil de entender da luta final entre Branca de Neve e Ravena e a questão dos limites dos poderes da personagem (curando uns e outros não), “Branca de Neve e o Caçador” não é um filme que ficará na memória por muito tempo, culminando na péssima atuação de Kristen Stewart, sem carisma e que não passa nenhuma simpatia, com sorrisos e olhares nada naturais.