Boneco de Neve | Crítica | The Snowman, 2017
Boneco de Neve é um exemplo menor do gênero, além de ser apressado no seu desenvolvimento.
Para quem está acostumado com filmes de suspense e mistério, Boneco de Neve aparece como um exemplo tolo. Para aqueles não tão iniciados no gênero, a confusão fica mais pela maneira que Tomas Alfredson monta o tabuleiro do que pelo mistério em si. Apesar de introduzir bem as motivações do assassino no começo da trama, todo o resto apressa-se em resolvê-la com grandes conveniências e personagens esquecidos e com situações que não fazem o menor sentido numa produção que confunde o confundir com a desonestidade para o espectador que parece ser jogado numa nevasca sem nenhum ponto de apoio.
Depois de uma interessante introdução que coloca as peças em movimento e mostra as motivações do assassino quando ainda era criança, numa maré de violência, abuso e abandono, a trama pula muitos anos para nos apresentar Harry Hole (Fassbender) – apesar de ser novo no cinema, nos livros essa já é a sétima desventura do detetive. A construção do personagem também funciona nos primeiros momentos, pois a estrutura apela para seu lado mais humano, com problemas com bebida (que traz uma cena que poderia ser classificada como comédia quando ele erra um tiro), um relacionamento problemático, em oposição ao seu brilhantismo como investigador, mimetizando outros mais famosos como Hercule Poirot e Sherlock Holmes.
Sabemos que o personagem tem um passado extenso quando a novata Katrine Bratt (Fergunson) diz que ele é objeto de estudo na academia de polícia norueguesa, o que o coloca como uma lenda em Oslo. Por isso é difícil acreditar que o detetive demore para achar estranho o recebimento de uma carta com letras infantis, sem remetente e com o desenho do boneco de neve. Poderíamos dizer que é culpa da bebida, a grande fraqueza do personagem, mas ele é alguém que eventualmente supera isso (bem rápido, na verdade). Ele é um personagem focado o suficiente, mas, assim como Holmes, esquece de fatos irrelevantes para a investigação, um dos motivos da relação problemática com a ex-namorada Rakel (Gainsbourg) e o filho dela, que Harry trata como um filho.
O que acontece é que a narrativa claramente tem partes faltando, conveniências e não explica como o assassino consegue acesso a Harry. Chegamos à conclusão por ele ser um detetive famoso, mas o estranho é porque o criminoso o escolheu para tentar capturá-lo. Muitos assassinos seriais do gênero pecam pela soberba, é verdade. Porém, assim que a história se conclui fica claro que as peças só se encaixam se forçarmos muito – e ainda assim, teremos buracos. Não é uma questão de suspensão de descrença, é uma tentativa desonesta de enganar o espectador – apesar de que o diretor ter declarado que, por causa da agenda curta, 10 a 15% do roteiro não foi filmado.
Isso não desculpa as partes ridículas da trama, como todo o arco de centrado em Arve Stop (Simmons), que só existe para pô-lo em contraponto à Harry como um cretino de marca maior. Em nenhum momento ele é um suspeito viável, algo que cai mais para o personagem Idar Vetlesen (Dencick). Mas mesmo quem aceite que o filantropo é digno de ser seguido de perto por causa de um passado ligado a outro assassinato quase dez anos antes, é difícil entender como uma personagem feminina se encaixa na trama a não ser, de novo pela conveniência, quando ela dá acesso à Katrine à festa que Stop era o anfitrião, sendo que as duas não criaram nenhuma relação antes.
O filme também conta com partes ridículas e um mau cuidado com o roteiro de causar espanto. Quando fica bem claro para Harry e Katrine que lidam com um assassino em série, o detetive pede ao seu superior autorização para montar um pequeno time de investigação – time inócuo, aliás. O chefe de Harry pergunta se houve mortes, que responde não. Mas isso é mentira, pois os dois tinham acabado de voltar de uma cena de assassinato. O mais esquizofrênico é que no diálogo seguinte Harry diz sim que alguém tinha morrido. A única coisa que faz sentido é o motivo de Katrine esconder detalhes cruciais para a investigação.
A divisão da narrativa em duas partes também não ajuda no ritmo do filme, pelo menos não da maneira que foi colocada. Quando conhecemos Rafto (Kilmer) ele serve um tanto de mentor espiritual de Harry – inclusive na questão da bebida. Mas, de novo por causa da pressa, o arco dele acaba bruscamente, sem termos tempo de acompanhar o raciocínio de Harry que fecha o caso do detetive que anos antes também estava perto de descobrir a identidade do assassino do Boneco de Neve. Mas, de novo, sem entendermos com aconteceu o pulou de um passo para o outro.
Há casos que filmes cansam quando se estendem demais e outros que claramente precisam de mais alguns minutos para se fechar, caso de Boneco de Neve. Há sim um potencial na história desse ser perturbado que tem um padrão como outros assassinos seriais, mas que deixa para lá esse padrão naquela que seria sua última vítima. Porém, mesmo com os problemas que envolvem a produção, fica a impressão que o material original também não ajudou. Comparar o livro não é tarefa da crítica de cinema, mas o que fica no ar é uma das máximas dessa arte: um mau diretor pode até entregar um bom filme se o roteiro também for, mas dificilmente um roteiro ruim é salvo por um bom diretor.
Elenco
Michael Fassbender
Rebecca Ferguson
Charlotte Gainsbourg
Val Kilmer
J. K. Simmons
Toby Jones
David Dencik
Direção
Tomas Alfredson (Deixa Ela Entrar)
Roteiro
Hossein Amini
Peter Straughan
Søren Sveistrup
Baseado em
Boneco de Neve (Jo Nesbø)
Fotografia
Dion Beebe
Trilha Sonora
Marco Beltrami
Montagem
Claire Simpson
Thelma Schoonmaker
País
Reino Unido
Distribuição
Universal Pictures
Duração
119 minutos
Harry Hole começa a investigar o desaparecimento de uma jovem mãe quando cai a primeira neve em Oslo e novas pistas mostram que esse é o trabalho de assassino em série. Com a ajuda de Katrine, uma recruta recém-saída da academia, Hole terá que desvendar o mistério com pistas de uma década atrás antes que o assassino ataque novamente.
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