A Garota Dinamarquesa | Crítica | The Danish Girl, 2015, EUA

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A Garota Dinamarquesa, o novo filme do diretor de Os Miseráveis, peca por parecer documental demais. Mas traz um tema necessário.

A Garota Dinamarquesa (2015)

Com Eddie Redmayne, Alicia Vikander, Matthias Schoenaerts, Ben Whishaw e Sebastian Koch, Amber Heard. Roteirizado por Lucinda Coxon, baseado na obra de David Ebershoff. Dirigido por Tom Hooper (Os Miseráveis).

6/10 - "tem um Tigre no cinema"Tom Hooper é tão aficionado em contar histórias baseadas em fatos reais – como percebemos em três dos seus filmes – que em A Garota Dinamarquesa esqueceu de estar fazendo um filme. É uma história necessária para esses tempos de representatividade, sem sombra de dúvida. Mas é importante nos questionarmos a maneira que a história pioneira sobre uma transgênero chegou até nós. Há momentos belos, de dor e dúvida na trajetória da dupla de protagonistas, o que justificava um tom menos histórico e mais poético. Todos os elementos estavam lá, e é uma pena que o diretor preferiu não os usar.

O próprio Einer (Redmayne) tem essa visão mais artística e introspectiva – apesar do uso extremamente fútil dessa palavra – por meio de seus quadros que representam um pedaço de seu passado, algo que ele tenta desesperadamente vivenciar mais uma vez. Eis o significado dos inúmeros quadros de paisagem. Em geral, o filme apresenta com competência essa fixação de Einer por se encontrar, seja pelos quadros ou pelos reflexos por janelas e espelhos ou ainda pelo modo que o pintor toca nas roupas femininas de um teatro.

Gerda (Vikander) tem alguns paralelos com seu marido, mas, assim como Einer é (ou será) ela está fora dos padrões de sua época. No começo dos anos 1920 ela era uma mulher com atitude, dona de uma voz poderosa e firme – há uma cena bem divertida quando ela dá a ordem à cachorrinha da família de sentar, mas o seu modelo que acata a ordem – e cheia de iniciativa em vários sentidos, ela e Einer se completam como um Yin-yang. Cada um completando uma metade, mas sem ter totalmente um padrão masculino ou feminino. Ao invés de ser algo repentino na trama, Coxon insere elementos que a primeira luz não pertence aos gêneros pré-estabelecidos, mas que estão lá desde sempre na dupla.

O trabalho de maquiagem e fotografia é soberbo na passagem de Einer para Lili. Com sutilezas que vão desde da pintura que Gerda faz no seu esposo – e com o detalhe dele passar lápis nos olhos e ouvir dela que saiu perfeito – e a luz que ilumina a face durante a noite já dão um ar feminino no então Einer. Outras partes são mais literais e didáticas como no momento que ele usa uma camisola dela quando vão para a cama. E é curioso ver como os papéis se invertem quando Hopper faz com que Gerda fique em cima de Einer quando o contrário é tomado como o padrão.

Há outros momentos que a poesia parecia a caminho de tomar conta da narrativa. Em sua primeira aventura como mulher, a recém-transformada Lili é beijada pelo galanteador Henrik (Whishaw) e, num momento inesperado, sangra. O signo é bem claro, ainda que passe despercebido. No primeiro beijo de sua vida adulta ela desabrocha e podemos interpretar isso como a primeira menstruação da sua vida – e se você quiser ir um pouco mais a fundo, poderíamos até dizer que foi a primeira vez que ela foi penetrada. A partir daí existem outras cenas que vão trazendo à tona o verdadeiro eu de Einer e a várias peculiaridades de ser uma mulher.

Os problemas, porém, já começam na metade do segundo ato. A decisão radical da agora Lili passou por problemas emocionais que colocam na trama um antigo amigo da infância do outrora Einer. Nisso o filme se arrasta por mais 45 minutos pelo menos com idas e vindas por procuras por médicos e pesquisas próprias para que Lili entenda a sua situação. Mas há de destacar, pelo menos, uma cena marcante que envolve violência contra a transexual, algo que é um reflexo assustador da nossa época. Ainda que tenha se passado quase um século, não é raro sabermos de ataques à homossexuais e homens e mulheres trans, seja na vida real ou no virtual.

Já no começo do terceiro ato é que o filme perde a razão de ser. Essa não é uma história conhecida por muitos, e entende-se a posição do diretor e responsáveis. Mas a produção é baseada num livro, que por sua vez é baseado no diário da própria Lili. Então não serve, pelo menos no quesito dramático, a continuação da jornada da personagem. Quando Lili se despede de Gerda na estação seria o melhor momento de terminar o filme. Ele seria mais poético e menos burocrático. Mas, por essa ânsia de querer contar a história até o fim, se vão mais 30 minutos de narrativa arrastada. E só há um momento marcante nesse ato, que é quando Lili e Gerda estão juntas no jardim do hospital e o diretor usa uma lente grande angular para mostrar que a visão de mundo delas expandiu.

Existe um discurso e existe necessidade na história da transformação – ou melhor dizendo descoberta – de Lili. É uma pena que Tom Hooper optou em A Garota Dinamarquesa por contar uma história tão interessante de maneira tão desprovida de graça, ao contrário da própria Lili. O diretor se conteve no uso de ângulos holandeses, mas parece apenas servir de assinatura visual do que validade narrativa. A emoção que reinou por metade do filme deu lugar a um tipo de necessidade de validá-la com todas as informações possíveis, transformando a produção quase num documentário. Aparentemente, o diretor se esqueceu que nem sempre precisamos saber de tudo e que focar naquilo que é importante é mais importante que sabermos a verdade em si. Pelo menos dentro do cinema.

Sinopse oficial
O casamento e a obra de Lili e Gerda nos envolvem na importante jornada de Lili como pioneira transgênero.”

A Garota Dinamarquesa | Pôster brasileiro

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".