Mesmo se Nada der Certo | Crítica | Begin Again, 2014, EUA

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Mesmo se Nada der Certo é um belo filme hollywoodiano, mas com alma indie, e cheio de amor pela música.

Begin Again, 2014

Com Keira Knightley, Mark Ruffalo, Adam Levine, Hailee Steinfeld, James Corden, CeeLo Green, Mos Def e Catherine Keener. Roteirizado e dirigido por John Carney (Once – Apenas Uma Vez).

10/10 - "tem um Tigre no cinema"Ao ver um casal no pôster de Mesmo se Nada der Certo, você pode chegar à conclusão de que esse é um filme tipicamente romântico. No entanto, o elemento mais poderoso, e que se destaca no clima cálido da imagem, é um violão dentro de um case preto. Mais do que ser sobre a música em si, John Carney encarna mais uma vez na tela o nascimento dela, entre aqueles que gostam de ouvir e sabem fazer. Esse é um filme tão cheio de graça e tão simpático que dá vontade de ver várias vezes.

Dan Mulligan (Ruffalo) está passando por problemas familiares – com a separação da esposa – e no trabalho como produtor de uma gravadora – já que não emplaca um sucesso em anos. É quando ele conhece Gretta (Knightley) tocando nas noites de Nova York e tem certeza que, com a ajuda certa, pode transformá-la num sucesso. Ela, no entanto, não quer trair seus princípios. Os dois então começam uma jornada para fazer algo real e diferente e que valha a pena ser gravado e compartilhado.

Intimista, Carney usa de uma câmera menos estável para entendermos melhor o que os personagens passam, e por isso há a liberdade de filmar o personagem Dan apenas de cuecas. Ao notarmos a garrafa de uísque do lado da cama, e a situação dos pés encardidos, o diretor já nos informa apenas com o passeio dessa câmera que Dan não está num bom momento. O background se completa quando o diretor fecha a câmera no retrovisor e vemos um plugue de ouvido junto com um crucifixo: para Dan, música é uma religião.

Apesar dos tons dramáticos que tanto Dan quanto Gretta passam, esse é um filme muito pra cima. É impossível segurar o sorriso quando acompanhamos o produtor em seu carro ouvindo uma demo atrás da outra e suas reclamações. E quanto à Gretta, existe uma empatia logo de cara, quando entendemos a canção que toca para apenas alguns que prestam atenção num barzinho, e no que aquela letra representa. Essa procura de Gretta por criar que vai nos fazer acompanhar com afinco a história.

Carney conta a história dos personagens por alguns flashbacks. E ainda que esse recurso seja simples, ele é justificado na narrativa e faz parte dela. Além disso, é usada de maneira incomum. Ainda no primeiro ato, quando Dan está ouvindo Gretta cantar no bar, é para mostrar a visão dele como produtor e a música ganha corpo: um piano, um violino, metais, percussão. Se não fosse assim, não perceberíamos como Dan é visionário.

As outras duas cenas são protagonizadas por Gretta e pelo ex-namorado Dave Kohl (Levine). As memórias dela são revividas por uma gravação de celular, e por uma gravação em câmera: a chegada dos dois em Nova York – onde Dave acabou de alcançar o sucesso comercial, mas traí a namorada – e quando ainda moravam em apartamento pequeno, numa situação oposta ao flashback anterior. E vemos um piano, a janela e a porta da entrada, mostrando que só havia espaço para eles e a música, um aperto reforçado pelo clima invernal do lado de fora.

A trama é cheia de personagens interessantes pelos quais os personagens principais se movimentam – de um jeito ou de outro. Violet (Steinfeld), filha de Dan, está perdida com a separação do pai e de Miriam (Keener), sua ex-esposa, mas encontra na música uma ponte para liga-los mais uma vez. O jeito bonachão e amigo para qualquer hora de Steve (Corden) mostra alguém que merece confiança. Até personagens menores, como Trouble Gum (Green) – que de tão rico tem um beatbox particular – ganham destaque numa mistura que, fatalmente, irá se transformar em música. É a colaboração entre momentos e pessoas que fazem essa mágica se traduzir em sons.

Seria injusto resumir o filme em poucas palavras. Mas se fosse necessário, uma delas seria contagiante. A história começa com muitas cenas noturnas, que passam a ser diurnas para capturar o alto-astral que a música que está sendo criada. E quando o cenário é noturno, ele acontece no topo de um edifício. Tudo para mostrar que a música eleva o espírito.

Claro que uma produção dessas precisava de uma trilha sonora. E ela acompanha a qualidade do filme (e não, não custa apenas U$1). Lost Stars, Tell Me If You Wanna Go Home, Like a Fool, Coming Up Roses e A Step You Can’t Take Back devem fazer parte da sua playlist. Afinal, como diz Gretta, você sabe muito de uma pessoa pelas músicas que ela tem no celular (ou no tocador de mp3).

Esse também é um filme romântico, mas não como você está acostumado. A maior prova disso é a entrega que Gretta. Acostumado com sucesso, Dave transforma a música que ganhou dela de presente de Natal enquanto ainda eram namorados – Lost Stars –, que era calma e intimista, em um hino pop para adolescentes. E a única coisa que ela pede ao ex no filme todo – fugindo do clichê volte para mim – é que ele mantenha o espírito da música. E ele não consegue, o que faz os dois se afastar definitivamente.

Mesmo se Nada der Certo | Pôster brasileiro

Mesmo se Nada der Certo e uma homenagem à criação da música e à metrópole. Para quem gosta disso, é um prato cheio. E mistura piadas com momentos sérios e belos. Como bônus, tem o melhor product placement – só que ao contrário – que vi em anos: uma piada envolvendo uma Pepsi e a tentativa de Dan parar de beber. São pequenos e belos momentos que trouxeram uma pergunta muito importante. Será que somos estrelas perdidas, tentando iluminar a escuridão? Fascinante e poético, esse é um dos melhores filmes do ano.

Veja o trailer de Mesmo se Nada der Certo

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".