Todo o Dinheiro do Mundo | Crítica | All the Money in the World, 2017
Todo o Dinheiro do Mundo tem o mal de uma série de cinebiografias, que é apresentar uma história interessante num filme que não é tanto assim.
Mesmo que Todo Dinheiro do Mundo não fosse marcado como o filme que Kevin Spacey foi limado, ainda assim ele seria uma produção com problemas. Longe da profundidade de outros de seus dramas, Ridley Scott sai do mundo de monstros espaciais para focar novamente naqueles que aparentam ser como nós. Poderíamos até fazer um paralelo do lingafoeda archeronsis, pois um dos personagens diz que ser um Getty é parecer conosco – se levarmos em conta que o xenoformo se esconde em nós. É um drama com o mais antigo motivo do mundo: não o dinheiro em si, mas o poder. Afinal, no fim das contas, quem lucra?
Essa introdução soturna pode aparentar que a produção é menos interessante que parece. A questão mais intrigante da trama do sequestro do jovem Paul (Plummer) é ser uma história interessante dentro de uma narrativa nem tão atraente assim, algo que seria resolvido se a produção não adotasse ilusões de grandeza como a própria representação do Sr Getty (Plummer) – que não apenas quer ser rico e poderoso, ele sonha com um passado grande desde vidas passadas. Com mais de 120 minutos, determinado momento você começa a procurar posições mais confortáveis na cadeira, depois de tantos flashbacks e a repetição que o patriarca não está disposto a pagar o resgate do neto.
É algo reforçado pela fotografia de Dariusz Wolski onde, sob a tutela de Scott, coloca Getty sempre em cenários frios, alguns com neve inclusive – em oposição ao momento que o bilionário descobre de onde tirará sua riqueza – para não nos esquecermos que aquele é um homem com coração gelado. Pelo menos é uma característica sensata, do ponto de vista do magnata, e bem no estilo “não negociamos com terroristas“. O que é proposto por Scott é que esse é um personagem mais complexo, confessando secretamente ao funcionário Fletcher (Whalbergh) que teme pela vida do neto. Então, é tudo sobre poder. O empresário nunca poderia ceder, pois isso mostraria fraqueza aos algozes de Paul.
Porém, o fiel da balança é sempre o personagem mais próximo da maioria da plateia, aqui Gail (Williams). A mãe do jovem Paul, mesmo desesperada, mostra uma resiliência digna da aparência do sogro, mas lutando e sofrendo. Sem alguém para dividir sua dor, pois seu marido é quase um vegetal, a mãe é a síntese de que é ser esmagado por dois mundos, ambos que ali ela não pertencia: ela não é uma Getty por ser apenas, com grandes aspas, ex-esposa de um deles, mas no ponto de vista de Cinquanta (Duris) ela carrega essa marca. Ela é uma ligação entre esses mundos, ser e não ser, e só mesmo um elo forte poderia aguentar essa pressão.
O incomoda no contar da história, além da duração além do necessário, são elementos colocados, mas não resolvidos. Por exemplo, a narração off de Paul no começo serve, na visão desse personagem, para que o espectador perdoe a família Getty. Não fica claro o que ele quis dizer com isso – ao menos não se justifica durante todas as próximas duas horas. Há coisas menores, como os irmãos de Paul praticamente desaparecem da história sem um bom motivo – quando ele ainda era criança e conhece o avô, por exemplo. Eventualmente, esses irmãos são enfiados no filme, por assim dizer, para dizer que eles ainda estão por lá.
Também é difícil entender porque em certos momentos Getty é tratado de maneira tão complexa e outras vezes de maneira tão bidimensional. São cenas que, em geral, servem para esticar a narrativa. Já estava bem estabelecido que o empresário não queria gastar seu dinheiro – algo que tem um motivo explicado perto do fim – para salvar Paul, mas para continuar reforçando que o bilionário era alguém com uma personalidade quase macabra, a história apela para interações pedestres, como a discussão sobre o dinheiro do resgate com Fletcher enquanto abre um champanhe. São pequenos momentos, aqui e ali, que se fossem tirados ajudariam demais no andar da trama.
Porém, para quem não conhece a história, cada virada é uma tensão. Nos conectamos com Paul por ser mais jovem, inocente ao ponto de não dar ouvidos às prostitutas das ruas de Roma – quantas pessoas poderiam se dizer menos experientes que elas – e ao sentimento de impotência de Gail por podermos fazer tanto quanto ela na posição que se encontra, sem o apoio que ela acreditava precisar de Getty. Sendo assim, nos encontramos odiando essa pessoa, alguém que poderia investir mais seus recursos para salvar o neto – pois o magnata não se importa em utilizar métodos escusos para adquirir uma pintura, mas não faz o mesmo para garantir a segurança do jovem sequestrado.
Todo Dinheiro do Mundo poderia vir como várias frases inquisidoras como divulgação: o que todo dinheiro do mundo compraria, por exemplo. Como Fletcher discute com Getty em uma de suas interações, o dinheiro do bilionário compraria ilusões – como a de segurança. Que ele poderia estar tranquilo financeiramente, mas nunca em paz, algo que vemos a cada fita da bolsa de valores que é cuspida para Getty, que a qualquer momento poderia engoli-lo como um monstro de filmes de terror com alguns números negativos. Assim como as nossas vidas, esse mundo que apenas 2% de nós conhecemos, também há coisas que podem desaparecer como num passe de mágica – um totem disso é a estátua que Paul ganha do avô ainda criança. O que faltou para que ser uma história ser mais interessante de ser vista é que Scott não tentasse fazer sua produção tão grande quanto o personagem que representou.
Todo o Dinheiro do Mundo concorre ao Oscar 2018 na categoria Melhor Ator (Christopher Plummer)
Elenco
Michelle Williams
Christopher Plummer
Mark Wahlberg
Romain Duris
Direção
Ridley Scott (Alien: Covenant)
Roteiro
David Scarpa
Baseado em
Painfully Rich: The Outrageous Fortunes and Misfortunes of the Heirs of J. Paul Getty (John Pearson)
Fotografia
Dariusz Wolski
Trilha Sonora
Daniel Pemberton
Montagem
Claire Simpson
País
Estados Unidos
Duração
133 minutes
O filme romantiza o sequestro do jovem Paul Getty, neto do magnata do petróleo Jean Paul Getty nos anos 1970 e a tentativa desesperada de sua mãe, Gail, para recuperá-lo com vida. A questão é que já idoso e bilionário empresário não está disposto a dar um centavo aos captores do seu neto.
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