Paraíso | Crítica | Рай, 2016, Rússia

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Paraíso é um filme de Guerra como uma entrevista, dando voz aos anônimos de um dos maiores conflitos da história.

Paraíso (2016)

Elenco: Yuliya Vysotskaya, Philippe Duquesne, Viktor Sukhorukov | Roteiro: Elena Kiseleva, Andrei Konchalovsky | Direção: Andrei Konchalovsky (Tango e Cash) | Duração: 130 minutos

Filmes abordando a Segunda Guerra Mundial existem aos baldes, mas poucos fogem de explosões, do heroísmo e do exacerbado patriotismo – principalmente quando falamos de Hollywood. Por isso vale a pena encarar o longa-metragem Paraíso, falado em russo e alemão, para termos uma visão mais intimista daquela época e seus terrores. Não é baseado em um personagem real – mesmo que Andrei Konchalovsky use a estética para deixar a experiência mais próxima da realidade –, mas é uma homenagem às pessoas comuns que quiseram fazer o que era certo, sem deixar de abordar as questões, dúvidas e egoísmos que também nos fazem humanos.

Ao introduzir personagens como numa entrevista e na fotografia preto e branco, Konchalovsky quer trazer um retrato intimista de diferentes histórias de envolvidos na Segunda Guerra. Então é um ar documental – que poderíamos até chamar de mockumentary – e a razão de aspecto quase quadrada (o diretor usa 1.37 : 1, só um pouco mais largo que o 1.33:1 das TVs antigas) serve tanto para evocar uma sensação de como se as conversas tivessem sido feitas na época, quanto uma sensação de aperto, de onde os entrevistados não poderiam fugir, algo parecido com o que vimos no vencedor do Oscar estrangeiro em 2016, Filho de Saul (Saul Fia, László Nemes, 2015).

Konchalovsky também brinca com posições de câmera no interrogatório de Olga (Vysotskaya) na sala de Jules (Duquesne). Os cortes lembram cenas de interrogatórios com vistas de cima para inferiorizar a personagem e, quando estamos do lado de Olga, a câmera está abaixo do nível da mesa de Jules, dessa vez nos oprimindo. E todo o gabinete é feito para diminuir Olga com detalhes macabros, aparentemente colocados ali de propósito, como um martelo manchado de sangue e ainda com alguns cabelos e outro personagem sendo arrastado no corredor ao lado para ser torturado. Ainda usando do visual, beleza e a aparência saudável da personagem entram em contraste com sua versão entrevistada, mais magra e de cabelos raspados.

A montagem das entrevistas, onde não ouvimos o entrevistador e que conta com pequenas falhas e partes que faltam, como se tivessem sido deixadas na ilha de montagem, ficam batendo na nossa cabeça – e foi um risco do diretor, pois ao enveredar nesse caminho, Konchalovsky estava fatalmente perto de tornar a experiência maçante. Felizmente ele subverte essa sensação ainda no primeiro ato, numa surpresa que fará despertar o mais sonolento dos espectadores, que pode estar acostumado com fotografia colorida e trilha sonora, ao perceber a verdadeira intenção dessas entrevistas. Nem sempre funciona – a duração de mais de duas horas às vezes não se sustenta – e uma mão mais firme do montador poderia facilmente cortar dez minutos.

Passada essa surpresa é verdade que o filme perde um tanto de seu impacto inicial. Mas fica um ponto de esperança em seguir a história que Olga conta até o inesperado reencontro com o agora oficial da SS Nazista, Helmut (Clauss), na imprevisibilidade da vida posta em arte. Numa série de reencontros – com um antigo caso, com as crianças que ela tentou proteger de um terrível destino – essa terrível vida segue e a produção consegue passar essa sensação de que podemos nos acostumar até com os piores cenários com sons de metralhadoras e gritos ao fundo, sem nunca vermos propriamente os espancamentos e execuções, desses horrores que se tornam o cotidiano.

E nisso de usar a arte para contar, até mesmo de maneira metafísica, o que está se passa na mente dos personagens Konchalovsky toma inspirações shakespearianas nas visões de Helmut, algo que ele não tem certeza de ser real ou não.  Pode ser vista como a resposta para uma pergunta sobre o extermínio dos judeus pela Alemanha Nazista: considerando que aquela se considerava uma nação tradicional e boa parte fervorosamente religiosa – católica, para ser mais exato – como suas ações poderiam passar despercebidas pelo Deus que acreditam? Afinal, como questiona um colega de Helmut num momento ébrio, o Paraíso poderia ser para todos?

A homenagem de Konchalovsky em Paraíso é tocante e triste e toca em pontos que não estamos acostumados a lembrar, detalhes que são lembrados pelas três narrativas – aquele que se defende por seguir ordens, roubos de pessoas que acabaram de morrer, a tentativa de enterrar vivos entre mortos. Mesmo que o tema seja repetido, existe pelo menos uma produção que aborde o Holocausto judeu por ano no cinema, é importante que essa lembrança viva, pois logo mais não haverá mais ninguém daquele período para compartilhar suas experiências. E no desfecho o diretor pode até ser considerado um escapista, mas não há motivo nenhum para acreditar que aquele é o destino que os personagens merecem e não necessariamente o que tiveram de fato.

Paraíso | Trailer

Paraíso | Pôster

Paraíso | Pôster

Paraíso | Galeria

Paraíso | Imagens

Créditos: Divulgação

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Paraíso | Imagens

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Paraíso | Imagens

Créditos: Divulgação

Paraíso | Sinopse

Durante a ocupação nazista na França, a imigrante russa Olga – membro da Resistência Francesa – é presa por ajudar crianças judias a se esconderem da perseguição da Gestapo. Lá ela conhece o oficial Jules, que se dispõe a lhe dar a liberdade em troca de favores sexuais. Mesmo concordando, a situação de Olga muda quando ela é enviada a um campo de concentração onde reencontra Helmut, um coronel da SS alemã, por quem ele já foi e ainda é apaixonado. Ligados por esse período, conhecemos suas histórias que parecem com a de tantos outros daquela época.

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".