Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi | Crítica | Mudbound, 2017
Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi cria empatia com causas, cenários e pessoas que não conhecemos na esperança que possamos entender a dor de outros.
Às vezes, se estamos num lugar de privilégio e conforto, fica difícil imaginar como é a vida de outros. E o que Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi faz, por meio do cinema, é nos tirar por pouco mais de duas horas dessa zona de conforto. O interessante é notar como o elemento da fazenda enlameada, que une as diferentes famílias da história, se transfigura para nos arrastar junto de uma parte triste da história que moldou parte da cultura dos EUA.
Apesar da história passar entre o final dos anos 1930 e 1940, não seria supressa se dissessem que a história fosse meio século mais velha: Rees passa nessa ambientação que, verdadeiramente, alguns lugares pararam no tempo, uma impressão dada por elementos como o figurino e do design de produção, principalmente das choupanas. Essa cidadezinha do Mississipi é um lugar que entrega dois de seus filhos de maneira igualitária, nas figuras de Ronsell (Mithcel) e Jamie (Hedlund), para a Segunda Guerra Mundial. No entanto, o retorno deles marca esse tempo congelado, algo que a fotografia também gélida de Morrison coloca.
Inicialmente, pode-se demorar para entender a estrutura do conto, começando com o enterro do pai de Jamie e Henry (Clarke) para então voltar no tempo e mostrar como os personagens chegaram naquela situação onde Hap (Morgan) hesita em ajudar aos irmãos a descerem o caixão (além de ser simbólico um branco racista ser enterrado numa cova de escravos – no fim, vamos todos para o mesmo lugar). Isso serve para um choque de realidades. Enquanto nesse cenário chuvoso e enlameado já está na nossa retina, a volta no tempo entra em contraste na opção da câmera fixa – ao invés da instável do presente – e com cores mais amareladas e douradas quando Henry e Laura (Mullingan) ainda estavam se conhecendo.
Nesse passado mais garboso, os negros ainda estão em segundo plano, até conhecermos melhor a família de Ronsell, pessoas que carregam no lombo o peso da escravidão de seus parentes nada distantes e a questão da segregação racial ainda em voga. Sendo co-protagonista da história, Ronsell se torna o centro das atenções tanto da plateia quanto das orações da mãe, Florence (Blige). E é exatamente por no começo existir uma tensão entre o pedido de ajuda de Jamie e Hap que a história é contada dessa maneira: não sabemos exatamente o que aconteceu e só podemos torcer para que tudo se acerte.
É importante ressaltar que a diretora, talvez pela pouca experiência ou talvez por se deixar influenciar demais pela narrativa original vinda do mundo da literatura, exagera nos pontos de vistas (seis no total) e nas narrações off. O que serviria para ajudar a entendermos o que os personagens passam, tornam a experiência confusa em alguns momentos, principalmente porque demora muito para Rees encontrar e nos entregar um elo para unir a linha narrativa. Isso só acontece na metade do filme, quando Jamie e Ronsell se encontram pela primeira e dividem as experiências e estresses da Guerra. Esse desvio acontece também com a família que trabalha para Henry e Laura – podem notar que se eles fossem tirados da história, nada atrapalharia. Pelo contrário, até daria dinamismo à trama.
E apesar de ser um filme de cunho racial enorme, a história trata também de outras relações de poder e de quebrar de status quo. Dentro do núcleo branco, temos uma Laura dominada pelo marido – ele avisa, simplesmente, que a família irá se mudar em algumas semanas sem consultá-la – e um Jamie que tenta quebrar o ciclo de ódio e desprezo que ainda vive no pai. Junto deles, Henry é um tanto ingênuo, apesar de bruto, dominado pela própria ignorância, uma característica que esmagará suas esperanças, tirando dele o sonho de um lar apropriado para ele e a família.
Já o núcleo da família de Hap e Florence é ameaçado pelo de sempre, as ameaças veladas: o tempo para a colheita, empréstimos forçados, a separação racial. Apesar de naquela terra a família tirar o sustento e parte não ser exatamente deles, os familiares estão unidos e esperançosos de tempos melhores. Hap, na função de pastor de uma pequena igreja, se regozija com as palavras da Bíblia que promete justiça para quem tem sede delas – uma voz que é calada na parte mais pesada da história, mostrando esse mundo mais como lama (sujo) do que de barro (a matéria-prima do ser humano, para quem acredita nisso), te puxando e não deixando sair de lá.
No entanto, há uma mensagem de esperança em Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi. A diretora colocou na tela parte da luta que é ser negro nos EUA, praticamente derramando seu coração na história. Há momentos que faltaram um polimento para fazer mais sentido – como a aparição fantasmagórica de um grupo que nunca é citado existir pelas redondezas. Porém, ao mostrar um desfecho com uma possibilidade de doçura, Reese mostra o que ela realmente acredita que ser a força motriz desse mundo, ainda que a guerra e o ódio, nos puxando como um lamaçal, tente apagar de nós – sem medo de parecer piegas.
Mudbound: Lágrima Sobre o Mississipi concorre ao Oscar 2018 nas categorias Melhor Atriz Coadjuvante (Mary J. Blige), Melhor Roteiro Adaptado (Dee Rees e Virgil Williams), Melhor Canção Original (“Mighty River”, Mary J. Blige, Raphael Saadiq e Taura Stinson) e Melhor Fotografia (Rachel Morrison).
Elenco
Carey Mulligan
Jason Clarke
Jason Mitchell
Mary J. Blige
Rob Morgan
Jonathan Banks
Garrett Hedlund
Direção
Dee Rees
Roteiro
Dee Rees
Virgil Williams
Baseado em
Mudbound: Lágrimas sobre o Mississípi (Hillary Jordan)
Trilha Sonora
Tamar-kali
Fotografia
Rachel Morrison
Montagem
Mako Kamitsuna
Distribuição
Netflix
País
Estados Unidos
Duração
134 minutos
Num cenário pós-Segunda Guerra Mundial, dois jovens do Mississipi voltam para casa depois do combate. Apesar de seus feitos, os filhos daquele ligar não são recebidos da mesma maneira, inflando a questão racial daquele lugar prestes a explodir.
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