Me Chame Pelo Seu Nome | Crítica | Call Me by Your Name, 2017
Me Chame Pelo Seu Nome tem temas já vistos em outros filmes, mas taxa-lo apenas pela sexualidade dos personagens é muito superficial.
É verdade que os temas de Me Chame Pelo Seu Nome já foram abordados em outras produções. É, basicamente, a história de dois jovens que se apaixonam durante um verão. Porém, a pedra de sustentação que diferencia boa parte do que já foi feito é que esses jovens são dois homens. E isso é importante, mais importante que o caminho quase tradicional abordado. Ao abordar o relacionamento dos dois sem dificuldades e entraves, a trama se permite ser ao mesmo tempo dotada de doçura quanto o poder de quebrar corações, num verão que é um microcosmos da vida, seja lá qual for a sua orientação sexual.
Acredito que a primeira aversão que pode passar na cabeça de quem assiste é a diferença de idade entre Elio (Chalamet) e Oliver (Hammer – e é importante frisar que o ator é mais velho que o personagem). Hollywood está acostumada a colocar disparidades entre relacionamentos heteronormativos (sempre o homem mais velho, como comentado no TigreCast) e pouca gente parece perder a cabeça isso. O que é proposital, no fim das contas, na história de Elio e Oliver. São elementos que fazem nos questionar e tenham em mente que a diferença entre eles é de apenas sete anos – pelo menos no livro.
Passada essa estranheza, sua e não do filme, Guadagnino pode, enfim, contar seu romance. Aquele verão é um período de aprendizado, o que justifica as legendas iniciais emulando giz, onde Elio começa a descobrir a si próprio, indo além de ler, transcrever músicas e sair com os amigos. Oliver é visto por ele quase como um estereótipo, mas não deixa de haver fascinação até pelas pequenas coisas, como quando o jovem o observa sorvendo com muito gosto um café-da-manhã. O filme é cheio dessas simbologias que envolvem desejo, desde o fato de Oliver dormir na cama que é de Elio.
Há um outro momento, bem mais à frente, que Oliver e o Sr Perlman (Stuhlbarg), pai de Oliver, analisam fotos de antigas figuras masculinas em bronze. Ali há outra discussão sobre desejo, algo que acontece durante todo o filme e é reforçado em doses constantes para lembrarmos que esse é um filme sobre conhecimento. É verdade que você nunca mais vai ver um pêssego do mesmo jeito (assim como se você assistiu Killer Joe nunca mais encarou um pedaço de frango frito da mesma maneira), mas são essas pequenas particularidades da história que fazem a diferença entre assistir e ser sugado pela narrativa.
Ao mesmo tempo que o filme decorre numa simples toada de uma paixão marcante, a produção consegue ser bela e contemplativa. Começando por aquele lugar da Itália, onde os pais e os filhos vivem uma vida idílica, cheia de belezas naturais e que permitem um apreço às coisas que não são mais possíveis na cidade grande: parar para ouvir o som da água, ler à luz do sol no fim da tarde. E a chegada de Oliver é aquela típica de alguém que abala as estruturas com sua beleza, surpresas e uma dose de arrogância. Então o americano é uma dose de rebeldia, uma transformação de um mundo que impõe algo ao jovem Oliver.
Porém, esse peso nunca é um problema. Seria bem fácil, além de extremamente clichê, que a paixão entre Elio e Oliver fosse podada – principalmente por se passar nos anos 1980. Um dos pilares dessa história é que ela se passa longe fisicamente de grandes centros, portanto não existem juízes da moral e bons costumes, ainda que Elio seja parte disso também ao ficar algum tempo com Marzia (Garrel). A jovem amiga é um quase um passatempo, uma revolta e uma adequação, poderíamos dizer. Se nessas pouco mais de duas horas de filme existe um conflito, ele aparece nesse momento, que poderia ser classificado como a adolescência dessa história com começo, meio e fim.
E essa duração um pouco maior do filme serve também para estreitar a ligação e Elio e Oliver, com cenas doces e as picantes (apesar de que, pelo que entendi, as cenas de sexo foram bem minimizadas em relação ao livro). Como aquele período de férias que você não quer que acabe, a história mantém a relação dos dois ao máximo possível, onde cada minuto perdido, algo que Elio lamenta, tem que ser recuperado. Por isso a história tem tanto traços reais e pé no chão como os que quase de sonho. Isso justifica, por exemplo o uso da música de maneira diegética – um piano, uma música no rádio – ou que sai da cabeça de Elio para o papel: é algo que está lá, que existe em algum plano. Já quando o diretor brinca com filmes sobrepostos em dois momentos, é o momento de devaneio, algo para marcar o fim do sonho.
E se por um lado a trama pode ser encarada como um romance dos mais tradicionais, o mesmo não pode ser dito de seus diálogos. Por encarar dois núcleos muito cultos, seja da família de Elio ou do próprio Oliver, seria pouco realista não ouvir discussões inteligentes entre eles. Isso é muito marcante no diálogo final entre Elio e seu pai e naquele que dá nome ao filme. “Me chame pelo seu nome”, diz Oliver, “que eu lhe chamo pelo meu” deve ser uma das linhas mais belas desse ano no cinema. É algo dotado de um amor que tem paralelo com a maior lição do cristianismo e que muitos cristãos tendem a esquecer. Ao amar o próximo como a si mesmo, você se projeta em quem você ama e assim não existe lugar para enganações.
Infelizmente, assim como é a vida, nada é perfeito e há uma necessidade de aprender também por causa de corações partidos. Dizer que Me Chame Pelo Seu Nome é um filme gay é reducionista – vai além de vermos dois homens se apaixonando. Sim, é importante pela representatividade e isso é necessário para quebrar paradigmas. Porém, a trama trata a relação dos dois como algo tão normal e natural, transmitindo a mensagem que deveria ser normal e natural para qualquer um. Abordar de maneira tão espontânea uma relação que não seria criticada se fosse um casal heterossexual é o mínimo que podemos esperar da nossa sociedade.
Elenco
Armie Hammer
Timothée Chalamet
Michael Stuhlbarg
Amira Casar
Esther Garrel
Victoire Du Bois
Direção
Luca Guadagnino
Roteiro
James Ivory
Baseado em
Me Chame Pelo Seu Nome (André Aciman)
Fotografia
Sayombhu Mukdeeprom
Montagem
Walter Fasano
País
Itália
Estados Unidos
Brasil
França
Distribuição
Sony Pictures Classics
Duração
132 minutos
Num verão durante o começo dos anos 1980, em algum lugar da Itália, a vida do jovem Elio é sacudida pela chegada de Oliver, um americano que veio estudar com sob a tutela do pai de Elio. Nesse período, os dois experimentarão os prazeres e dores de um amor de verão.
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