Obsessão | Crítica | Paperboy, 2013, EUA

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"Paperboy", 2013

Com Matthew McConaughey, Zac Efron, David Oyelowo, Macy Gray, John Cusack e Nicole Kidman. Roteirizado por Lee Daniels e Pete Dexter. Baseado no romance de Pete Dexter. Dirigido por Lee Daniels (Preciosa).

7,5 - "tem um Tigre no cinema"De um certo ponto de vista, o retrato da cultura americana encontra similaridades em “Obsessão”: preconceito, mentiras, falta de integridade e violência. A força do filme sem dúvida está nos atores, e isso ajuda a conduzir a trama com mais facilidade. Apesar de se perder no que contar – uma história de tribunal, justiça, ou de preconceito – Daniels desenvolve em tela vários momentos interessantes, criando um filme pouco equilibrado, mas visceral.

Ward Jansen (McConaughey) volta à sua cidade natal para investigar o assassinato de um xerife anos antes. Hillary Van Wetter (Cusack) foi acusado do crime e condenado à morte, apesar das falhas no processo, que incluíam provas desaparecidas. Jack (Efron), irmão de Ward, se interessa pelo caso quando a deslumbrante Charlotte Bless (Kidman), que se apaixonou via cartas por Hillary, aparece na casa dos Jansen para colaborar com a reportagem e tentar livrar o noivo do corredor da morte. Na investigação, aparecem provas que podem inocentar Hillary, enquanto a atração de Jack por Charlotte aumenta.

É impressionante como os diretores continuam apostando nesse câncer que é a narração em off. Então, por intermináveis minutos, ouvimos Anita (Gray) contando qual é a história dela com o assassinato, e sua relação na casa dos Jansen, onde era empregada doméstica. Contando para quem não fica claro, outro problema do filme. A história que ela detalha para um repórter desconhecido – como se dissesse que a história de Pete Dexter é real – serve apenas para situar o espectador, as vezes nas situações mais óbvias possíveis. Irritante, no mínimo.

O filme começa muito bem com um flashback em PB e alta granulação, mostrando a morte do inescrupuloso e preconceituoso xerife. Para não deixar claro quem foi o autor do crime, o diretor faz recortes na montagem, obscurecendo pedaços do frame, o que não permite que nós percebamos sequer a silhueta do assassino.

O diretor constrói o protagonista e os coadjuvantes com competência. Jack é o menos preocupado com a vida, e não liga de ser pego de cuecas por Anita, apesar de reclamar disso. Ex-nadador profissional, ele parece muito calmo, pelo menos até Charlotte aparecer. Já Ward tem problemas mais sérios. Duas cicatrizes sutis no canto dos lábios e a fala de Anita “o que aconteceu da última vez” são suficientes para apresentar o passado do jornalista. Kidman impõe um ótimo trabalho vocal para Charlotte, uma personagem provocadora – a cena do carro enquanto ela está com Jack distrai tanto que até se perde uma referência futura – fútil, e estranhamente atraída pelo encarceramento de Hillary. Ela até mantém numa parede fotos e cartas de todos os prisioneiros que ela manteve contato. Yardley Acheman (Oyelowo), jornalista que acompanha Ward, lida com a imagem do ódio e do racismo da época. Hillary é um homem sujo, mesmo levando em conta que está preso, autoritário, pelo modo que trata Charlotte no segundo encontro deles, e violento, característica implícita quando conhecemos seu tio, que também é seu álibi.

Nota-se durante o segundo ato a indecisão do diretor. Determinado momento, a história passa da investigação de contestar a prisão de Hillary para o fascínio que Jack tem por Charlotte – e, de novo, a narração explica que ele é atraído por ela por causa de mom issues, algo que estava bem claro – culminando numa cena bizarra onde a loira urina em Jack para ajudá-lo das queimaduras de algas-vivas. Enquanto isso, a caçada pela inocência de Hillary toma outros rumos, mas que ficam de novo em segundo plano numa sequência violentíssima, quando Jack descobre que o irmão é homossexual, e que torturado e estuprado por dois sádicos. A história já tinha adotado um tema visceral e sujo quando Charlotte e Hillary se encontram pela primeira vez, e depois no encontro que Warren e Jack tem para confirmar o álibi do condenado. Não deixam de ser cenas fantásticas, apesar de pesadas. Mas nada gratuitas, visto a construção dos personagens.

A fotografia de Roberto Schaefer – de 007 Quantum of Solace (Quantum of Solace, 2008) – trabalha muito bem os tons daquela região pantanosa do sul da Flórida, em oposição aos sonhos em que Jack idealiza Charlotte com dourados fortes, e chega ao fim com uma pesada névoa que encobre o julgamento do personagem, que não mede esforços para uma conclusão que tem toda a cara de trágica.

Obsessão - poster brasileiros

“Obsessão” traz um carga emocional pesada, que seria melhor aproveitada com mais foco. Consegue amenizar sutilmente a dose dramática com cenas comoventes, a de Jack e Charlotte dançando na chuva em especial, mostrando que a vida tem momentos para celebrar, mesmo que sejam poucos. Com uma estrutura narrativa que não é confusa, mas que falta coesão, será lembrado muito mais pelas notáveis performances de Kidman, Efron, Cusack e McConaughey. Não é demérito, mas é claro que falta alguma coisa, mesmo estando longe de ser um filme ruim.

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".