O Doador de Memórias | Crítica | The Giver, 2014, EUA

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Em O Doador de Memórias, com Taylor Swift e Jeff Bridges, falta profundidade ao tratar alguns temas, mas se sai bem nos filmes de universos distópicos.

O Doador de Memórias, 2014

Com Jeff Bridges, Meryl Streep, Brenton Thwaites, Alexander Skarsgård, Odeya Rush, Katie Holmes e Taylor Swift. Roteirizado por Michael Mitnick e Robert B. Weide, baseado no romance de Lois Lowry. Dirigido por Phillip Noyce.

6/10 - "tem um Tigre no cinema"Uma distopia após outra, e o cinema para jovens adultos vai ficando com a mesma identidade. Sabemos como Hollywood funciona: os produtores pegam uma ideia que funciona (ou uma atriz ou casal) e a espreme até que não saia mais nada. Isso não é culpa de O Doador de Memórias, baseado num livro de 1993. Com ideias boas, o filme tem certo destaque nesse mundo que ajudou a criar, mas que só participa agora. No entanto, faltou profundidade ao tratar alguns temas que podem estar presentes no original, mas que se perderam na adaptação.

Em comunidade aparentemente utópica, nenhum cidadão tem registros históricos da era pré-Guerra, tampouco sentimentos, suprimidos quimicamente. Ao completar a maioridade, Jonas (Thwaites) recebe a tarefa de ser o novo Recebedor de Memórias, o único cidadão com informações do passado. A tarefa é passada pelo Doador (Bridges) para que Jonas possa aconselhar a Chefe dos Anciões (Streep) e outros membros a tomar as decisões corretas. Porém, quanto mais Jonas aprende sobre o passado da sociedade, mais quer que ele volte a ser realidade, o que o coloca no caminho dessa sociedade chamada perfeita.

O diretor Phillip Noyce, em conjunto com a diretora de fotografia Ross Emery, usa uma palheta PB para representar a sociedade que deixou de ver diferenças. Uma fotografia péssima, aliás, que foi pensada em cores e depois convertida para preto e branco. Eventualmente, se aceita o efeito, mas faltou um cuidado que difere de todo o visual gracioso do restante do filme.

Porém, é interessante que pouco a pouco as cores vão ganhando vida à medida que Jonas completa seu treinamento. Uma maçã, a cor de um cabelo e olhos vai aumentando a presença das cores gradativamente que, quando finalmente toma a tela, não é brusco ou forçado.

Dentro dessa sociedade rígida, porém ordeira, a amizade entre Jonas, Fiona (Rush) e Asher (Monaghan) se fortalece, já que os laços entre famílias não são incentivados pela sociedade, que sequer tem nomes de família. Então, é natural que os mais jovens se liguem uns aos outros, uma pequena poesia num mundo que diz que tudo deve ser reprimido.

Aos poucos, a utopia se mostra distopia. E diferentemente de outras histórias do gênero, o filme discute bem mais o que se perde nesse tipo de sociedade, sempre pelos olhos de Jonas e do Doador. As escolhas forçadas, as regras rígidas – como toque de recolher – e o impedimento de ir além do que é permitido transformam aquele lugar numa prisão. Ainda que gigante, continua sendo uma. Em suma, é uma alegoria da passagem à vida adulta, onde é preciso um pouco de ousadia para crescer.

É realmente uma pena que essas boas ideias não se aprofundem. Mas para isso o diretor precisaria de mais 30 minutos, ou uma hora inteira, o que seria comercialmente arriscado. Os estúdios querem passar cada vez mais informações mastigadas para uma geração que perde a atenção em questão de minutos, e um filme longo iria contra esse pensamento. Irônico, já que Jonas quer exatamente o contrário disso, ao experimentar cada vez mais as sensações e memórias perdidas de toda uma geração.

Sendo o bom diretor que é, Noyce apresenta ótimos momentos na trama. Alguns detalhes fazem a diferença e melhoram sensivelmente a experiência. Ainda que esses sejam elementos presentes no livro – que não li – o diretor os traduziu muito bem. Gosto em especial do design da casa do Doador, que fica um nível abaixo do chão e representa as estranhas da mente. E a casa recheada de livros é a melhor conexão com o passado, por estar um passo atrás de, por exemplo, um tablet.

Existe também uma doçura no modo que o ensinamento é passado inicialmente. Com Jonas, é uma coisa simples, um trenó. Do mesmo jeito foi com Rosemary (Swift), a antiga Recebedora, que hoje não é mais que uma memória. “Ela se foi”, diz o Doador. E quando Jonas insiste em saber se ela foi para Alhures – lugar para onde os idosos vão – o mestre insiste em dizer que ela se foi.

E aqui abre-se um paralelo com a maior das distopias: 1984 (George Orwell). Quando Jonas desaparece além da fronteira, há uma cerimônia de despedida e a mãe dele (Holmes) diz à filha mais nova que a partir de agora o nome dele não poderia ser dito. O mesmo acontece com Rosemary, ninguém a cita. Na obra de Orwell, há os vaporizados, aqueles que não se deve falar. E assim como as teletelas da Eurasia, a projeção holográfica da Chefe dos Anciões pode entrar em (quase) qualquer lugar. Oras, até a questão do falar da sociedade do Doador lembra um pouco a Novalíngua, pelo menos em princípio. Quando Jonas pergunta ao pai (Skarsgård) se o ama, ele dá uma resposta diferente do que é a tradução do sentimento. Assim como o Grande Irmão tenta fazer com Winston e tantos outros em 1984.

O Doador de Memórias | Pôster brasileiro

Entre bons momentos, como a discussão da necessidade da mesmice, como a cor vai desbotando aos poucos quando Jonas foge e brincadeiras com as lembranças, O Doador de Memórias peca muito em seu desfecho praticamente mágico. Apesar de Jonas ter passado por um inferno na sua jornada para despertar os outros, não houve evolução ou aprendizado por parte deles. Por outro lado, mesmo que Lowry tenha escrito três outras histórias, Noyce termina com um plano que pode ser tanto a memória do passado ou realidade, o que trará alguma discussão. E a história se fecha sozinha, sem necessidade de uma sequência.

Veja o trailer de O Doador de Memórias

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About TIAGO

TIAGO LIRA | Criador do site, UX Designer por profissão, cinéfilo por paixão. Seus filmes preferidos são "2001: Uma Odisseia no Espaço", "Era uma Vez no Oeste", "Blade Runner", "O Império Contra-Ataca" e "Solaris".